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Diversão

Em festa com “shibari”, repórter é amarrada e leva parafina pelo corpo

Além da música e da pegação, festa surgiu para trazer outras expressões do que pode ser prazeroso

Thailla Torres | 26/01/2022 07:28
Repórter depois de amarrada sendo "queimada" com vela. (Foto: Arquivo Pessoal)
Repórter depois de amarrada sendo "queimada" com vela. (Foto: Arquivo Pessoal)

O anúncio de mais uma festa chamada “La Puta” surgiu na semana passada nas redes sociais. Antes de levar a programação do evento ao tradicional Agendão de sexta-feira, pesquisei o maior apelo na descrição: shibari, prática em que você amarra o parceiro ou parceira e é comum dentro do fetiche BDSM.

A sigla acima, que significa bondage (artigos para contenção), dominação (quem manda), sadismo (quem se excita com a angustia sexual do outro) e masoquismo (quem se excita em sentir dor) já foi, inclusive, elencado como um dos preferidos do campo-grandense em 2021 e o Lado B mostrou.

Diante da proposta, resolvemos ir até à festa que recebe todos os públicos, mas deixa claro que é feita pelo público LGBTQIA+ e qualquer tipo de preconceito não é tolerado. Logo na entrada, encontramos uma das organizadoras, a artista visual, produtora e DJ Glauber Portman, que estava em visual ousado e com as cordas do falado shibari pelo corpo.

Entrei já imaginando que veria alguém suspenso no meio do salão como nos filmes ou nas cenas recentes de Verdades Secretas II, em que a personagem Angel, interpretada por Camila Queiroz, é toda amarrada e suspensa pelo sádico Percy, interpretado pelo ator Gabriel Braga Nunes.

Cena de Verdades Secretas II em que personagem é amarrada com shibari e suspensa. (Foto: Reprodução Globoplay)
Cena de Verdades Secretas II em que personagem é amarrada com shibari e suspensa. (Foto: Reprodução Globoplay)

Mas não foi assim. Sentei por alguns minutinhos em um dos sofás da festa à espera da atração que começaria em 30 minutos e nada. Nenhuma corda pelo corpo. Ninguém suspenso. "Cadê esse shibari?", questionei.

Enquanto eu e um amigo estávamos visivelmente perdidos, Glauber dá risada e nos surpreende: “Sai desse sofá, menina. É em outro lugar”. E nos leva até outra sala, dessa vez, sob uma luz vermelha, onde as amarrações estavam ocorrendo.

Para minha decepção, ninguém estava suspenso, mas Glauber explica. “Infelizmente, o local não tem a estrutura necessária que é segura para chegarmos até essa parte. Então, ele vai mostrar algumas técnicas aqui mesmo nesta cadeira”.

Ao lado, uma psicóloga descoladíssima, Vanessa Naves, apresenta aos convidados uma série de produtos eróticos da sua sex shop on-line.

Nos dois sofás dentro da sala, alguns curiosos assistem e outros arriscam curtir a amarração. Depois de uns minutos, Glauber questiona: “Não vai provar? Vai escrever como?”, diz apelando pra gente deixar a vergonha de lado.

Demetrio se interessou pela técnica e hoje, arrasa no shibari. (Foto: Projeto Freedom)
Demetrio se interessou pela técnica e hoje, arrasa no shibari. (Foto: Projeto Freedom)

Sentei-me na cadeira e a primeira pergunta ao artista Demetrio Ogata, experiente no shibari, foi: “Vai doer?”. É claro que a resposta não poderia ser outra: “Só se você quiser”, brinca. “Mas vou fazer uma amarração simples pra você sentir como é”, acrescenta.

Com nós muito específicos e difíceis de decorar em poucos minutos, Demetrio começa a amarração pela barriga, passa pela região do tórax, braços e depois, de forma mais firme, nos punhos, deixando as mãos grudadas e totalmente imobilizadas. A sensação que no começo até parece angustiante, vai embora pela curiosidade sobre as mil possibilidades de explorar o corpo da parceira ou do parceiro naquela situação.

Demetrio então exemplifica essas sensações primeiramente com uma pena. Fazendo movimentos suaves do rosto até as pernas. Nesse momento, o toque leve mostra todo o seu poder. Mas isso durou poucos segundos, até que ele sugeriu outro objeto, a queima de velas. Também um dos artifícios usados durante a contenção para que a pessoa mergulhe nas mais variadas sensações, da dor ao prazer.

A parafina começa a cair nas mãos. Não dói, a primeira reação é só susto. Depois, ele vai derramando por outras partes do corpo. Também não queima, fiquem tranquilos. Há, inclusive, velas que são comestíveis e o jogo erótico pode ficar ainda mais interessante.

Durante a exemplificação, um dos curiosos questiona: “E que hora penetra?”. Demetrio então explica quase didaticamente.

“No processo, podemos brincar com todos os nossos estímulos sensoriais, podendo envolver o toque, a massagem, o uso de alguns adereços, como pena, vela, até uma simples troca de olhar e alguns sussurros no ouvido chegando à penetração em si, mas não necessariamente e nem é o objetivo da prática. As cordas são utilizadas para restringir os movimentos e isso gera uma sensação única. O objetivo principal é impactar a sensibilidade, sentir a corda passar na pele nos apertando”.

Glauber Portman com as cordas do shibari no corpo e amordaçada com uma maçã. (Foto: Rodrigo Bevenuto)
Glauber Portman com as cordas do shibari no corpo e amordaçada com uma maçã. (Foto: Rodrigo Bevenuto)

Demetrio, que é acadêmico de Educação Física, artista da dança e do circo, conheceu a técnica há algum tempo em seu penúltimo relacionamento como submisso (quem é amarrado), mas só no final de 2021, começou a praticar a dominação (quem amarra). “Minha curiosidade surgiu a partir do aspecto estético que as cordas formam junto ao corpo”.

O contexto histórico também o interessou, ele explica que o shibari surgiu durante a era feudal no Japão e era utilizado como uma forma de aprisionar, conhecida como hojojutsu, e já no século seguinte, foi utilizado como forma de tortura e punição. Foi só no século XX que a técnica surgiu no palco e foi reimaginada para que os atores pudessem reencenar os movimentos com mais segurança e com uma estética visual mais ousada.

“Hoje, o shibari é conhecido como uma arte erótica, porém existem diversas outras vertentes, como a artística, sensuais e até terapêutica, sendo associada ao tantra e diversas outras formas meditativas”, esclarece.

Sobre os nós – O posicionamento dos nós em locais apropriados estimula pontos de pressão no corpo, de forma muito similar às técnicas de acupuntura. Dessa forma, apesar de todo o apelo sensual e erótico que a técnica tem, ela também traz um potencial emocional, com um efeito similar a um processo terapêutico e de autoconhecimento, trazendo sentimentos como relaxamento, paz e confiança.

“É uma arte que pode liberar diversas emoções, contanto que você esteja disposto a se render a todas as sensações que ela pode despertar”, diz Demetrio.

Sobre a La Puta – Muita gente questiona a Glauber sobre a razão de levar o fetiche para suas festas, mas foi exatamente por isso que surgiu a La Puta. Não significa putaria, a não ser que você queira e tudo bem, mas a festa surgiu, segundo a produtora, da necessidade de falar sem pudores sobre o prazer coletivo, levando o sexo e o universo fetichista a outro patamar. “Nossa festa serve como caminho de desconstrução, de diálogo e de libertação”.

A ideia é a cada edição trazer outras expressões e modos do que pode ser o sexo, exibindo a diversidade e as possibilidades para se atingir o prazer. “Esse prazer que vai além da penetração, que vai além do clichê “pau e boceta” ou da posição “papai e mamãe”. O sexo não é somente penetração, ele é toque, é arte, é movimento. E o evento faz essa junção de festa, balada, pegação da noite unindo-se à arte do sexo”, finaliza.

Festa La Puta nasceu para desmistificar as possibilidades no sexo. 
Festa La Puta nasceu para desmistificar as possibilidades no sexo.

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