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Capital

“Boom vertical” é inevitável e traz benefícios coletivos, avaliam especialistas

Jhefferson Gamarra e Aline dos Santos | 15/06/2023 17:49
Contraste entre moradias horizontais e a expansão de prédios em Campo Grande (Foto: Paulo Francis)
Contraste entre moradias horizontais e a expansão de prédios em Campo Grande (Foto: Paulo Francis)

Em meio ao crescimento acelerado da população e à necessidade de expansão urbana, as construções verticais têm se destacado como soluções para o preenchimento dos vazios urbanos em Campo Grande. A adoção dessa abordagem traz benefícios significativos para o desenvolvimento da cidade, desde a otimização do uso do solo até a criação de novos espaços para habitação coletiva, comércio e lazer.

No entanto, a chegada de edifícios a bairros antes com vocação de moradias horizontais, como Chácara Cachoeira e Rita Vieira, provoca reclamações de parte dos moradores, mas a verticalização de Campo Grande é amparada na Lei de Uso e Ocupação do Solo há 35 anos.

Presidente do Secovi-MS (Sindicato da Habitação de Mato Grosso do Sul), Geraldo Barbosa de Paiva afirma que lei aprovada em 1988 já permitia a construção de prédios na cidade.

“A primeira lei, a 2.567, de dezembro de 1988, determinou que se poderia fazer prédios em Campo Grande, inclusive no Chácara Cachoeira e Rita Vieira. Antes de 1988, as leia antigas sobre uso e ocupação do solo eram muito amadoras. A de 1988 foi a primeira extremamente qualificada, que atendia as necessidades da cidade, com um olhar para o futuro”, diz Geraldo.

Cabe destacar que a chamada verticalização é permitida em todos os bairros. Ou seja, a legislação permite prédios no Centro, nas Moreninhas, no Nova Lima. E a chegada dos edifícios acompanha o crescimento da cidade e, também, busca por moradia com mais segurança.

“Antes, não tinha demanda para prédios, mas os bairros foram ficando nobres, as pessoas querem morar lá. O prédio traz possibilidade de você morar com certa segurança. Você pode deixar sua esposa lá e ir trabalhar na fazenda, tem várias pessoas cuidando dela”, diz o presidente do Secovi.

A lei permite, mas traz as exigências. Quanto mais longe do Centro, maior o tamanho do terreno que vai receber a edificação. A determinação é por conta do espaçamento. No Centro, os edifícios podem ficar “grudados”. Contudo, quanto mais periférico, maior deve ser a distância do prédio de suas laterais. E quanto mais alto for o edifício, maior o recuo.

Noutro ponto, a legislação proíbe, por exemplo, edifícios em rua estreita. “São mecanismos de proteção, tanto da parte urbana quanto a de mobilidade. E estão previstos na Lei de Uso do Solo e do plano diretor. A cidade é composta de ônus e bônus. Você acha que alguém aceitaria ter uma escola, um hospital, um posto de gasolina perto de casa? Mas o interesse individual não pode se sobressair ao coletivo”, afirma Paiva.

Prédio em construção na Rua da Paz, movimentada região de Campo Grande (Foto: Paulo Francis/Arquivo)
Prédio em construção na Rua da Paz, movimentada região de Campo Grande (Foto: Paulo Francis/Arquivo)

Melhoria coletiva – No entendimento do diretor do Sinduscon-MS (Sindicato Intermunicipal da Indústria da Construção de Mato Grosso do Sul), Geraldo Campo Mura, uma das vantagens mais evidentes das construções verticais é a otimização do uso do solo. Tendo em vista que ao construir em altura, é possível aproveitar ao máximo o espaço disponível, aumentando a capacidade de habitação, estabelecimentos comerciais e serviços públicos em uma área limitada. Dessa forma, os vazios urbanos são transformados em empreendimentos multifuncionais, trazendo mais vida e dinamismo para a cidade.

“Quando se leva uma verticalização, a valorização acompanha, é natural. Todo mundo que está em volta recebe uma valorização imensa dos seus terrenos, porque existe uma probabilidade de chegar mais obras no local, e isso é muito bom. Fora isso, nos locais consolidados, chegam mais redes de supermercados, farmácias, postos de gasolina e restaurantes. Ou seja, ou local vai ficar muito melhor”, frisou o diretor.

No entendimento do diretor do sindicato, o olhar individual de uma pequena parcela de moradores não pode sobrepor os benefícios coletivos e de desenvolvimento que um empreendimento de moradia vertical traz. “Temos que olhar o coletivo. É isso que a construção civil e a prefeitura fazem. Quando a gente pega reclamações de uma pessoa dizendo que a verticalização vai atrapalhar o sol que bate na casa dela, essa pessoa tendo um olhar individual ou ela está olhando o coletivo? Porque mais pessoas não podem morar naquele local e proximidade que ela está? Quando verticaliza, estamos oferecendo algo de melhor condição para mais pessoas morarem”, questiona.

Um exemplo disso acontece no Bairro Chácara Cachoeira, onde existem 4.768 imóveis, sendo que 800 são comerciais. No entanto, menos de 20 proprietários de imóveis horizontais aderiram ao movimento contrário à verticalização, essa parcela equivale a menos de 1% da população do bairro.

Além do conflito entre interesses coletivos e individuais, Mura reforça que todos os trâmites para a construção de um condômino leva tempo e inúmeras discussões com o poder público e sociedade, para que tudo seja feito atendendo as normas e legislação vigente.

“O mercado da construção civil trabalha dentro da legalidade, com um amparo jurídico muito grande para entender as leis que são aprovadas. A prefeitura fica muito tempo junto com um grupo de entidades e sindicatos estudando o plano diretor, então depois de um tempo que esse plano diretor é aprovado, a construção civil direciona os estudos para compra de novas áreas. Nada acontece da noite para o dia”, reforçou o representante do sindicato da construção civil.

Reservatório para captação de água de um prédio em construção (Foto: Divulgação)
Reservatório para captação de água de um prédio em construção (Foto: Divulgação)

Verticalização e sustentabilidade – Fora todos os outros benefícios elencados, a construção vertical traz consigo oportunidades para a incorporação de práticas sustentáveis. Com o uso de tecnologias modernas, é possível incorporar soluções de eficiência energética, como sistemas de captação de energia solar e reaproveitamento de água, vistos nas construções mais modernas.

Coordenador do Observatório de Arquitetura e Urbanismo da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) de 2013 a 2017, época da revisão do Plano Diretor de Campo Grande, o arquiteto urbanista Ângelo Arruda, que é um defensor do plano de verticalização, sugere que o tema seja debatido através da ótica do adensamento urbano, que é o fenômeno de concentração populacional.

“A gente tem sempre a mesma discussão quando tentamos desenvolver a cidade a partir da densidade, que avalia quantas pessoas moram por hectare em Campo Grande e a cidade continua vazia como um todo. A densidade é responsável por uma boa eficiência energética, distribuição e captação de águas em seus projetos, redução de desmatamento e centralização de serviços públicos”, explica o arquiteto.

No entendimento de adensamento, juntar a população em uma área compacta, podendo abrigar muitas famílias, pode-se diminuir consideravelmente os gastos da população e do poder público com transportes e deslocamentos, tanto pessoais quanto de bens e serviços, uma vez que, em tese, as pessoas, comércios e serviços estarão todos muito mais próximos geograficamente do que se a cidade não tivesse se adensado.

“Um prédio em um terreno de 40x60, com 25 andares e 4 apartamentos por andares, colocamos 100 famílias. Se essas 100 famílias fossem morar em 100 casas, precisariam de 100 lotes, ocupando 3 quadras em um área quase 10 vezes maior. Com isso, o desmatamento seria maior, a pavimentação seria maior em nome da habitação unifamiliar”, exemplificou Ângelo  Arruda.

Portanto, as reclamações de projetos de verticalização que respeitem o plano diretor de Campo Grande são consideradas “pontuais” de uma parcela da população que teria algum empecilho individual com a chegada de grandes empreendimentos, que não devem sobrepor os benefícios coletivos e sustentáveis.

“Verticalizar não faz mal, muito pelo contrário, verticalizar faz bem, desde que você controle a verticalização a partir do adensamento. Dizer que a verticalização traz prejuízos, esses prejuízos seriam individuais de alguém que vai ter que sofrer com barulho obras durante um tempo. A cidade é um jogo dinâmico de muitas atividades que concorrem no dia a dia e Campo Grande está batendo 1 milhão de habitantes e agora está passando por tudo que uma cidade desse porte passa”, finalizou o arquiteto.

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