O fogo e o Pantanal
Nosso histórico de relação com a natureza foi modificado quando descobrimos o “fogo”. Ele já foi usado como uma ferramenta de proteção, para afastar a ameaça de ataques de grandes mamíferos.
Ao dominar cada vez mais o seu uso, ou imaginar que podemos dominar o fogo, passamos a ser a maior ameaça quando não se utiliza essa força com o devido cuidado. Queimamos muito! Florestas, bichos, e gente! Foi nessa esteira que deixamos de ficar em perigo para sermos, de fato, o perigo.
O que assistimos nos últimos 30 dias no Pantanal deve nos levar a avaliar e refletir como podemos agir de forma preventiva e como devemos ser mais eficientes nesse caminho. Cabe destacar que a “mão humana” tornou os incêndios prematuros no Pantanal, neste ano. Não devo refletir sobre a ignorância de alguns que fomentam a discórdia e divulgam que o fogo interessa a alguns setores, ou mesmo, que o fogo tem origem dentro de áreas protegidas, como “Reservas”.
Tampouco, estou seguro em afirmar que os pantaneiros – aqueles que vivem, produzem de forma sustentável e atuam com consciência no Pantanal há séculos - jamais usaram o fogo de forma indiscriminada. Eles manejam com sabedoria este bioma pelos últimos 250 anos. Devo salientar que as pessoas que sofrem de stress de bom senso, desconhecem os fatos e não contribuem para um desafio comum que é a perpetuação desse território.
Historicamente, entre os meses de agosto e outubro ocorrem os maiores números de focos de calor. Dados que foram comprovados pelo Lasa/UFRJ a partir de estudos que envolveram suporte do IHP para que houvesse um maior conhecimento para as medidas de recuperação do Pantanal, que foi seriamente atingido pelas chamas em 2020. Situação de alerta que jamais foi identificada para junho, como presenciamos neste ano.
O que estamos notando agora é que temos as condições perfeitas para o caos: escassez hídrica, baixa umidade do ar e altas temperaturas. Essa situação crítica gerou movimentação estatal.
Em maio, o Governo do Estado disponibilizou recursos e mobilizou suas estruturas, como Corpo de Bombeiros e Defesa Civil. Também articulou com Governo Federal e houve uma mobilização antecipada do Prevfogo/Ibama. Mesmo assim, os incêndios superaram a estrutura e consumiram mais de 700 mil hectares do Pantanal.
A partir desse ponto, é fundamental avaliarmos o que precisamos melhorar:
- Os eventos climáticos estão exigindo ampliarmos e aprimorarmos nossa capacidade de mobilização;
- Devemos melhorar nosso tempo de resposta, que não se mostrou eficaz; ⁃Devemos incorporar tecnologias de detecção que assegurem melhor tempo de resposta e identificação do ponto de ignição;
- Devemos aprimorar e ampliar nossa logística de combate aos incêndios no Pantanal, especialmente pensar em uma resposta aérea mais deficiente;
- Este combate e enfrentamento não é de uma instituição. Ele é um desafio que exige inúmeras instituições e atores, com trabalho conjunto.
O debate não deve ser interrompido diante da emergência que vivemos. É importante agirmos com rapidez, usar o conhecimento científico e popular e pensar na aquisição de equipamentos, além de ter pessoas capacitadas.
Um outro ponto importante é entender, de forma ampla, como se dá a responsabilização da origem desses incêndios. Essa busca precisa ser responsável, alcançada com uso da tecnologia disponível. Além disso, entender a fundo como está a ocupação do território, que vem perdendo água e ganhando cada vez mais áreas secas.
Necessariamente, não é uma ocupação para a produção, mas para uso de possíveis ilegalidades, como o tráfico e roubo. Como se vê, exige uma ação ampla. Proteger este importante bioma requer respeito ao passado e aos novos tempos, onde os novos desafios nos impõe a necessidade de convergência de interesses e esforços, pois, representa a única chance real de salvar este lugar!
(*) Coronel Ângelo Rabelo é conservacionista e presidente do Instituto Homem Pantaneiro.
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