Para quem vive com medo, incêndio é mais uma tragédia na lista
Apesar do incêndio no dia 16 deste mês ter sido trágico, mulheres desabafam que episódio é mais um na história
“Eu não sabia por quem eu chorava. Se chorava por mim mesma, pelas minhas crianças ou pelos filhos dos outros”, introduz Carolina Silva enquanto segura a filha mais nova no colo e observa sua geladeira ser levada para o ferro velho. Apesar das lágrimas desta semana terem se misturado com a fumaça do maior incêndio sofrido pelos moradores da Favela do Mandela, a angústia que se une à dor e indignação são parte de uma história que não é impedida de se repetir.
Encontrei Carol em pé, rodeada pelas duas filhas, ao lado de sua casa que também aparentava seguir em pé. Foram necessários apenas alguns minutos para descobrir que tanto a moradora quanto o lar tiveram suas estruturas abaladas ao ponto de quase desabarem.
Não tenho fogão, não tenho geladeira, não tenho armário, guarda-roupas, não tenho mais nada. E a patrola vai tirar o resto do meu barraco, até isso, diz Carolina.
Em contraste, há dois meses, era o sorriso de satisfação que habitava o espaço, quando a reforma da casa de três cômodos chegava ao fim de mais uma etapa.
Trabalhando como operadora de telemarketing, a mãe conta que conseguiu reunir dinheiro pouco a pouco para ter uma casa minimamente confortável. Mas, com o incêndio, viu todo o esforço ser apagado.
Ao relembrar sobre a rapidez das chamas, Carol conta que fazia o almoço quando recebeu uma mensagem perguntando se estava sabendo do incêndio na comunidade. “Quando olhei pela janela, o fogo já estava bem alto. Foram menos de 15 minutos e isso aqui já estava tomado pelo fogo. Foi desesperador, as crianças estavam em casa”.
Apesar do incêndio ser considerado uma das grandes tragédias vividas pela moradora, ela pontua que realmente é isso, ‘uma das’. Meses antes, bastou um vento forte para levar todo seu telhado e gerar o primeiro trauma em suas filhas.
“Elas já estavam traumatizadas porque o vento passou aqui e levou tudo. Elas estavam embaixo, só deu tempo de tirar elas e sair de casa. Você vê, quando eu consigo ter um dinheiro para arrumar, acontece isso”, Carol desabafa.
Abrigada em uma das tendas do Exército, seu futuro agora é ainda mais incerto já que sua casa deixará de existir. “A dor era de todo mundo, era do coletivo. A minha dor era a dor do próximo. Não sei nem explicar, tô muito triste”.
Dividindo o sentimento de insegurança permanente, Andreia Salazar de Lima também perdeu tudo. Vivendo há oito anos na comunidade do Mandela, ela narra que o medo tem precisado ser deixado de lado.
Com um filho pequeno, de cinco anos, a moradora comenta que havia mobiliado seu barraco com o esforço de anos. Mas, seja verão ou inverno, o desastre pode chegar a qualquer momento e chegou..
“Não importa se foi incêndio, perdi tudo. Não tenho o que fazer, só voltar a trabalhar e lutar mais uma vez para ter as minhas coisas”, diz Andreia. Hoje, além do básico, seu pedido é por materiais de construção para garantir que os muros possam ser reestruturados mais uma vez.
Aparentando ter um final de incêndio diferente, Taina Silva viu sua casa continuar em pé. Mas, como contaram as outras moradoras, a imprevisibilidade domina a vida de quem precisa morar por ali.
“Minha casa tá em pé, mas não sei como vou continuar agora. A gente tirou tudo do lugar, não sei o que está funcionando, o que não está. Só sei que minhas crianças nem conseguem ficar aqui direito”.
No momento do incêndio, a maior parte dos cinco filhos estava na escola, mas ao chegar em casa perceberam que algo ruim havia acontecido. “Mandei eles para a casa da minha mãe e nem consegui dormir. Não sei como vai ser, se a comunidade vai continuar aqui. Foi a pior coisa que já aconteceu”.
Tendo vivenciado outros incêndios, furtos de objetos enquanto a movimentação acontecia, chuvas fortes e frios intensos, Taina só não sabe o que fazer, não sabe como lidar com o medo do hoje e do amanhã.
“A gente vai continuar aqui porque não tem escolha, não tenho como ir para outro lugar. Essa é a nossa vida”, resume.
E, para quem puder ajudar os moradores da Favela do Mandela, as principais demandas são com produtos de higiene pessoal, alimentos, bebidas e materiais de construção. Veja abaixo os locais para entregar:
- Rua Tangará da serra, 100 - Falar com Laura
- Rua Antoninho Zandominigh, 7 - Falar com Jenyffer, Stefany, Leir
- Rua Tangará da Serra, 61- Falar com Jessica
- Av. Dos Eucaliptos, 315 - Falar com Martha
Confira a galeria de imagens:
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