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Reportagens Especiais

Libaneses e palestinos dividiram coração comercial da Capital

Michel Faustino | 23/08/2014 08:30
Libaneses e palestinos dividiram coração comercial da Capital
Rua 14 de julho na década de 1950 (foto: arquivo/ Roberto Higa)
Rua 14 de julho na década de 1950 (foto: arquivo/ Roberto Higa)
O engenheiro destaca a aceitação da culinária árabe pelo povo sul-mato-grossense. (foto: Marcelo Calazans)
O engenheiro destaca a aceitação da culinária árabe pelo povo sul-mato-grossense. (foto: Marcelo Calazans)

Fugindo dos conflitos do Oriente Médio ou em busca de uma vida melhor, em meados de 1912, centenas de sírios, libaneses, turcos, armênios e jordanianos desembarcaram por essas bandas e ajudaram a construir a história de Campo Grande. Muitos deles vindo de Corumbá, a 426 quilômetros da Capital, por onde chegaram pelo então porto Comercial de Mato Grosso, outros, por aqui chegaram pela Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, a qual ajudaram a construir.

De mascates a grandes lojistas, os primeiros árabes que aqui chegaram tiveram um papel muito importante na difusão do comercio. Registros históricos apontam que em 1933, pouco mais de 20 anos desde o primeiro registro da chegada deste povo, 90% dos comércios existentes nas ruas 14 de julho e Calógeras, que anos depois se tornaria o coração comercial de Campo Grande, eram pertencentes aos árabes, em sua grande maioria: libaneses, palestinos e seus descendentes que até hoje por ali estão.

Exímios vendedores e comerciantes por vocação, não foi à toa que as primeiras "lojinhas" foram instaladas nessa região da cidade. Era ali, com a chegada da ferrovia, que estava o movimento." Centenas de pessoas transitavam diariamente naquela região. Um prato cheio para as vendas", relata o comerciante palestino Ale Faris, 66 anos, que ao chegar por aqui na década de 1960, ouvia com esperança as conversas de seus patrícios, que fizeram a vida por essas terras.

Longe dos conflitos religiosos e das diferenças socioculturais, uma curiosidade em relação aos primeiros comerciantes que aqui se instalaram vive apenas na memória dos mais antigos. Há relatos de que os primeiros libaneses, de origem cristã maronita e palestinos de origem muçulmana que chegaram por aqui, "não se batiam" e se dividiram. Ficando os libaneses na rua 14 de julho, e por sua vez, os palestinos na Avenida Calógeras, dividindo o coração comercial de Campo Grande.

De acordo com o pesquisador e historiador Hildebrando Campestrini, não há registros oficiais de que isso realmente tenha acontecido, mas o fato pode ser explicado pela situação financeira das duas comunidades e não por conflitos religiosos.

Campestrini lembra que os primeiros libaneses que aqui chegaram possuíam condições melhores do que os palestinos, o que facilitou para que eles se estabelecessem mais rapidamente em um lugar "bem localizado".
"Geralmente os primeiros palestinos que chegavam aqui não tinham dinheiro. Eles tinham que trabalhar muito, como mascates e posteriormente no comércio. Já os libaneses vinham com dinheiro e por consequência conseguiram ir para 14 de julho que era considerada uma rua nobre e vender produtos mais refinados. Eles eram considerados a elite do povo árabe. Mas, essa divisão aconteceu só por isso. Não porque o povo não se batiam ou traziam alguma indiferença", lembrou.

Segundo o historiador, o único incidente envolvendo libaneses e palestinos foi um assassinato em meados da década de 1950 na Rua 14 de julho, que nem foi noticiado pela imprensa.

Alguns descendentes ainda permanecem com comércio na 14 de julho (foto: Marcelo Victor)
Alguns descendentes ainda permanecem com comércio na 14 de julho (foto: Marcelo Victor)

De comerciante à doutor - O povo árabe não contribui tão somente para difundir o comercio de Campo Grande. Enquanto seus pais se dedicavam ao comercio, os filhos estavam se dedicando aos estudos "sonhando em ser doutor", diz o engenheiro Eid Toufic Anbar, presidente da Associação Cultural Monte Líbano de Mato Grosso do Sul.

Eid conta que chegou em Campo Grande em 1975, onde constituiu família. Atualmente como curador da cultura libanesa no Estado, o engenheiro fala com orgulho da contribuição da comunidade libanesa e seus descendentes, que é de cerca de 60 mil em todo o Estado.

Segundo ele, a primeira edificação de grande porte, a Galeria São José, foi construída por um libanês. Eid cita ainda a importância da família Neder, responsável por trazer para Campo Grande o sistema de telefonia fixa. Além da contribuição política. Destaque para a família Trad e Tebet.

Apesar de citar grandes nomes do empresariado e comercio, Eid diz que não há como não falar da culinária árabe, incorporada com sucesso ao "bom gosto sul-mato-grossense". "Eu acho que o grande símbolo dessa integração é a culinária que foi tão bem aceita em Campo Grande. Hoje qualquer feira por ai tem ícones da culinária árabe como o quibe, tabule, cafta e especiarias", diz.

Toufic fala da importância da comunidade libanesa para Campo Grande (foto: Marcelo Calazans)
Toufic fala da importância da comunidade libanesa para Campo Grande (foto: Marcelo Calazans)
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