O sobá escancarado de hoje já foi vendido entre cortinas de lençol em 1965
Quem nunca provou ou trouxe gente de fora para o programa tipicamente campo-grandense, de ir à feira e comer sobá? O Lado B até que tentou, mas não teve cozinheira que revelasse quantas calorias tem no prato que é a cara de Campo Grande. Acontece que quem come pouco se importa mesmo com o que vai pesar depois na balança.
A feirante Jadi Tamashiro, 47 anos, está entre as barracas mais conhecidas na Feira Central. Há 15 anos ela trocou a copiadora onde trabalhava pela barraca dos tempos de rua, na Abrão Julio Rahe. Apanhou muito, mas hoje admite, com modéstia a parte, que faz e vende o melhor sobá de Campo Grande.
Ela conta que o segredo está no sabor do caldo, feito de pucheiro, com a carne cozinhando por horas a fio no fogão. A receita vinda da Ilha de Okinawa já foi bem abrasileirada. O tradicional mesmo tende a ser adocicado, o que na opinião da Jadi, seria insosso para o paladar do campo-grandense.
O macarrão é caseiro e feito na própria fábrica da família, o caldo vem do pucheiro e em seguida é a carne escolhida pelo cliente, cebolinha e tiras de ovos. O tempo médio, dependendo do movimento, é de que o prato chegue a mesa entre 5 e 10 minutos depois de pedido, informou a feirante.
Vivendo de sobá e porções três dias por semana, o Lado B pergunta: e não enjoa não? “A gente? Não. Por exemplo, eu vou em sobaria e peço sobá para experimentar e saber se é igual o nosso. Até hoje não achei melhor. A gente gosta mesmo”, diz.
Mais sul-mato-grossense do que paranaense, Magda Grellmann, de 44 anos, comia o sobá de toda semana. Moradora de Campo Grande há mais de 30 anos, ela tem quase certeza que este foi o primeiro prato típico que ela comeu aqui no Estado. “Eu faço questão de comer um sobá, no frio porque ele é quentinho e no verão, também é gostoso, acho um prato leve”, diz.
A analista de sistemas Juliana Pacheco, de 34 anos, veio do Rio de Janeiro pra matar as saudades da família e também do sobá da feira. Ela morava em Campo Grande, mas depois que casou se mudou para o estado carioca. O resultado é que a cada visita aos familiares, a feira também entra no roteiro. “O sobá é muito bom e eu recomendo”, comentou.
Hoje ninguém como escondido, mas quando o prato começou a ser servido a tradição era comer entre lençóis. Uma espécie de cortina para tampar os envergonhados que não sabiam usar o hashi. Vindo da Ilha de Okinawa, quem tornou o sobá comercial foi Hiroshi Katsuren, o primeiro a vender o produto na feira, em 1965.
“Na época não tinha nada de registro, não foi tirada foto, sou testemunha porque ajudei meu pai”, conta a comerciante Cristina Katsuren Nakasato, de 61 anos. A ideia não era de trazer a culinária de Okinawa para a Capital sul-mato-grossense e se tornar símbolo da cidade. Longe disso, Cristina ressalta que foi apenas uma questão de sobrevivência.
“Hoje a gente fica orgulhoso. Meu pai morreu, mas minha mãe ainda é viva”, completa.
Ainda entre os lençóis, foi quando os amigos da família, brasileiros, tomaram gosto pelo prato que a vergonha foi saindo do esconderijo e hoje está como está, descaradamente o prato mais gostoso de Campo Grande.