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Capital

Odilon diz que lei é falha ao igualar ladrão de bicicleta a contrabandista

Fabiano Arruda | 03/08/2011 12:59

Para magistrado, a própria legislação faz apologia ao crime. "O Brasil tem duas justiças: uma para o rico e outra para o pobre”, diz.

Magistrado abriu nesta quarta ciclo de Congressos de Direito. (Foto: Wagner Guimarães)
Magistrado abriu nesta quarta ciclo de Congressos de Direito. (Foto: Wagner Guimarães)

Durante palestra proferida nesta quarta-feira, na abertura do Ciclo de Congressos de Direito, realizado no Centro de Convenções Rubens Gil de Camilo, em Campo Grande, o juiz federal, Odilon de Oliveira, fez duras críticas ao direito penal brasileiro. O tom do discurso do magistrado foi único do início ao fim: a legislação beneficia os “macrocriminosos” e é severa aos que cometem infrações menos “nocivas” à sociedade.

“O sujeito que furta uma bicicleta tem pena igual ao que traz um caminhão contrabandeado com mil computadores do Paraguai. Quem manda R$ 10 mil para o exterior tem a mesma pena de quem manda R$ 10 bilhões. A própria lei penal faz apologia ao crime”, criticou.

O magistrado afirmou ser necessário que a legislação puna de forma mais severa os crimes que afetem o interesse coletivo ao invés dos que prejudicam o interesse individual. “Cadê o Estado, que é o gestor máximo do direito penal”, indagou.

Com uma plateia repleta de acadêmicos de Direito, além de autoridades de Segurança Pública, Odilon deu inúmeros exemplos e, num deles, comparou a pessoa que furta um televisão, com pena de reclusão de 2 a 8 anos, ao condenado por crime de sonegação, que pode pegar de 2 a 5 anos.

“Esta desproporção dificulta o combate ao crime organizado. O Brasil tem duas justiças: uma para o rico e outra para o pobre”, disse.

Barreiras* - Sobre o tema de sua palestra, “Barreiras no Combate à Criminalidade”, Odilon listou diversos tópicos e os definiu como barreiras legislativas e internacionais. Ele classificou a legislação hipócrita e definiu o papel do Estado, no que diz respeito às leis, de cínico.

“O traficante que for réu primário e não compor organização criminosa pode ter redução de pena de 2/3. Com isto, poderá cumprir até pena alternativa. Qualquer traficante que for réu primário e não compor organização pode ir ao Paraguai trazer cocaína”, disparou o magistrado.

Ele também listou empecilhos no trabalho de investigação. Entre eles, comentou deficiências nos mecanismos de deleção premiada, infiltração de agentes e vigilância eletrônica.

No caso da delação, o juiz condenou que falta proteção. “Ninguém quer falar para morrer. Às vezes me perguntam se haverá proteção, eu respondo que isto não está garantida nem para mim. O programa de proteção de testemunhas, então, é feita de maneira porca no País”.

Em relação à infiltração de agentes, defendeu a importância do mecanismo, mas criticou que não existem normas que legalizem o que é permitido ao policial infiltrado praticar. “O policial infiltrado numa quadrilha não vai ser correto. Ele poderá utilizar documentos falsos? Que tipo de crimes ele pode cometer? (enquanto estiver sob disfarce)”, reclamou.

E sobre a vigilância eletrônica, como quebra de sigilo telefônico, principalmente, Odilon considerou o processo ainda burocrático na contramão da criminalidade atuar de forma dinâmica. “Não é possível ter apenas 30 dias de quebra de sigilo se para desmantelar uma quadrilha leva até cinco anos”, queixou-se.

Outro ponto abordado na palestra foi a atuação do STF (Supremo Tribunal Federal). Ele considerou a Corte máxima do País permissiva à criminalidade de elite e que tudo acaba virando papel. “Os 11 ministros do supremo atuam somente com papel”, afirmou, acrescentando que o peso das decisões cai em que “está na linha de frente”.

Para o magistrado, a legislação penal também deve atuar na criação de crimes de obstrução de justiça. Como exemplo, exibiu um vídeo em que um condenado, em São Paulo, fala em tom de ameaça diante de um juiz. “E a pena para quem ameaça um bêbado é a mesma para quem ameaça um juiz. Isto não é privilégio. Será que as famílias desses juízes estão seguras lá fora?”, pontuou.

Odilon também discorreu sobre as fronteiras como agravante na atuação contra a criminalidade, abordou a falta de estrutura para as polícias no País, criticou a omissão do legislativo para corrigir deficiências do código penal, além de dizer que a justiça ideal é terapêutica. “É preciso recuperar o preso. Esta é a justiça dos tempos modernos”.

O ciclo de Congressos de Direito segue até sexta-feira no Centro de Convenções. Às 16 horas de hoje haverá palestra com o juiz Carlos Alberto Garcete e, às 18h, com o promotor Paulo Passos. O deputado federal e delegado de Polícia Federal, Protógenes Queiroz, além do desembargador federal Fausto de Sanctis são participações confirmadas no evento.

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