De corpo e alma - Crônica de Ligia Prieto
Querido amor,
Te escrevo porque minha carne é assim mesmo, escancarada.
Faz tempo que você não vem, fico pensando se minha mudança constante de endereço te cansou de me achar. Não sei dizer se tenho saudades, mas às vezes tenho vontades. De contar os detalhes dos meus óbitos diários, e de minhas volúpias imperdoáveis. Sei também que não te vejo com bons olhos desde nossos últimos encontros. Mas sabe, não é possível que a gente não tenha aprendido coisas nesse caminho.
Os dias passam e no mesmo segundo que te quero te afasto. Sei disso. Meu movimento é consciente e não de vitimismo.
No segundo seguinte do querer já desisto, de toda aquela parafernália que você carrega com você. Evito olhar pela janela, evito olhar o horizonte, o céu, a lua, ou qualquer outra coisa que me cause imensidão. Não acredito na segurança porque vivo a beira do abismo. Nessa suspensão que vivo, me manterei um pouco mais, até você chegar com jeito. Veja se não erra a mão dessa próxima vez. Nada de morangos, chocolates, ou promessas malditas, mas se chegar me roubando os segundos, aqueles que me faltam, já será de bom grado. Não é nada pessoal, é que tantas vezes eu disse que não gostava de sonho de valsa e você me trouxe outras tantas me fazendo comer por educação. Tenho desistido de não gostar de amendoim, falei sobre isso esses dias com uma nova amiga. Também não me venha com prestígio, desde que ganhei aquele balde com 50 deles aos 15 anos de idade, diminui um pouco o gosto. Agora chega de te dar meu tempo em vão. Cada minuto de ar que tenho desejo ser, então não me roube o que me falta de qualquer jeito. Se aprume. Tome jeito. Isso de chegar atropelando, se puder evitar, seria bom...
Sei que funciono bem assim, e que me atropela o tempo todo com esse mundo torto que te escapa das mãos dia sim dia não.
Mas se pudermos fazer novos acordos, talvez eu tope.
Atenciosamente, sua amiga distante, por hora.
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