ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no X Campo Grande News no Instagram
NOVEMBRO, SEXTA  15    CAMPO GRANDE 26º

Comportamento

Para viver na música, Lana aprendeu sobre o preconceito aos 9 anos

Percussionista, Lana conta que sempre teve apoio da família, mas fora de casa é que precisou traçar caminhos

Aletheya Alves | 05/05/2023 07:11
Amor pela música levou Lana à percussão do Projeto Kzulo. (Foto: Wirlan Martins)
Amor pela música levou Lana à percussão do Projeto Kzulo. (Foto: Wirlan Martins)

Enquanto via toda a família envolvida na música e, pela idade, não conseguia imaginar o que poderia enfrentar, Luana Dias Ferreira, precisou enfrentar vários leões todos os dias para se tornar a percussionista Lana Vieira. Logo aos 9 anos, quando se apaixonou pelo primeiro instrumento de percussão, escutou que aquilo não era coisa de menina e, desde então, tem mostrado que é, sim.

Antes de se identificar com qualquer instrumento, Lana conta que a música já estava presente em seu cotidiano. “A família dos meus pais sempre foram muito musicais, Da parte da minha mãe, tanto meu avô quanto minha avó sempre tocaram vários instrumentos. Meu avô tocava viola caipira para a gente dormir quando criança, lembro dele tocando aquelas histórias cantadas”.

E, assim como o contato veio pela família da mãe, a do pai também influenciou nos gostos da artista. “Meu avô sempre foi boêmio, então tinha serestas na casa deles e crescemos no meio de tudo isso”, explica.

Voltando à percussão, talvez essa seja a sequência de histórias que mais tenha marcado o caminho que Lana iria seguir. Tanto pela preferência instrumental quanto pela necessidade de lidar com os preconceitos e passar por eles.

Com 7 anos, ela narra que morava em Rochedo e graças a um dos tios é que foi se conectando com os instrumentos. “Ele tinha um grupo de pagode chamado Razão do Samba e eles ensaiavam toda semana na casa dele, que era nos fundos da casa da minha avó”.

Vendo a dinâmica, Lana explica que assistia aos ensaios com um grupo de amigos e, devido ao apoio do tio, todos brincavam com os instrumentos na praça que ficava em frente à casa. E, logo depois, o gosto aumentou ao entrar em uma fanfarra.

Contato com a música começou logo cedo e nunca mais foi deixado de lado. (Foto: Duka Audiovisual Production)
Contato com a música começou logo cedo e nunca mais foi deixado de lado. (Foto: Duka Audiovisual Production)

Inclusive, foi lá, na fanfarra, que entendeu a necessidade que teria durante toda a vida de se impor. Puxando na memória, ela explica que os instrumentos chegaram todos novos para fundar o grupo de estudantes e, olhando cada item, viu uma caixa de percussão e decidiu que o caminho seria por ali.

“Fui pegar a caixa e não sabia nem como colocar no meu corpo, lembro de colocar no meu colo. Mas, quando o professor viu, ele disse que não poderia porque era de menino. Para mim, que vivia no meio dos meninos, nunca houve distinção de nada, mas ele disse que era pesado e, por isso, não poderia”, diz Lana.

Sem o que fazer, ela aceitou os pratos que, para o professor, seriam mais femininos e manteve na cabeça que aprenderia a percussão de um jeito ou de outro. “Via meus amigos tocando a caixa que eu queria e comecei a observar como fazia porque era aquilo que eu queria tocar”.

Após alguns ensaios, Lana pediu baquetas para o pai e, chegando até a incomodar toda a família, ela conseguiu pegar o jeito. “Lembro que ficava 24 horas com aquelas baquetas e era de incomodar mesmo. Tanto que meu irmão mais velho passou pimenta na baqueta para eu poder soltar”, relembra.

No fim das contas, depois de pedir ajuda para a família, Lana explica que conseguiu aprender e, em um dia, decidiu colocar em prática na fanfarra. Enquanto o grupo lanchava, a menina se aproximou da caixa e tocou a marchinha que os amigos estavam se dedicando.

“O professor saiu de dentro do refeitório para ver quem estava tocando e aí viu que era eu. Ele perguntou se eu sabia e eu disse que não, que tinha aprendido. Depois, ele quis falar que eu poderia tocar, mas eu disse algo como ‘não, é de menino’. Foi meio de pirraça, para mostrar que não existe essa distinção e eu não tinha lidado com isso ainda, mas foi muito marcante”, explica.

Conforme o tempo passou, Lana se aprofundou mais na música, inclusive na fanfarra com outro professor. Desde criança, participou de concurso com os amigos e, assim como a família, não abandonou a arte. Durante a vida, integrou alguns projetos até que, atualmente, faz parte do Kzulo.

Pensando sobre a história que marcou seu início, ela completa que o preconceito esteve lá e continua existindo, infelizmente, em todas as esferas da vida.

“De maneira geral, a mulher tem que estar se provando o tempo todo para ter o lugar dela, ter a mesma oportunidade, o mesmo salário. Para conseguir estar nos mesmos lugares, a gente tem que passar uma, duas, três vezes na mesma fila. É um preconceito estrutural que a gente precisa lidar todos os dias. É enfrentar um leão todo dia”, pontua Lana.

Acompanhe o Lado B no Instagram @ladobcgoficial, Facebook e Twitter. Tem pauta para sugerir? Mande nas redes sociais ou no Direto das Ruas através do WhatsApp (67) 99669-9563 (chame aqui).

Nos siga no Google Notícias