Dinâmicas da nova regulação do mercado de apostas esportivas
O mercado de apostas esportivas chama atenção por seus números. Estima-se que, somente em 2021, R$ 4 bilhões foram movimentados nesta modalidade de aposta. Inicialmente, a Lei 13.756/2018, timidamente, e antes do boom dos operadores de apostas no mercado, previu em seu artigo 28 a modalidade de aposta de quota fixa, cujo caráter seria de serviço público exclusivo da União, cuja exploração ocorreria em todo território nacional. A regulamentação por esse artigo se mostrou ineficiente em face dos avanços de modalidades de aposta, e em razão disso foi editada a Medida Provisória nº 1.182/2023 visando alterar o quadro normativo do setor.
A principal mudança, no próprio artigo 28, diz respeito a alteração daqueles que podem explorar as apostas de quota fixa, possibilitando a abertura deste setor comercial aos mais diversos players. A atuação no setor se dará mediante autorização, permissão ou concessão — em caráter oneroso, cuja regulamentação ficará sob responsabilidade do Ministério da Fazenda.
A quota fixa para os fins da regulamentação é aquela em que há fator de multiplicação do valor apostado que define o montante a ser recebido pelo apostador. As apostas poderão ser feitas em meio físico ou digital, como é o caso das famosas bets. Será denominado agente operador aquele que vier a obter a outorga para explorar o serviço de apostas, seja na modalidade de autorização, permissão ou concessão.
O apostador será aquele que aposta em meio virtual ou adquire bilhete em meio físico. A regulamentação estabelece que só poderão ser apostadores as pessoas físicas, elenca também aqueles que não podem ser apostadores: dirigentes de agentes operadores, menores de 18 anos de idade, pessoa com influência ou acesso ao sistema de apostas, agentes públicos fiscalizadores, entre outros.
A utilização de sistema do agente operador (sites e aplicativos), pelo apostador, pode gerar uma série de insatisfações. Tem se verificado que o apostador se vale de sites como o reclame aqui e o consumidor gov, para verbalizar suas insatisfações, canais conhecidos por resolver lides no âmbito da relação consumerista, com isso em vista, levanta-se o questionamento se a relação entre apostador e agente operador é uma relação de consumo.
A relação de consumo é definida pelo Código de Defesa do Consumidor em que há um consumidor que adquire para sua utilização, em caráter de destinatário final, bens ou serviços de um fornecedor, que age com habitualidade e finalidade de lucro. Inicialmente, já podemos descartar a presença de quaisquer bens nesta relação, restando a estreita via dos serviços.
O operador de apostas funciona como um receptador de intenções daqueles que realizam a aposta, seu papel é disponibilizar a plataforma, com indicativo dos eventos que estão suscetíveis de apostas e indicadores de lucratividade daquele evento, atribuindo uma quota fixa para cada evento característico do evento (gols, faltas, impedimento, pênaltis, no caso do futebol, por exemplo), o valor recolhido fica sob custódia do operador, até a apuração dos resultados e distribuição dos resultados, se houver.
O apostador, por sua vez, não adquire algum bem ou realização presente ou futura de determinado serviço, não há sequer como falar em utilização como destinatário final de alguma atividade. Ao realizar sua aposta em um determinado evento, intermediado pela plataforma do operador, realiza um lance, que deverá — em caso de vitória do apostador — ser acrescido do resultado da quota fixa e devolvido ao apostador
Pode-se dizer que o apostador adquire uma chance, uma possibilidade de lucro, com risco de perda, o que em alguma medida, poderia equipará-lo a aquele que opera no mercado de ações secundário, adquirindo e vendendo ações visando não o desenvolvimento da companhia, mas a obtenção de lucros com operações, nestes casos não há qualquer dúvida de que este operador do mercado de ações não é consumidor, o mesmo deverá ser aplicado ao apostador, que não estará resguardado pelo direito consumerista e, portanto, o uso das plataformas retromencionadas se torna inadequado, bem como eventual intervenção do Procon.
Visualizou-se uma necessidade de regulamentação do setor, evidenciada pela expansão das apostas online, a MP 1.182 surge como resposta a necessidade. Esta medida traz consigo alterações significativas, permitindo que diversos atores participem da exploração das apostas de quota fixa. Surge a figura do agente operador, que atua como intermediário da concretização de apostas e na administração dos valores envolvidos, não podendo ser confundido como prestador ou fornecedor de produtos ou serviços, em razão da natureza particular da aposta, afastando a incidência do direito consumerista.
A edição da MP demonstra a necessidade de adequação normativa a essa mudança, abrindo as portas para uma pluralidade de agentes operadores. Todavia, ao nos debruçarmos sobre a intrincada dinâmica entre apostadores e operadores, fica evidente a necessidade de uma nova abordagem sobre essas relações. Isso suscita um desafio premente para empreendedores do setor: forjar uma estratégia de negócios que, além de promover a inovação, assegure o cumprimento da nova regulamentação.
(*) Thiago Presta Queiroz Jorge é advogado, pós-graduado em Direito Tributário .