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Capital

Execução de policias em MS podem ser “caso nacional” para alterar lei

A Lei de Abuso de Autoridade passou a valer em setembro de 2019, mas não é bem vista no meio policial

Izabela Sanchez | 10/06/2020 11:27
Os policiais Antonio Ramires e Jorge Silva dos Santos, assassinados por homem sem algemas dentro de uma viatura em Campo Grande (Foto: Divulgação)
Os policiais Antonio Ramires e Jorge Silva dos Santos, assassinados por homem sem algemas dentro de uma viatura em Campo Grande (Foto: Divulgação)

Legislação Federal vigente desde o ano passado, a chamada Lei de Abuso de Autoridade (Lei Nº 13.869) é um projeto construído com autoria que vai do Senado ao MPF (Ministério Público Federal) e teve a polêmica renovada desde terça-feira (9), quando dois policiais civis foram assassinados em Campo Grande, dentro de uma viatura, por homem sem algemas, que levavam para ser ouvido em meio à investigação da Derf (Delegacia Especializada de Roubos e Furtos).

Agora, o caso pode ganhar repercussão nacional porque será levado ao Congresso como justificativa para rever a disciplina do uso de algemas em casos como esse. A lei foi apontada como “culpada”  no caso, citada pelo delegado geral da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul, Marcelo Vargas.

A lei surgiu no esteio da operação Lava Jato para disciplinar o que foi visto como arbitrário em uma série de ações da investigação. O objetivo foi regulamentar como crime práticas abusivas de autoridades, desde servidores, caso dos policiais, até parlamentares.

Em 2016 o senador Renan Calheiros (MDB) tirou o projeto da gaveta, e, depois o texto ganhou apoio e contribuições de outros parlamentares de oposição, como o senador Randolfe Rodrigues (Rede), um dos autores.

Até ser sancionado em 2019, também ganhou pitacos dos procuradores federais do MPF, responsáveis pela “iniciativa popular” chamada “10 medidas contra a corrupção”. O presidente Jair Bolsonaro (PSL) vetou mais de 30 artigos, a Câmara derrubou 18 vetos do presidente e por fim a Lei foi aprovada. Desde o início ela não repercute bem no meio policial.

Policiais chorando no velório de Jorge, conhecido como "Jorginho" (Foto: Henrique Kawaminami)
Policiais chorando no velório de Jorge, conhecido como "Jorginho" (Foto: Henrique Kawaminami)

Não há menção clara ao uso de algemas na condução de investigados, mas há uma série de dispositivos para coibir a violência ou constrangimento de presos e conduzidos.

Deputado federal por Mato Grosso do Sul, Fábio Trad (PSD) disse ao Campo Grande News que já conversou com delegados e pretende levar o caso às comissões parlamentares da Câmara. Ele citou como exemplo a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Ainda assim, fez uma ressalva. Primeiro, disse, as investigações precisam esclarecer porque o autor dos crimes não estava algemado e porque os dois transportados na viatura não foram revistados.

“A lei diz que pode algemar desde que ofereça risco. Eu conversei com um delegado que trabalha na secretaria [Sejusp] e prometi levar o caso para a Comissão de Segurança Pública e Comissão de Justiça para, de acordo com as investigações do fato, à luz desse fato, rediscutir a matéria ou imprimir o maior controle na disciplina do uso de algemas”, comentou.

Conforme o deputado, “antes de despertar a discussão”, “é importante saber os detalhes desse caso” e “do uso das algemas”.  “Com certeza as comissões vão querer saber em que circunstância os fatos ocorreram”, disse.

Questionado sobre a possibilidade de que a discussão seja priorizada em meio às demandas da pandemia de covid-19, Fábio Trad disse achar “que tem possibilidade, mas é preciso que as investigações sejam encerradas para que a comissão possa se debruçar nesse assunto”.

“Nós temos que investigar à luz dos fatos apurados se houve ou não alguma falha da lei, pode ter, mas isso vai depender das investigações e vamos nos debruçar sobre isso”, disse.

Presidente da OAB (Ordem dos Advogados) em Mato Grosso do Sul, Mansour Elias Karmouche acredita que ocorreu falta de protocolo na condução de Ozeias Silveira de Moraes, de 45 anos, que matou os policiais e depois foi morto em confronto com a polícia na madrugada desta quarta-feira (10), e William Dias Duarte Cormelato, capturado horas depois. A OAB divulgou nota de pesar pelo assassinato dos investigadores.

“Pode ter sido a falta de protocolo, um deles foi visto correndo com algema na frente. Quem avalia a periculosidade do suspeito é o policial na abordagem. Não revistou para ver se estava armado, não pode jogar em cima da lei”, comentou Karmouche.

Cena incomum no Intanhangá, região nobre da cidade (Foto: Divulgação)
Cena incomum no Intanhangá, região nobre da cidade (Foto: Divulgação)

Entenda - Segundo Marcelo Vargas, a Derf investigava um roubo de joias na Rua Euclides da Cunha e chegou até William Dias Duarte Cormelato. Como ele já tinha mandado de prisão por violência doméstica em aberto, foi algemado para ir à delegacia prestar esclarecimentos. Ozeias foi levado na condição de “testemunha”, mas sem mandado de prisão, acabou transportado apenas para averiguações. O que os policiais não sabiam é que ele entrou armado na viatura com revólver calibre 38.

Os dois homens eram transportados em veículo Fiat Mobi usado como viatura descaracterizada, quando tudo aconteceu. Os policiais foram mortos com tiro na nuca. William testemunhou toda a situação e tentou fugir, mas foi recapturado, minutos depois, na mesma região. A Derf é uma das poucas delegacias que tem carceragem grande e por isso recebe muitos presos.

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