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Cartão de crédito: mocinho ou vilão?

Patricia Capitanio (*) | 29/07/2023 08:30

O número de cartões de crédito já superou em 77% a população economicamente ativa no Brasil. São 190,8 milhões de cartões para 107,4 milhões de pessoas. Embora esse cenário demonstre um aumento da inclusão financeira no país, também gera risco de endividamento a muitas famílias.

Mocinho ou vilão, depende. Como o cartão é um meio de pagamento, o que faz dele um vilão é seu uso inadequado e imediatista. Por outro lado, quando há planejamento e inteligência financeira, é possível incorporar muitos benefícios como programas de milhagem e pontos para troca de produtos. Mas é importante estar atento aos detalhes.

Recentemente, durante uma consultoria, uma cliente justificou que fez a adesão a um cartão de determinada instituição bancária porque ganhava anualmente uma viagem, porém, ela nunca observou que o valor da anuidade, que era de R$ 1,2 mil, equivalia a uma passagem aérea, ou seja, o "benefício" era uma ilusão.

Outros erros comuns são atrasar o pagamento ou parcelar a fatura, que podem gerar um efeito de "bola de neve" nas dívidas por causa dos juros exorbitantes (entre os maiores do mundo). Então, se você não consegue ter controle na hora de comprar, precisa avaliar se realmente tem condições de ter um cartão.

Talvez o vilão dessa história seja você, como aconteceu a um cliente que, mesmo tendo renda mensal de R$ 4,5 mil, obteve um cartão com limite de R$ 50 mil e fez desse recurso disponível um "extra" para viver um padrão de vida acima do que podia pagar. Resultado: faturas de R$ 15 mil a R$ 18 mil. "Não sei como gastei tudo isso!", ele dizia.

E agora, de que jeito eu saio das dívidas? Ao chegar a esse ponto de superendividamento, costumo orientar o cancelamento, ainda que temporário, de cartões de crédito, aliado à renegociação dos valores. Porém, a conscientização sobre crenças e hábitos financeiros é fundamental para não repetir esse mesmo ciclo.

Além disso, há escolhas que podem impactar por décadas a sua vida e o seu orçamento. Então, é importante planejar, fazer contas e pesquisar preços e condições para evitar uma decisão precipitada. A casa dos sonhos pode se transformar em um pesadelo e muitos casamentos já se desintegraram por problemas com dinheiro.

Segundo a afirmação do filósofo Jean-Paul Sartre, "o inferno são os outros". Mas ao adentrar no tema organização financeira, vamos nos deparar com uma questão crucial: a responsabilização pelas nossas escolhas. Não, o banco não obriga você a usar o dinheiro do limite da conta ou fazer do cartão de crédito sua renda extra.

Há uma tendência em culpar as instituições bancárias pelo endividamento. Ou a situação econômica do país. Concordo que os juros praticados são, muitas vezes, exorbitantes, no entanto, a expansão do crédito não é ruim, ao contrário, reflete um cenário de maior acesso a produtos e serviços financeiros pela população.

A bancarização foi responsável, por exemplo, pela popularização de contas digitais e outros meios de pagamentos eletrônicos, como foi com o pix, que são serviços menos burocráticos e em geral gratuitos. Então, ao invés de focar em questões que extrapolam a nossa vida, vamos buscar mudanças sólidas e definitivas em nós mesmos.

Costumo bater na tecla que falar sobre dinheiro não deveria ser um tabu. Só assim deixaremos de eleger bichos papões, monstros ou vilões. Ser um adulto responsável exige uma postura madura em relação a este tema. Como diria o escritor Millôr Fernandes "o dinheiro não traz felicidade, mas manda buscar".

(*) Patricia Capitanio é graduada em Ciências Contábeis, com MBA em Auditoria e perícia Contábil.

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