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Capital

Sem fim, guerra jurídica entre médicos e enfermeiros preocupa Sesau

Audiência nesta tarde discute liminar que restringe atuação dos enfermeiros após pedido do Conselho Federal de Medicina

Izabela Sanchez | 17/10/2017 15:01
Sem fim, guerra jurídica entre médicos e enfermeiros preocupa Sesau

De um lado, os enfermeiros, com argumentos como a lei 7.498, de 1986. Do outro, os médicos, com normativas como a Lei 12.842, de 2013. No centro da discussão, revalidar receitas médicas e requisitar consultas e exames. A 'batalha jurídica' entre o Confen (Conselho Federal de Enfermagem) e o CFM (Conselho Federal de Medicina) tenta chegar a um consenso sobre o que as duas atuações profissionais podem, ou não, fazer, durante atendimento do SUS (Sistema Único de Saúde). 

Decisão do juiz da 20ª Vara da Justiça Federal de Brasília, Renato Borelli, concedeu liminar ao pedido do CFM (Conselho Federal de Medicina) e proibiu os enfermeiros de realizarem as referidas atuações na saúde pública. O assunto, que ainda não chegou à reta final, já começa a preocupar a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde).

A pasta expediu nota técnica, distribuída para as unidades de saúde, com orientações sobre o atendimento "prevendo alteração de fluxo a fim de não incorrer em prejuízos no atendimento à população". O documento foi elaborado após reunião entre o titular da Sesau, Marcelo Vilela, a secretária- adjunta Andressa De Lucca Bento, coordenadores e superintendes da Secretaria.

Isso porque as mudanças devem alterar o atendimento do Programa da Saúde da Família, à exemplo das UBSFs (Unidades Básicas de Saúde da Família). Conforme a Sesau, enquanto há 963 médicos inscritos no quadro municipal, 410 enfermeiros atuam na saúde da Capital, e apenas 186 nas unidades básicas de saúde.

Batalha jurídica

O Cofen (Conselho Federal de Enfermagem) recorreu da decisão e defende que as ações dos enfermeiros na atenção básica já são descritas pela legislação, e alega que as atividades que geram conflito judicial são realizadas há mais de 20 anos na atenção básica.

O Coren-MS (Conselho Regional de Enfermagem de Mato Grosso do Sul) defendeu a posição, por meio de nota pública, e cita normativas como a resolução - nº. 195 de 1997 - do Cofen, e a lei 7.498/86, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem.

É o que defende o docente do curso de enfermagem da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Sebastião Henrique Duarte.

"É uma série de equívocos porque o conselho suspendeu uma portaria que já foi revogada, teoricamente. Essa lei [que regulamentou a profissão, de 1987] ela já habilita o enfermeiro a fazer mais ações e muitas constam em protocolos, protocolos que os médicos ajudaram a construir. O Ministério da Saúde estabeleceu a equipe multiprofissional", comentou.

Já o CRM-MS (Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul) afirma que as atividades são vetadas por artigos da Lei 12.842 (Lei do Ato Médico), de 2013, que dispõe sobre o exercício da Medicina.

Presidente do Conselho, Celso Rafael Gonçalves Codorniz, afirma que o diagnóstico clínico e o tratamento são atribuições exclusivas dos médicos. "Em 2013, foi aprovado uma lei, lei do ato médico, uma lei que determina o que o médico pode fazer. Por essa lei, o diagnóstico clínico e o tratamento são exclusivos do médico", explica.

Para além das discordâncias na interpretação e aplicação da lei, no entanto, está a cultura. Os profissionais de enfermagem afirmam que as mudanças no entendimento do SUS, tentam, gradativamente, incluir os profissionais da enfermagem em atuações que já eram atribuições regulamentadas.

"Na verdade, a atividade é socialmente desconhecida. O enfermeiros fazem parte de todo o ciclo, fazem controle de crescimento de desenvolvimento, atuam na prevenção pré-natal, fazem parto. Da década de 1990 pra cá o país mudou o perfil epidemiológico, a mortalidade infantil que era muito alta teve um declínio, por conta dessa participação em casa", explica, sobre a saúde da família.

"Isso livrou muita criança de morrer por diarreia, os enfermeiros assumiram, evitaram muitas mortes de mulheres, a participação ajudou. E tem um detalhe, ele trabalha na equipe multiprofissional, mas na competência de enfermagem", esclarece.

Já o médico e representante do CRM-MS defende que a formação médica, durante a graduação, é a única que habilita os profissionais a assumirem atividades como a revalidação de exames, consultas e receitas. "Porque somos nós que fazemos 6 anos de faculdade, em período integral, e somos nós que temos as condições para entender o funcionar dos órgãos, doenças, prescrever o tratamento e assumir responsabilidade", comentou.

"Eu acho que médico e enfermeiro têm que trabalhar lado a lado, mas cada um tem que trabalhar na área que é capaz, ele não pode sair fora da área dele, onde ele não tem preparo", complementou.

E a saúde municipal

A assessoria de imprensa da Sesau divulgou posicionamento e afirma que a decisão em carácter liminar "causa preocupação, haja vista que há décadas os enfermeiros realizam procedimentos, dentro da sua consulta de enfermagem, tanto de solicitação de exames baseados em protocolos".

Nesta tarde (17), uma audiência pública discute o assunto na Câmara Municipal. A discussão foi solicitada pelos integrantes da Comissão Permanente de Saúde, composta pelos vereadores Loester Nunes de Oliveira (PMDB), presidente, Antônio Cruz (PSDB), vice-presidente, Cida Amaral (PODEMOS), Hederson Fritz Morais da Silveira (PSD) e Lívio Viana de Oliveira Leite (PSDB).

O secretário municipal de saúde explicou à reportagem que a discussão deve oferecer mais direção ao assunto. "A gente deu uma liberdade para a equipe tomar uma decisão num bom senso, tem muito médico que não quer, mas tem que entrar em um consenso", explicou.

"Eles [enfermeiros] não fazem atendimento, o que eles fazem é colher o preventivo, fazer um eletrocardiograma. A interpretação é do médico, em alguns casos eles podem fazer uma prescrição de analgésicos", comentou.

Questionada sobre o impacto, a Sesau afirmou, por meio da assessoria de imprensa, que "estão inscritos 963 médicos no quadro municipal", "sendo que 692 realizam plantões com frequência".

"Quando proibirem esse enfermeiro, lógico que vai ter impacto, porque não tem médico suficiente e os plantões muitos médicos não querem fazer", declarou o secretário.

Emenda 95- Em meio à tudo, no entanto, o Congresso aprovou parte do pacote de medidas econômicas do governo federal, entre elas a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 55. Sancionada, culminou na Emenda Constitucional 95, que estabelece um teto de gastos de 20 anos para quase todas as áreas sob responsabilidade do Estado.

A LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) 2018, enviada pelo governo Temer ao Congresso, ainda não foi aprovada. Pela regra atual, no entanto, as despesas mínimas com saúde e educação são equivalentes a seu piso em 2017, corrigido pela inflação acumulada em 12 meses até junho.
Um estudo divulgado pelo Conselho Nacional de Saúde discutiu os efeitos da PEC na Saúde.

Elaborado pela Assessora Política do INESC (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e Diretora do CEBES (Centro Brasileiro de Estudos em Saúde), Grazielle David, o estudo demonstrou preocupação.

"Em 2017, o valor aplicado em saúde será maior do que o valor anteriormente previsto de forma escalonada pela PEC 86/2015. Porém, como a RCL [Receita Corrente Líquida] em 2017 ainda estará baixa, o congelamento da PEC 55 será feito sobre um dos valores mais baixos aplicados em saúde nos últimos anos", afirma.

"Em si, isso já representa imensa perda para a saúde. Além disso, a saúde sofre de subfinanciamento crônico, o que resulta em estrutura inferior às necessidades da sociedade brasileira. Congelar por 20 Anos os gastos, implicará em nunca sair dessa situação", argumenta.

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