Candidaturas municipais e o tema da água
O período eleitoral é sempre um momento importante de reflexão a respeito de temas fundamentais à sociedade e ao nosso cotidiano. Muito em breve teremos as eleições municipais e, nesse caso, direcionamos os holofotes para aquilo que nos afeta no dia a dia nas cidades.
O tema dos recursos hídricos costuma ser tratado com frequência nos âmbitos estadual e federal, afinal, o nosso sistema federativo muitas vezes atribui o protagonismo da elaboração de políticas públicas a uma escala mais abrangente. No entanto, o período de campanhas municipais é um momento oportuno para investigar de que forma o tema da água se relaciona com as responsabilidades dos nossos representantes nas cidades: os prefeitos e vereadores.
No contexto das campanhas municipais, o tema da água frequentemente aparece “disfarçado”. É comum surgirem debates entre candidatos a respeito de ruas que alagam mesmo sem chuvas expressivas, bairros que apresentam deficiência na cobertura de água encanada, córregos com mau cheiro e depósito de lixo, entre outros problemas que são, infelizmente, velhos conhecidos da vida nas cidades brasileiras.
O que essas situações exemplificadas têm em comum é justamente o fato de estarem relacionadas a uma má gestão de recursos hídricos. Aprofundarmos a reflexão sobre como os nossos candidatos se posicionam frente a esses desafios é, portanto, fundamental para garantirmos que as políticas públicas relacionadas à água sejam mais efetivas e o nosso direito como cidadãos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, garantido.
O que os eleitos para o legislativo e executivo no nível municipal podem fazer de modo a dar a devida atenção ao tema da água? Quais suas responsabilidades e limitações? E como podemos investigar se nossos candidatos estão preocupados com uma gestão eficiente de recursos hídricos?
Podemos focar em quatro pontos o tema da água nas propostas às candidaturas municipais: saneamento básico, alagamentos, ocupações irregulares e proteção de nascentes, rios e córregos. Vamos detalhar cada uma delas.
A aprovação do Novo Marco do Saneamento em 2020 deu a esse tema o merecido destaque no cenário político brasileiro. Esse é também um aspecto central para a discussão dos recursos hídricos no âmbito das cidades, uma vez que a legislação estabelece que os municípios são os titulares do serviço de saneamento.
Além disso, é do município a responsabilidade de elaborar o Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB). Esse instrumento abrange quatro áreas: serviços de água, esgotos, resíduos sólidos e drenagem das águas pluviais. Cabe, por fim, destacar que compete à administração municipal incluir as metas de universalização, definidas no Novo Marco, nos seus contratos de fornecimento de água e de tratamento de esgoto. Essa readequação deve ser concluída até 2022, e as metas de saneamento devem ser cumpridas até 2033.
Eventos como alagamentos são frequentes no cotidiano urbano, trazendo inúmeros transtornos à população. A questão da prevenção de eventos de enchentes é uma das metas do PMSB e, como já citado, um dos quatro serviços abrangidos pelo documento é justamente a questão da drenagem urbana. Mas, além da gestão das águas pluviais, definida nos Planos, a questão dos alagamentos está ligada também à infraestrutura viária de responsabilidade dos municípios e à interlocução com a Defesa Civil municipal.
Grande parte das ocupações irregulares acontecem em áreas ribeirinhas, o que acaba ocasionando a degradação da mata ciliar e das nascentes dos córregos e rios que cruzam os municípios. Essas áreas são mais suscetíveis a eventos de cheia, e, portanto, as ocupações nesses locais colocam em risco não apenas a qualidade da água dos nossos mananciais, mas também a população que vive nessas áreas. Para enfrentar essa questão, entra em cena o instrumento indutor do desenvolvimento urbano: o Plano Diretor Municipal, previsto no Estatuto das Cidades, que tem como um dos seus objetivos a preservação dos recursos hídricos. A revisão do Plano é de responsabilidade do poder público municipal.
Os municípios podem administrar Unidades de Conservação, áreas legalmente instituídas com o objetivo de proteger espécies, habitats, ecossistemas, água e processos ecológicos nelas existentes. Essa é apenas uma das formas de garantir a proteção de nascentes e córregos nas cidades. Vale ressaltar também a importância da Educação Ambiental, que pode ser proposta por políticas públicas municipais do setor, na criação de uma conscientização do papel de cada cidadão na qualidade dos mananciais no seu entorno.
E, finalmente, como podemos verificar as propostas dos nossos candidatos em relação ao tema da água?
- Procurar, nas propostas dos candidatos, palavras-chave relacionadas aos quatro temas abordados neste artigo;
- Enviar perguntas sobre questões ligadas aos recursos hídricos aos jornais e emissoras que realizam debates entre os candidatos;
- Investigar o histórico do candidato em relação à sua atuação nos quatro temas discutidos;
- Usar as redes sociais para se comunicar com o seu candidato a respeito das suas ideias e dos seus projetos para uma gestão de recursos hídricos mais eficiente.
(*) Marcela Nectoux é Engenheira Ambiental, mestranda em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos (PROFÁGUA/UFRGS) e integrante do grupo de pesquisa em Gestão e Planejamento de Recursos Hídricos da UFRGS.