Júlio Cesar diz que trabalhou de graça para Bernal no “interesse da coletividade
O presidente da secional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MS), Júlio Cesar Souza Rodrigues, afirmou nesta tarde, em entrevista ao Campo Grande News, que prestou serviços de graça para a Prefeitura de Campo Grande até agora, já que no dia 5 de agosto vencia o prazo para apresentação de recurso contra o índice do ICMS fixados para a Capital. “Fiz isso para preservar o interesse da coletividade, que é maior do que o do cidadão Júlio Cesar”, justificou o advogado.
Documentos obtidos pelo Campo Grande News comprovam que Julio Cesar, embora negue que tenha assinado contrato com o prefeito Alcides Bernal, obteve procuração para representar o Municípío e impetrou o recurso administrativo junto à Secretaria Estadual de Fazenda (Sefaz), visando elevar a participação no bolo do ICMS. Tratou-se do processo Sefaz nº 11/030877/2013, de 5 de agosto deste ano, para impugnação do índice do valor adicionado, previsto na Resolução/Sefaz nº 2.482, de 4 de julho de 2013.
Júlio Cesar justificou o serviço prestado alegando que havia uma situação de “urgência” e ainda não haviam sido concluídas as tratativas contratuais. “Mas já tinha parecer do secretário municipal de Planejamento, Finanças e Controle e da Procuradoria Jurídica da Prefeitura pela contratação”, apontou o dirigente, que garante não ter recebido um centavo sequer da prefeitura até o momento. "Não tive nenhum pagamento de remuneração", assegurou.
Essa negociação de serviços foi questionada primeiramente pela imprensa, depois pelo conjunto de forças de oposição à atual presidência da OAB-MS e depois pela própria diretoria da entidade, deixando Júlio Cesar isolado no seio da categoria dos advogados. Estão em questão problemas éticos, morais e legais, além da rapidez nos procedimentos preliminares. O problema ético foi o maior, entre os advogados, já que Júlio ficaria impedido de julgar com isenção processos contra Bernal, que também é advogado. Bernal está sendo processado por problema ético em relação aos serviços que prestou para a ex-catadora de lixo Dilá de Souza.
Numa agilidade impressionante, no prazo de 24 horas estava tudo providenciado, com possibilidade de o contrato ser firmado emergencialmente e com dispensa de licitação. Todo o processo de abertura de nota de empenho, justificativa para dispensar a licitação e consulta ao advogado para a prestação do serviço aconteceu entre os dias 31 de julho e 1º de agosto deste ano.
Além disso, apesar de não ser especialista em direito tributário, o presidente Júlio Cesar foi contratado por Bernal para entrar com ações administrativas e na Justiça buscando elevar o índice de ICMS do município de Campo Grande. A “notória especialização”, disciplinada pela Lei 8.666, para a inexigibilidade de licitação não estaria contemplada. Pelo trabalho, Júlio Cesar iria receber R$ 11,2 mil mensais e ainda poderia ganhar milhões caso tenha êxito nas ações contra o Governo do Estado, visto que terá direito a 15% de cada 0,0001 de acréscimo no índice do ICMS por 12 meses em 2014.
Quanto aos problemas éticos, Júlio Cesar se defende afirmando que sempre se deu por impedido, desde que começaram as tratativas contratuais com o prefeito, atribuindo processos que interessam ao Município de Campo Grande ou ao advogado Alcides Bernal a outros dirigentes da OAB ou órgãos competentes. “Eu me afastei dos atos decisórios”, assegurou o dirigente, lembrando que foi assim quanto ao pedido de assistência formulado pelo Ministério Público para que a OAB ingressasse no processo sobre aumento salarial do prefeito, vereadores e secretários municipais ou ao processo referente a Dilá Dirce de Souza. Recordou-se que no caso da CPI do Calote nomeou uma comissão para deliberar em 60 dias e depois baixou portaria nomeando o vice-presidente para deliberar.
No tocante à alegação de desrespeito à Lei das Licitações (Lei nº 8.666), o presidente da OAB-MS argumenta que não é imprescindível que haja especialização em direito financeiro ou tributário para defender interesses relativos a essas áreas para a Prefeitura de Campo Grande ou outro ente público. Alega que tem especialização em Direito Processual Civil e trabalhos na área do Direito Constituicional, além de experiência em ações relativas a disputas tributárias. Indagado se não estaria melhor preparado para ação um especialista em direito financeiro ou tributário, Júlio Cesar respondeu: “Não estaria. Todos estão habilitados desde que tenha condições de desenvolver o serviço”.
Crença na absolvição – O presidente da OAB-MS acredita que será absolvido no processo ético instaurado pelo Conselho Federal. Para ele, tudo não passada de um fato que foi “politizado” e com abstenção proposital da análise da “legalidade”. Lembra que foi a seu próprio pedido, no dia 16 de outubro, que o Conselho Federal abriu o processo disciplinar, ao mesmo tempo em que solicitou liminar, confirmada no último dia 26 de novembro, para revogar a portaria que havia criado na seccional sul-mato-grossense uma comissão estadual de investigação.
“Fui eu que pedi ao Conselho Federal para verificar se a contratação com a Prefeitura havia violação à legalidade, à moralidade, à ética. Não foi só para declarar nula a portaria”, afirmou Júlio Cesar, informando que um pouco antes, no dia 8 de novembro consultou sobre a possibilidade de o advogado que é presidente da OAB firmar contrato com ente público, obtendo uma resposta positiva. “A súmula do STF 004/2012 prevê inexigibilidade de licitação para contratação de serviços especializados de advocacia”, apontou.
As manifestações nacionais da OAB, segundo Júlio Cesar, são inteiramente favoráveis ao contrato com a prefeitura até agora. Argumenta que no dia 18 de outubro foi concedida liminar para suspender a portaria que criou a comissão estadual de investigação. “E o relator fez referência á legalidade do contrato”, observou o dirigente.
Lembra que no dia 21 de outubro a oposição à sua gestão na OAB, liderados pelo advogados Alexandre Bastos e Marco Túlio entraram com representação disciplinar no Conselho Federal da Ordem, com pedido liminar pelo afastamento do presidente da seccional de MS, alegando ilegalidade no contrato com Bernal e apresentando argumentação de que poderia haver favorecimento ao então procurador do município, Luiz Carlos Santini, que respondia a procedimento na entidade.
“No dia 21 de novembro fui intimado para defesa prévia e comunicado do indeferimento da liminar pleiteada por falta de fundamentação legal, o fumus boni iuris e o periculum in mora”, argumentou Júlio. “E não identificava, a princípio, nenhum comportamento antiético”, acrescentou o presidente, lembrando que cinco dias depois, em 26 de novembro, houve a confirmação dessa decisão.
Renúncia, não – Júlio Cesar continua rejeitando a possibilidade de renunciar ao cargo de presidente da OAB-MS, apesar de estar isolado na entidade, com o restante da atual diretoria considerando que houve desvio ético nas tratativas contratuais com o prefeito Alcides Bernal. Indagado se já pensa em renunciar, ele declarou: “Lógico que não. Não cometi crime nenhum. Vou continuar trabalhando em prol dos advogados até o final do meu mandato”. O mandato de Júlio só termina em 31 de dezembro de 2015.
Quanto ao fato de estar isolado na diretoria da OAB-MS, Júlio considera que se trata de um assunto que precisa ser resolvido internamente, preferindo não fazer comentários a respeito. “Isso é interna corporis”, limitou-se a dizer.