Tudo muda quando mãe segura as mãos e segue ao lado do filho trans
Durante anos, Gael parecia viver um personagem, até que um dia encontrou última peça do seu "quebra-cabeça"
No universo das descobertas dos próprios sentimentos e identidade, há uma jornada singular para cada pessoa. Para Gael Terra, um oceanógrafo de 32 anos, essa jornada foi marcada por desafios, autodescoberta e, acima de tudo, pelo apoio incondicional de sua família, especialmente de sua mãe, Paula Terra.
Tudo começou com um simples post de aniversário feito por sua mãe, Paula. Em suas palavras carinhosas, Paula não apenas expressou seu amor por Gael, mas também compartilhou uma mensagem poderosa de aceitação e respeito pelas identidades de gênero e orientações sexuais. Esse amor foi o ponto de partida para entendermos a história emocionante por trás de Gael.
Gael lembra de uma infância onde se sentia livre para se expressar da forma que lhe era mais confortável. Desde cedo, ele rejeitava estereótipos de gênero e buscava ser autêntico consigo mesmo. Porém, conforme a pressão social começou a pesar sobre ele durante a adolescência, Gael se viu reprimindo sua verdadeira identidade, vivendo como se estivesse interpretando um papel.
“Pedia para minha mãe só comprar roupas masculinas, tinha o cabelo curto e vivia brincando com meus primos e amigos na escola. Cheguei a fingir que era um menino algumas vezes, nessa época eu rejeitava tudo que eu via como “feminino”. Então alguma coisa mudou com a puberdade e pré adolescência. Comecei a sentir uma pressão para me adequar às expectativas da sociedade para uma menina, deixei o cabelo crescer e fiz o contrário rejeitando tudo que era “masculino” por não saber lidar com o que estava sentindo. E o mais fácil foi trancar tudo dentro de uma caixinha”, lembra Gael.
Tudo isso só parecia fácil. Foi somente aos 29 anos, após enfrentar anos de confusão e angústia, que ao assistir uma Parada LGBT Gael finalmente entendeu sua verdadeira identidade: ele era um homem trans. Esse momento de revelação trouxe um alívio imenso, mas também desafios emocionais significativos.
“Mesmo minha mãe sendo a pessoa incrível que ela é, tendo trabalhado a vida inteira com causas sociais e políticas públicas, eu ainda estava apavorado, apesar do alívio que senti assim que entendi que era trans ainda tive um período de negação, que foi uma agonia, pois o medo do que teria que enfrentar me consumia”.
Mas ao compartilhar seus sentimentos com a família, Gael encontrou um apoio incomparável. Sua mãe, Paula, desempenhou um papel fundamental, mostrando compreensão, aceitação e amor incondicional desde o primeiro momento. Em uma conversa emotiva, Paula revelou como desde o início teve a intuição de que Gael era um menino, e como, apesar das pressões sociais, ela sempre esteve ao lado dele, apoiando sua autenticidade.
Filhos são o melhor e maior desafio que decidimos ter na vida e todos eles trazem consigo, muitos desafios. Na minha opinião, proteger e lutar pela felicidade deles é o maior propósito dos pais e é assim que tem sido a nossa história até aqui; Cuidamos uns dos outros e estamos sempre presentes e prontos para enfrentar, juntos, todos os desafios que se apresentarem”, descreveu Paula Terra ao lado do filho Gael.
Para Gael, o apoio familiar foi fundamental até agora. Ele destaca como ter uma família que compreende e aceita sua identidade de gênero tornou tudo mais suportável. Em um mundo onde a falta de entendimento e preconceito ainda são prevalentes, o amor e apoio da família são um verdadeiro porto seguro.
“Eu me sinto extremamente privilegiado por ter a família que tenho (é triste que isso seja um privilégio), pois não existe nada que façam comigo, nada que me xinguem que me derrube, que me quebre pois em casa aprendi o que é o amor e como sou merecedor disso, por ter em casa um porto seguro ninguém consegue me afetar verdadeiramente. O fato de minha mãe entender quem eu sou e me amar com isso, sem isso, apesar disso e por isso, cura as feridas que a sociedade nos causa”.
Dizer ao mundo "sou um homem trans" ainda é desafiador, admite Gael. Apesar dos avanços na aceitação e compreensão, a sociedade ainda carrega uma carga de preconceito e ignorância em relação às identidades de gênero. No entanto, Gael mantém a esperança de que, com mais representatividade e educação, o mundo possa se tornar mais compassivo e inclusivo para todas as pessoas LGBTQIA+.
“Precisamos de mais pessoas trans na mídia, na política, nas artes, acredito que já melhoramos muito nesse quesito, nas mídias tradicionais e com redes sociais como o Tik Tok, a informação ficou mais democratizada, não precisamos assistir o que nos é imposto, temos escolha em quem seguir e qual conteúdo consumir, e principalmente para criadores de conteúdo de comunidades marginalizadas que agora tem voz independente, essa representatividade foi muito importante para mim”, completa Gael.
Já Paula Paula Terra encerra suas palavras com uma reflexão sobre o amor e a aceitação incondicionais. Para ela, o mais importante é que seus filhos sejam felizes, independentemente de sua identidade de gênero ou orientação sexual. Ela ainda ressalta que a identidade de gênero e a sexualidade não são coisas que podemos escolher ou fazer “opção”. “Portanto, estar atentos aos nossos filhos para ajudá-los a compreender quem eles são, também é tarefa de quem fez a opção de ser pai e mãe”, finaliza.
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