Abandono e desprezo: estação do Trem do Pantanal “torrou” R$ 739 mil
Setores público e privado protagonizam uma ciranda sem desfecho sobre a responsabilidade pelo imóvel
"Uma estrada é deserta por dois motivos: por abandono ou por desprezo". (Manoel de Barros)
Em Indubrasil, bairro a 15 km do Centro de Campo Grande, não encontramos uma estrada, mas uma estação ferroviária a padecer de abandono e desprezo. A solidão do lugar, cuja reforma há uma década custou R$ 739 mil dos cofres estaduais para dar largada ao Trem do Pantanal, só incomoda quem testemunha, ano a ano, o desaparecimento do próprio trem, dos letreiros da fachada, do forro, dos bancos, das paredes, dos vidros.
Já os setores público e privado protagonizam uma ciranda sem desfecho sobre a responsabilidade pelo imóvel. A Prefeitura de Campo Grande diz que a estação pertence ao governo do Estado. Este, por sua vez, informa que a parte não operacional da ferrovia está sob responsabilidade da Superintendência do Patrimônio da União em Mato Grosso do Sul.
O órgão do governo federal responde que o imóvel é do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes). Numa outra frente, a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) detalha que a estação ferroviária de Indubrasil é um ativo arrendado à Rumo Malha Oeste. A empresa não respondeu ao questionamento do Campo Grande News.
Bem pertinho da estação, a vendedora autônoma Fernanda Ramos Cavalcante não consegue entender como se investiu tanto para, anos depois, deixar o local abandonado. “Dá tristeza olhar tudo acabado”, diz.
Fernanda já morou na estação antiga, ao lado do terminal “novo”, quando seu pai era responsável pelo local. O imóvel mais antigo foi incendiado e nem telhado tem mais.
“Até chorei quando meteram fogo, dá uma saudade. Era um local gostoso para morar, bom demais”, afirma Fernanda.
Para entender a arte de torrar dinheiro, é preciso voltar a 2009. Em 9 de janeiro daquele ano, já na euforia do retorno do Trem do Pantanal, a Agesul (Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos) divulgou o resultado da licitação para reforma e adequação do prédio da estação ferroviária de Indubrasil, ao custo de R$ 739.999,76.
Em 9 de maio de 2009, a estação recebia visitantes para a segunda partida do Trem do Pantanal. Um dia antes, a inauguração em um trecho curto foi feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Já naquele sábado, 9 de maio, o apito soou às 7h45 de sábado, pondo em marcha a primeira viagem com destino de Campo Grande a Miranda.
Logo no começo, as dificuldades se fizeram sentir: a viagem transcorria lenta, a 27 km/h, imposta pelo estado de conservação da malha ferroviária; o calor do meio dia levava os seis ares condicionados à exaustão; e o trem não seguia o roteiro original, que incluía Corumbá, município marcado pela beleza do Pantanal. Mas ali, o clima era de festa, com pessoas às margens da ferrovia para felicitar o tão querido Trem do Pantanal.
Produto destinado a turistas, os preços não eram convidativos. Já em 2012, a estação de Indubrasil seria excluída do percurso, sendo o transporte dos passageiros feito pela rodovia até Aquidauana. Com uma reviravolta, o trecho foi mantido, mas apenas por mais dois anos. O sonho acabou em 2015, quando o Trem do Pantanal saiu, em definitivo, dos trilhos.
Em outubro do ano passado, dois vagões do Trem do Pantanal ficavam de escanteio, em meio ao mato, na estação ferroviária de Aquidauana, a 135 km de Campo Grande.
A agonia presente – Na entrada da estação ferroviária de Indubrasil, somente as palmeiras seguem de pé. No imóvel em ruínas, o vento forte fazia estalar a estrutura metálica. A depredação se divide em vidros estilhaçados, divisórias derrubadas, pichações. O ponto é parada de usuários de drogas.
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