O estresse tóxico reforça a pandemia
O medo, o pânico e a ansiedade são sintomas principais de um distúrbio que favorece o avanço da pandemia. São manifestações indicadoras de enfermidade que contribui com a propagação da covid-19. Trata-se do estresse crônico, denominado estresse tóxico, que está presente no organismo da maioria das pessoas. Pode ser mais intenso nas sociedades de países menos desenvolvidos, cujo desequilíbrio social e educativo agrava o preocupante quadro sintomático.
O estresse é, por definição, mecanismo fisiológico que, graças ao aumento da produção de cortisol, adrenalina e glicose, assegura ao indivíduo a energia para superar impactos desfavoráveis. São episódios passageiros, depois dos quais o organismo retoma a harmonia indispensável e tais substâncias voltam ao valor normal. Quando, porém, as ações estressantes se tornam crônicas, arrastando-se por tempo prolongado, o sistema protetor do organismo entra em exaustão.
Em várias observações formuladas de longa data, o estresse crônico é a doença considerada como o mal do século. Resulta de cenários ambientais adversos e persistentes, que desencadeiam as reações fisiológicas imediatas no organismo das pessoas expostas a fatores estressantes. Contudo, a ação persistente ou repetitiva dos agentes estressores mantém taxas sanguíneas elevadas de cortisol e adrenalina, que podem causar aumento da pressão arterial, acidente vascular cerebral e coagulação intravascular, entre outros distúrbios.
Com os níveis anormais do cortisol, são desencadeadas alterações múltiplas que produzem no organismo a maioria dos sintomas do mal do século, entre os quais a ansiedade, o pânico e o medo. Ademais, está comprovado que o estresse tóxico reduz a capacidade do sistema imunológico, diminuindo a resistência a infecções bacterianas e virais.
A abordagem dos conceitos fisiológicos mencionados fundamenta a argumentação de que grande número dos organismos infectados pelo coronavírus corresponde a vítimas do estresse tóxico, incapazes de resistir imunologicamente à contaminação viral em causa. Nesse contexto, as perspectivas de manutenção do organismo harmônico e equilibrado tornam-se paulatinamente obscuras. É desafio cada vez maior e, portanto, de difícil superação.
Um dos exemplos é o papel negativo, de incontestável evidência, desempenhado pelas modernas tecnologias de comunicação. As populações tornam-se reféns do verdadeiro bombardeio de mensagens que circulam diariamente, na maioria das vezes sem conteúdo construtivo em favor da sociedade.
Contradições prosperam a olhos vistos; posturas críticas e radicais tomam conta do espetáculo, imbuídas de intuitos demolidores; dados e números distorcidos são compartilhados sob o pretexto de justificar posições inconsistentes; notícias infundadas sobre os mais diversos assuntos convencem incalculável número de participantes das redes sociais; e verdadeiros dogmas são criados estrategicamente para dominar a opinião pública.
Esse cenário desumano contagia a mídia tradicional, que perde terreno e abandona os princípios morais e éticos básicos a serem mantidos como referência indispensável para essa modalidade de comunicação pública.
No panorama atual, a atmosfera reinante é poluída por agentes estressores que desencadeiam efeitos os mais nocivos sobre a mente da população, tornando-a vítima do estresse tóxico que reduz a resistência imunitária e amplia largamente a vulnerabilidade nosológica. Notícias, vídeos, informações infundadas e imagens contundentes sobre os avanços da pandemia geram os sintomas de medo, pânico e ansiedade.
Vai sendo assim demolido o alicerce pacífico da cidadania, que requer respeito à verdade e iniciativas coerentes em favor de uma consciência coletiva capaz de contribuir para o bem-estar físico, mental e social de todos e de cada um dos cidadãos.
Outro desajuste que se opõe ao benefício populacional é a politização das medidas adotadas para a reversão da pandemia no país. Interesses político-partidários desprezam a lógica científico-sanitária, que deveria fundamentar as ações destinadas a evitar a propagação do vírus. Só assim seriam tomadas iniciativas para a redução do mal do século, que torna os brasileiros suscetíveis aos alarmantes agravos infeccioso.
(*) Dioclécio Campos Júnior é professor emérito da Universidade de Brasília. Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro, é mestre e doutor em Pediatria, ambos pela Universidade Livre de Bruxelas. Ex-presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, membro titular da Academia Brasileira de Pediatria e presidente do Global Pediatric Education Consortium (GPEC). Atua principalmente nos temas: vínculo mãe-filho, aleitamento materno, nutrição infantil, crescimento e desenvolvimento, desnutrição, estreptococcias, parasitologia, saúde pública e comunicação.