Discussão mostra que plano diretor permite "boom vertical"
Moradores do Chácara Cachoeira pedem revisão de regras e cogitam ir à Justiça contra construções de prédios
Audiência pública na Câmara Municipal da Capital sobre a construção de edifícios no bairro Chácara Cachoeira, nesta sexta-feira (16), reuniu moradores, representantes da prefeitura, dos setores da construção e habitação, além de especialistas na área. Com mais de três horas, a discussão deixou evidente que a legislação permite os empreendimentos em qualquer área da cidade e foi amplamente debatida em anos anteriores. Ainda assim, os moradores pretendem insistir na revisão do plano e estudam levar a questão à Justiça.
Quem construiu há décadas no bairro defende que as torres, cada vez mais comuns em toda a cidade, deveriam ser construídas em outras regiões. Eles alegam desvalorização dos imóveis residenciais por causa da perda de privacidade, sombra nos quintais e aumento do tráfego de veículos.
Ocorre que as transformações no perfil dos bairros são previstas no PDDUA (Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Campo Grande) e alinhadas a legislações nacionais e diretrizes do Ministério das Cidades, que servem para todo o Brasil.
O grupo de aproximadamente 40 moradores não aceita esse movimento, em que os espaços vazios do bairro estão sendo aproveitados para residências verticalizadas, ou seja, os edifícios.
Não somos contra a verticalização, desde que seja feita de forma ordenada, respeitando a função social, em bairros que comportam de maneira sustentável esse crescimento e não impacte na mobilidade e meio ambiente”, argumentou a moradora, servidora pública Isabela Vieira.
No bairro, há também proprietários que concordam com a verticalização e até se aproveitaram da valorização comercial dos imóveis que veio com a instalação de edifícios. O corretor de imóveis Igor Basem morou no Chácara Cachoeira e hoje aluga seus imóveis no bairro.
Os vazios devem ser ocupados por edifícios para dar oportunidade de mais famílias desfrutarem do bairro, que fica perto do shopping e de parques. O perfil do bairro já mudou quando chegaram os condomínios fechados e não vai ser a verticalização que vai prejudicar, pelo contrário, vai trazer qualidade de vida”, defendeu Igor.
Sobre o plano diretor, a diretora-presidente da Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano), Berenice Domingues, destacou que foi discutido em todos os bairros da cidade na última revisão.
“Em 2017, tivemos 74 reuniões, 12 audiências com 683 participantes. Não se faz política pública sem a participação da sociedade. Conclamamos que participem das decisões da nossa cidade”, disse Berenice. O plano teve também 156 emendas de vereadores em 2018.
Representantes dos sindicatos das áreas de habitação e construção questionaram o que seria discutido na audiência, já que o plano diretor foi amplamente debatido e faz parte de políticas nacionais, além do que as construções seguem toda a legislação e fazem estudos de impacto de vizinhança.
Moradores relataram que quando construíram no bairro tinham a certeza de que ele seria sempre residencial sem verticalização, mas o presidente do Secovi-MS (Sindicato da Habitação de Mato Grosso do Sul), Geraldo Barbosa de Paiva, afirmou que isso nunca foi realidade, pois os prédios sempre puderam ser construídos.
“Se algum técnico ou engenheiro prometeu que o bairro não teria prédios, estava mentindo. Sempre foi permitido, o que mudou ao longo dos anos foram as regras de afastamento”, disse Geraldo.
Geraldo também questionou o que levaria a cidade a ter edifícios no Carandá Bosque e no Tiradentes, à exemplo, e não no Chácara Cachoeira. Com isso, ele lembrou que as responsabilidades de garantir a qualidade da mobilidade e infraestrutura é do poder público.
O arquiteto e urbanista Ângelo Arruda, que participou das discussões do zoneamento urbano da Capital, ponderou que há questões que podem e devem ser discutidas, mas o que está previsto com relação à localização dos edifícios atende a legislação nacional.
Podemos discutir aqui, por exemplo, sobre a outorga onerosa, o que é feito com esse valor arrecadado, se ele volta para melhorias no bairro. Essa discussão cabe, mas a melhor condição urbanística hoje é a mistura, que permite o adensamento, renda e emprego”, explicou Ângelo.
Outra questão colocada na audiência foi a segurança jurídica, ou seja, as regras não podem ser abruptamente alteradas se já houve ampla discussão e os investidores da construção se basearam nessas legislações ao escolher onde construir.
Matéria alterada às 15h45 para correção de informações.