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Quando a vontade de morrer surge no Facebook, vale a pena ficar em silêncio?

Psicóloga explica como reagir quando alguém que deseja morrer se expõe na internet ou na vida.

Thailla Torres | 25/04/2019 07:59
O que fazer quando um "anúncio" de suicídio aparece na sua frente?
O que fazer quando um "anúncio" de suicídio aparece na sua frente?

Para mim, o maior desejo hoje é chegar a minha casa e dizer “eu te amo” a quem vive ao meu lado. Penso nisso com mais vontade depois do último dia 15 de abril em que velei uma colega que se enforcou. Isso também ganhou peso depois de ler que amiga jornalista pulou de um prédio e ver outra pessoa narrando no Facebook o desejo de "pular fora da vida". Esses três exemplos trazem no contexto uma assertiva: ninguém se mata em silêncio. Há sempre um pedido de socorro.

Mas a liberdade de um suicida, por exemplo, nas redes sociais, atinge em cheio nosso medo e a nossa covardia. Paralisa ao ponto de não saber o que dizer à pessoa que revela na internet estar prestes à cometer uma tragédia.

No Jornalismo existe a tese que falar sobre suicídio levaria à morte de outras pessoas. Na vida, há quem diga que falar sobre isso é atrair algo ruim. Mas com o número de fatalidades aumentando, será mesmo que o único jeito de respeitar a dor outro é ficar em silêncio?

No consultório da psicóloga Joana Tereza Simczak, ela é enfática ao dizer que “falar da morte não mata ninguém” e que do ponto de vista profissional conversar sobre o suicídio é altamente necessário.

Longe de ser um gatilho, no consultório chegam muitas crianças, adolescentes e adultos, suicidas ou não, que se sentem acolhidas quando o ato que tanto atormenta vira conversa na terapia. “O impulso para a morte é algo muito forte e o que leva ao suicídio é o desespero, a desesperança e o sentimento de não ver saída. É realmente viver o extremo vazio”, diz. “Por isso falar sobre suicídio não pode ser uma coisa ruim, afinal o primeiro gatilho é quando a pessoa sentiu a vontade de não existir, agora, enquanto ela estiver viva, o que ela precisa é de acolhimento”, explica psicóloga.

A psicóloga Joana Tereza Simczak é enfática ao dizer que “falar da morte não mata ninguém”. (Foto: Thailla Torres)
A psicóloga Joana Tereza Simczak é enfática ao dizer que “falar da morte não mata ninguém”. (Foto: Thailla Torres)

Ainda que seja difícil reagir a um “anúncio” de suicídio nas redes sociais, a psicóloga alerta sobre a necessidade de sair do silêncio e tentar ajudar quem sofre. Isso, longe da internet. “As redes sociais unem pessoas que estão longe e separam as que estão próximas. Isso faz com que a gente acredite que falar pelas redes é também a melhor forma de dar atenção e cuidar do outro, mas nem sempre. Nesses casos, ligue, vá atrás, encontre pessoalmente e esteja disposta a ouvir o outro”, pontua.

O mais importante, na avaliação dela, é não julgar. “Não adianta querer ajudar fazendo comparações com o número de pessoas que estão sofrendo com a miséria no mundo. O problema de quem pensa em suicídio é outro”, observa.

Isso vale para outras situações ainda que sejam fora das redes sociais. Em casa, no almoço em família, na escola, no trabalho ou no bate-papo entre amigos. “Não se pode ter medo de falar sobre o assunto. Se a pessoa deu sinais de sofrimento, pergunte. Não precisa necessariamente falar em suicídio, mas é possível questionar ao individuo se ele já pensou em morrer ou se já se imaginou morrendo. Quando você pergunta você abre brecha para a pessoa se sentir acolhida”, explica.

O assunto pode ser debatido, com suavidade, até mesmo com crianças, diz a psicóloga. “Recebo crianças em meu consultório que já falam de suas dores, da vontade de morrer, mas que não sabem nem receber um olhar, não sabem falar dos próprios sentimentos, não sabem escolher e se confundem com os próprios desejos. Isso, em muitos casos leva a depressão e são gatilhos para que crianças e adolescentes tentem tirar a própria vida”.

Ao falar sobre a morte, com quem quer seja, é preciso entender também a necessidade de tratamento, alerta Joana. “É necessário procurar um médico psiquiatra ou psicólogo, buscar um tratamento e alinhar o acolhimento com os métodos científicos que ajudam o individuo a compreender o próprio comportamento”.

Ela cita, por exemplo, casos de adolescentes que acabam se cortando. “Eles se cortam para sentir alguma coisa. E quando você conversa com ele sobre esse sentimento a angustia diminui. E a morte é uma angustia e um desespero em não ver saída. Por isso, falar sobre a morte e o suicídio é dar um novo sentido para esse desespero”.

No primeiro momento, não falar sobre o assunto parece viável para não alimentar um sofrimento, mas a própria internet, fervendo com tanta informação, deixa claro que não há mais controle sobre esse tipo de assunto. “Nos dias de hoje, no desespero, as pessoas vão para dentro da internet e, a própria internet, ensina abertamente como se matar”.

Muitos morrem sem nunca ter conversado com o outro sobre suicídio e nem ter lido uma notícia de que alguém pulou de um prédio. Por isso, sair do silêncio pode ser a forma mais humana de lidar com a dor do outro e garantir o abraço que o silêncio faria ser o último. “Falar sobre a morte não é matar ninguém, é esclarecer os sentimentos. E não se pode ter medo de falar sobre os sentimentos”.

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