Prefeitura cadastra moradores de favela e destrói barracos desocupados
Ação ocorre na manhã de hoje na Comunidade do Mandela, na região Norte de Campo Grande
Emha (Agência Municipal de Habitação), Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano), com apoio da Guarda Municipal, estão na manhã desta quinta-feira (31) na favela conhecida como "Comunidade do Mandela", na região Norte de Campo Grande.
Em resposta a pedido de levantamento, feito pelo Ministério Público Estadual, a prefeitura faz o cadastramento de famílias que vivem em situação irregular, morando em barracos, com ligações clandestinas de energia.
A ordem é verificar quem realmente mora na ocupação e derrubar os barracos vazios, de pessoas consideradas "oportunistas", que se instalam no local apenas para conseguir casas populares da Emha.
As equipes entram em todas as moradias e avaliam a situação, levando em conta a estrutura montada. "As pessoas que realmente vivem aqui tem, pelo menos um fogão, uma geladeira. O restante só coloca o barraco para tentar ganhar uma casa da prefeitura", justifica Eneas José de Carvalho Netto, diretor presidente da Emha.
Nas contas dele, apenas 30% das pessoas instaladas realmente precisam ser atendidas pela prefeitura. "Tem os oportunistas que já conseguiriam casas e voltaram. Vejo rostos conhecidos aqui", reclama.
Segundo Eneas, muitos são remanescentes da Favela Portelinha, que ficava na mesma região. Cerca de 300 famílias foram transferidas para residencial construído pelo município e logo outra favela surgiu.
Para o diretor da Emha, ao cadastrar pessoas em ocupações, para beneficiar em futuros projetos habitacionais, o poder público incentiva novas invasões. Mas ele justifica que é obrigado a atender o Ministério Público. “Sou contra o que estamos fazendo aqui, porque a Emha tem mais de 42 mil pessoas na fila a espera de casa, que pagam água luz e vivem de aluguel. Isso vai totalmente contra a política habitacional. Mas isso é para prestar contas ao Ministério Público”.
Em julho, operação da Energisa acabou com 250 ligações clandestinas no Mandela. A ação acabou revoltando moradores que chegaram a bloquear a rodovia que dá acesso à região. Por isso o Ministério Público solicitou àprefeitura investigação sobre a realidade no local.
Moradores que estão nesta manhã no local são cadastrados. Já os pontos desocupados acabam no chão. Eletricistas cortam os cabos de ligação irregular com a rede elétrica, para os servidores da Semadur demolirem os barracos vazios.
Pela manhã, pelo menos 10 devem ser derrubados. As moradias ocupadas recebem um número e as famílias respondem quanto tempo moram ali, de onde vieram, qual a renda, e apresentam documentos pessoais.
A Comunidade do Mandela foi criada em 7 outubro de 2016. "Hoje, são cerca de 130 famílias, todos têm cadastro na Emha", garante Greiciele Argilar Ferreira, de 25 anos. A moradora, que se apresenta como líder comunitária, há 3 anos vive no local com 3 filhos de 2, 6 e 10 anos, e renda de R$ 130,00, referentes ao Bolsa Família. De Sinope (MT), ela diz que entre os vizinhos tem gente de Corumbá, Sidrolândia e até da Bahia. “A maioria não tem casa, está aqui porque precisa. Meu sonho é ter um lugar com luz e água”, comenta.
Na favela, a situação é evidentemente precária. Além de gambiarras para todo o lado, a maioria cobre as paredes com cobertores, para não entrar vento na estrutura capenga de madeira. Mas algum investem na construção com tabuas e até sobrado improvisado surgiu no Mandela, com mercearia. O dono diz que chega a "tirar até R$ 1.500 por mês no comércio", com a venda de produtos diversos, inclusive, shampoo.
Quando as equipes chegaram hoje, junto à Guarda Municipal, a primeira reação foi de medo. Mas depois das explicações, a ação virou esperança.
Diarista, Mariana Mendes de Sá veio de Sidrolândia e no ano passado diz que fez cadastro na Emha. “Toda a vez que vemos movimentação assim, a gente pensa que vai ser despejado. Mas agora estou muito feliz porque o cadastro é o primeiro passo. Agora a prefeitura vai saber quem mesmo vive aqui".
Kellen Costa, de 19 anos, mora com filhos de 2 e 5 anos. Já está no segundo endereço desde que se mudou para o Mandela. “Quando era casada, morava na casa da minha sogra. Mas meu marido bebia demais e me separei. Comprei barraco aqui por R$ 800,00, com 3 peças. Hoje vivo com pensão de R$ 200,00. O meu primeiro barraco, ia doar para o meu irmão, mas demoliram”, conta.