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Cidades

MPF quer “aposentadoria-sanção” a magistrado que liberou Pigmeu do PCC

Subprocurador-geral da República deu parecer pela condenação de Divoncir Schreiner Maran

Por Anahi Zurutuza | 11/05/2024 14:37
Desembargador Divoncir Schreiner Maran assinando termo de posse na Presidência do TJMS, em 2017 (Foto: Campo Grande News/Arquivo)
Desembargador Divoncir Schreiner Maran assinando termo de posse na Presidência do TJMS, em 2017 (Foto: Campo Grande News/Arquivo)

Parecer do MPF (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) no PAD (Processo Administrativo Disciplinar) instaurado contra Divoncir Schreiner Maran pede a condenação do desembargador. Para o subprocurador-geral da República, José Adonis Callou de Araújo Sá, responsável por analisar o caso sob o olhar da acusação, a conduta do magistrado ao conceder habeas corpus para Gerson Palermo, o “Pigmeu” ou “Italiano” do PCC (Primeiro Comando da Capital ), “ultrapassa a mera negligência pontual ou a simples adoção de um procedimento incorreto”.

Agora cabe ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidir se aplica a pena de “aposentadoria-sanção” ao desembargador, que já está aposentado compulsoriamente por idade. No dia 6 de abril de ele completou 75 anos, idade limite para exercer a magistratura.

Na prática, portanto, pouca coisa muda para Divoncir, a não ser o fato que o desembargador terá o episódio anotado formalmente na história da carreira, conforme noticiado pelo site O Jacaré e confirmado pelo Campo Grande News. Decisão do CNJ pela condenação do magistrado também pode complicar a defesa do investigado na esfera criminal.

Conforme o parecer do subprocurador-geral da República, há provas que o desembargador tinha conhecimento da existência do HC antes que o pedido protocolado pela defesa do “chefão do PCC” fosse distribuído para o responsável pelo plantão. Também ficou evidente que Divoncir Maran já havia “julgado” a petição e sem analisar os autos, repassou ordem para que seus assessores redigissem decisão favorável ao narcotraficante.

José Adonis Callou de Araújo Sá durante sessão do Conselho Nacional de Justiça (Foto: CNJ/Divulgação)
José Adonis Callou de Araújo Sá durante sessão do Conselho Nacional de Justiça (Foto: CNJ/Divulgação)

Araújo Sá fez lista das condutas, consideradas no mínimo suspeitas, do desembargador em relação ao caso de Palermo. Veja:

 “A análise do conjunto probatório arrecadado permite concluir que:

  1. era de conhecimento público a designação do requerido para o plantão judiciário do dia 20/4/2020;
  2. antes da distribuição do HC ao desembargador plantonista, o magistrado teve conhecimento da sua interposição e do conteúdo da inicial;
  3. o magistrado, sem minimamente analisar os autos, determinou que a ordem fosse concedida;
  4. o requerido foi alertado por sua assessoria sobre a caracterização da supressão de instância se conhecido e deferido o pedido de concessão de prisão domiciliar, cuja apreciação pelo juízo da VEP encontrava-se pendente; e (v) a decisão do magistrado no HC nº 1404522-80.2020.8.12.0000 foi de encontro ao posicionamento por ele adotado em outro caso analisado no mesmo plantão.”

O procurador ainda traz diálogos entre os assessores de Divoncir Maran demonstrando que a decisão favorável ao homem condena foi dada de maneira questionável do ponto de vista legal, como, por exemplo, o momento que Gabriela Soares Moraes, também alvo de investigação da PF (Polícia Federal) sobre possível venda da sentença, diz que precisou fazer “gambiarra” jurídica para dar provimento ao HC:

Assessora que redigiu decisão alertou sobre "gambiarra" para ser favorável a narcotraficantes (Foto: Reprodução do parecer do MPF)
Assessora que redigiu decisão alertou sobre "gambiarra" para ser favorável a narcotraficantes (Foto: Reprodução do parecer do MPF)

No entendimento do acusador, Maran violou os princípios da imparcialidade e exatidão ao autorizar, durante plantão judiciário, a prisão domiciliar para o narcotraficante com penas que somavam 126 anos de prisão a cumprir.

A conduta do magistrado revelou, ainda, manifesta negligência em seu atuar, bem como inobservância aos princípios da imparcialidade e da prudência, insculpidos nos arts. 1º, 5º, 8º, 24 e 25, todos do Código de Ética da Magistratura Nacional”, afirma Araújo Sá na decisão.

O procurador considerou a conduta “inaceitável” e defendeu que o CNJ aplique “pena máxima” para o desembargador – a aposentadoria compulsória é a punição administrativa mais severa para magistrados. “Na situação sob exame, a gravidade da conduta praticada pelo magistrado, que ultrapassa a mera negligência pontual ou a simples adoção de um procedimento incorreto, não recomenda a aplicação das sanções mais brandas de advertência e censura”.

Suspeita de venda – No CNJ, Divoncir foi investigado pela decisão que concedeu prisão domiciliar ao narcotraficante Gerson Palermo. Com pena de 126 anos de prisão, o condenado acabou fugindo e nunca foi recapturado.

O desembargador também virou alvo da Polícia Federal, que em fevereiro deflagrou as Operação Tiradentes – em referência ao feriado em que o magistrado deu a decisão – em fevereiro deste ano em busca de provas do “comércio” de decisões judiciais.

Em 21 de abril de 2020, ainda no início da pandemia do coronavírus, Palermo foi enquadrado no grupo de risco para a covid e obteve prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico.

No habeas corpus, a defesa alegou que Palermo tinha mais de 60 anos, sofria de diabetes, hipertensão e por isso corria risco de contrair o vírus no cárcere. No dia seguinte, 22 de abril, o desembargador Jonas Hass Silva Júnior, relator do processo, revogou a liminar e restabeleceu a prisão, mas 8 horas após o benefício do regime domiciliar, o “chefão” do tráfico já havia rompido a tornozeleira eletrônica e desaparecido.

Palermo é piloto de avião, acumula passagens pela polícia desde 1991 e é chefe do tráfico de cocaína. O crime mais ousado foi no ano 2000, quando sequestrou um Boeing da Vasp.

Outro lado – O advogado André Borges, que representa o desembargador, garante que o cliente conseguirá provar a inocência. “Divoncir está tranquilo, sabendo que os fatos serão esclarecidos. Inexistiu qualquer crime, como sempre repetido”.

O responsável pela defesa do magistrado diz ainda que “a investigação [da PF] até agora foi confusa e recheada de suposições”. “Mas há tempo para que a verdade apareça”, completou, em conversa com o Campo Grande News no dia 7 deste mês.

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