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O futuro pós-pandemia será a resultante das nossas atitudes hoje

Demétrio Luis Guadagnin (*) | 21/09/2020 08:58

Como será o futuro pós-pandemia? Que cenários se abrem para os jovens num futuro próximo? Provocado por essas questões, pensando a partir da Ecologia Política, alinhavei algumas provocações. O futuro não está escrito, mas também não está totalmente aberto. Existem incertezas, forças contraditórias em atuação e um condicionamento dado pelo contexto socioambiental global. Pretendo aqui chamar a atenção para alguns aspectos da realidade que considero centrais para construirmos o futuro.

Uma das incertezas é saber quando será o pós-covid ou mesmo se haverá um pós-covid. Vacinas estão em desenvolvimento e podem estar disponíveis em 2021. Embora sejam uma solução promissora, seu potencial para um retorno rápido ao chamado “antigo normal” não está assegurado.

Existe a possibilidade de precisarmos conviver com a doença por mais tempo ou mesmo de necessitarmos rever os modos de vida de forma abrangente, considerando os riscos inerentes à densidade humana, ao nível e à desigualdade do consumo e aos modos de produção modernos.

É neles que se situam as causas últimas desta pandemia e de outras que provavelmente se seguirão. Havendo uma pós-pandemia, especula-se que haverá um efeito rebote na economia e no comportamento humano.

O futuro depende também de um jogo de forças complexo de compreender e manejar. No Brasil, entre outros fatores, por um lado crescem em importância as pós-verdades, a desregulação econômica e social e as iniquidades. Por outro lado, cresce também a reação democrática e cidadã, demandando a reorganização da sociedade, a revalorização da ciência, da educação e do conhecimento e o reconhecimento de que precisamos de algo novo, não de uma reconstrução do passado. Todos esses fatores são humanos, sociais e, portanto, estão ao alcance das decisões.

O contexto socioambiental global é o envelope da pandemia, condicionando, circunscrevendo possibilidades. Esse contexto se caracteriza hoje pela reorganização da geopolítica da produção, do consumo e do poder, uma resposta sistêmica aos limites do crescimento econômico e ao risco iminente de decrescimento e colapso. Limites esses estabelecidos por recursos que se esgotam rapidamente e pela corrosão da estabilidade climática na qual se assenta o modo de vida moderno.

Esse contexto vai impor mudanças radicais que são inevitáveis. O futuro, entretanto, depende das respostas que a sociedade global der, que podem variar desde valores e crenças individualistas a coletivistas a enfoques econômicos centrados na acumulação ou no bem-estar comum.

Uma das possibilidades, advogando aqui uma opção política, é aproveitar a oportunidade para preparar um efeito rebote na direção da solidariedade, da sustentabilidade ambiental e do bem-estar comum. Esse caminho implica, entre outras ações, fazer desde já uma opção pela economia local e solidária, por cidades saudáveis, pelas soberanias alimentar, produtiva e tecnológica, pelo foco em benefícios em vez de consumo e demanda, e toda uma série de outras pautas que já fazem parte de diferentes propostas e narrativas sobre futuros socialmente justos e ecologicamente sustentáveis.

Como será o futuro pós-covid? Será como o quisermos construir, dentro de um razoável espaço de possibilidades. Quanto mais ativo um grupo social for agora, mais ele influenciará o futuro. Poderá parecer bastante familiar no começo, mas mudará radicalmente em alguns poucos anos. No passado, a constância das circunstâncias continha em si segurança, mas também desesperança. Tempos mutantes oferecem ansiedade, mas também esperança. Hora de tomar atitudes.

(*) Demétrio Luis Guadagnin é professor do Departamento de Ecologia da UFRGS.

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