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Interior

Mães de crianças que ficavam com “Tia Carol” estranharam fome, sede e sono

Dona de creche clandestina em Naviraí foi presa por agredir e dopar crianças

Anahi Zurutuza | 12/07/2023 19:47
Local onde crianças ficavam sob os cuidados de Caroline Rech e uma funcionária (Foto: Direto das Ruas)
Local onde crianças ficavam sob os cuidados de Caroline Rech e uma funcionária (Foto: Direto das Ruas)

Mães de bebês e crianças, que ficavam sob os cuidados de Caroline Florenciano dos Reis Rech, de 30 anos, e uma funcionária em creche clandestina fechada em Naviraí, relataram à Polícia Civil estranhar que os filhos chegavam em casa com muita fome e sede. Além disso, sonolentos. Elas não desconfiavam, contudo, que os meninos e meninas apanhavam e eram dopados no “Cantinho da Tia da Carol”.

A técnica de enfermagem de 26 anos, mãe da bebê de 11 meses que delegados e investigadores viram ser agredida através de câmeras escondidas autorizadas pela Justiça, contou que a criança frequenta a creche há quatro meses e sempre notou que a filha chegava esfomeada em casa e dormia por muita horas. A garotinha jantava por volta das 17h30 e já queria dormir. Não tinha nenhum despertar durante a noite e madrugada, além de ter dificuldade para acordar de manhã.

A mãe não associou, porém, a situação ao uso de medicamentos. Relatou ainda que já enviou remédios para gripe, tosse e gases, mas nunca autorizou ministrar a medicação para enjoo que fazia a criança dormir, como o Dramavit, que foi encontrado no local.

A profissional da saúde relatou que, certa vez, a filha chegou arranhada em casa e Caroline disse que a bebê poderia ter batido em algum local, porque ficava engatinhando pela creche, cena completamente diferente da testemunhada pela equipe policial.

Mais depoimentos - Em poucos dias, mãe de menino de 2 anos, “matriculado” na creche no dia 3 de julho, percebeu que havia algo errado. Ela o deixava às 6h40 no local e pegava às 11h30. Notou que no dia 5, quarta-feira passada, depois de dar almoço para o garotinho em casa, ele dormiu a tarde toda. Às 18h30, acordou irritado, tomou mamadeira e dormiu novamente, até o outro dia.

"Cantinho da Tia Carol" funcionava em sala comercial no Bairro Sol Nascente, em Naviraí (Foto: Julio Fernando/TV Mais MS)
"Cantinho da Tia Carol" funcionava em sala comercial no Bairro Sol Nascente, em Naviraí (Foto: Julio Fernando/TV Mais MS)

No dia seguinte, o bebê chorou muito ao ser deixado com “Tia Carol” e então, a mãe, de 34 anos, decidiu enviar o filho de 5 anos junto para “vigiar” o irmão. O menino mais velho delatou a cuidadora. Disse que ela havia brigado muito com o bebê. Por isso, ela não levou mais os meninos à creche.

Três mulheres contaram à polícia sobre os episódios que aconteciam quando alguma criança fazia xixi na roupa. Caroline obrigava os colegas a fazer roda e chamar quem havia tido o escape de “mijão”.

Mulher de 38 anos, mãe de menino de 5, que passava as manhãs na creche, também estranhou a sonolência do filho e afirmou que “Tia Carol” ligou para ela pelo menos três vezes informando que o garoto estava dormindo e se ele poderia faltar à aula, já que era a cuidadora a responsável por levá-lo para a escola.

O menino, que frequentou o local por seis meses, já havia dito para a mãe que Caroline era “má e brava”, “batia e puxava a orelha” e que, certa vez, a babá havia dito que o cabelo dele era “ruim”. A mulher ficou desempregada e decidiu tirar o filho da creche.

Recepcionista de 34 anos, mãe de menininha de 7 anos, contou à polícia que a filha presenciou várias situações de violência. A filha disse que com ela ficava tudo bem, mas que “Tia Carol e Mari batem nos bebês”. A garota contou ainda que a dona da creche dizia para as crianças ficarem quietas e obedecerem ou ficariam “ajoelhadas no milho até sangrar”.

A pequena relatou ainda ter visto a funcionária da “escolinha” dar tapa na boca de bebê que se recusava a comer, mas que Caroline era quem “batia mais vezes”.

Remédio – Por fim, funcionária de farmácia, de 34 anos, revelou que já havia fornecido Dramim, medicamento semelhante ao Dramavit, apreendido no local e, segundo a investigação, era usado para dopar crianças. Ela é mãe de uma bebê, de 1 ano e meio, que ficava com a “Tia Carol”, e afirma que nunca imaginou que o remédio era dado aos meninos e meninas. Caroline afirmou para a mãe que sofria de labirintite e por isso tomava muito o medicamento.

Delegada Sayara Baetz (sentada à frente), delegado Gustavo Ferrari e equipe de policiais de Naviraí que prenderam mulheres por tortura em creche (Foto: PCMS/Divulgação)
Delegada Sayara Baetz (sentada à frente), delegado Gustavo Ferrari e equipe de policiais de Naviraí que prenderam mulheres por tortura em creche (Foto: PCMS/Divulgação)

A prisão – Investigando denúncia de maus-tratos na creche, delegados e investigadores de Naviraí viram e ouviram, ao vivo, a bebê de 11 meses sofrendo agressões físicas e psicológicas na segunda-feira, dia 10, quando começaram monitoramento à distância usando equipamentos de filmagem escondidos instalados no estabelecimento com autorização judicial. Além disso, assistiram à menina ser dopada.

Diante da violência e risco que crianças corriam nas mãos de Caroline, a equipe da Polícia Civil decidiu invadir a creche e prendeu as duas adultas que estavam no local.

De acordo com o registro policial, “logo no início da operação, às 10h35, a investigada Caroline agrediu fisicamente uma bebê, posteriormente identificada como menina* de 11 meses”. Segundo a descrição, pelo monitoramento em tempo real, foi possível ver que a criança estava em um colchão no chão, sozinha, e havia saído do local, momento que a cuidadora pega a pequena e joga de volta no acolchoado.

“Foi perceptível a violência empregada por Caroline, bem como a intenção de castigar a pequena criança em virtude do choro”, anotou a delegada Sayara Baetz, que redigiu o documento.

Treze minutos depois, a garotinha voltou a chorar e, então, apanhou. Como o equipamento instalado no “Cantinho da Tia Carol” captava imagem e áudio, conforme registrado, a investigada xingou a criança de “sem vergonha” e comentou com a funcionária que quando a menina começasse a andar, “estavam lascadas”.

A bebê continuou chorando sozinha, mas logo parou. Neste momento, equipe da DAM foi enviada para ficar de prontidão próximo à creche caso fosse necessária intervenção rápida.

Os policiais que permaneceram na delegacia perceberam que as imagens não estavam sendo gravadas e diante da necessidade da coleta de provas, técnicos foram chamados para resolver a questão.

Quem assistia à câmera começou a estranhar que a menininha estava há muito tempo parada, não tentava se levantar do colchão, engatinhar ou se arrastar, parecendo estar dopada. Às 12h45, a funcionária de Caroline foi vista dando remédio para a neném, que logo dormiu.

A equipe do monitoramento notou ainda que as duas mulheres ficavam o tempo todo sentadas, mexendo no celular, sem olhar para as outras crianças no ambiente. Mesmo constatando que boa parte das cenas não haviam sido gravadas, policiais decidiram invadir o local e prender a dupla.

Caroline Florenciano dos Reis Rech, de 30 anos, está presa e é investigada por torturar crianças (Foto: Reprodução das redes sociais)
Caroline Florenciano dos Reis Rech, de 30 anos, está presa e é investigada por torturar crianças (Foto: Reprodução das redes sociais)

Prisão preventiva – “Tia Carol” é registrada na polícia como profissional do sexo e tem extensa ficha criminal. No fim da tarde de terça-feira (11), o juiz Paulo Roberto Cavassa de Almeida decidiu manter a dona da creche presa para a “garantia da ordem pública, dada a gravidade concreta dos fatos, consubstanciada pela violência contra crianças”.

A funcionária Mariana de Araújo Correia, 26, pagou fiança de R$ 1.320,00 (um salário mínimo) e deixou a delegacia, mas o juiz registrou que poderá “reexaminar” a ideia de permitir que ela responda a inquérito e processo em liberdade.

O advogado da dona da “escolinha”, Mauro José Gutierre, enviou texto assinado pela cliente à reportagem que diz: “os fatos não deram da forma como estão sendo divulgados e propagados nas redes sociais”. Veja a nota na íntegra:

Campo Grande News - Conteúdo de Verdade

A reportagem não conseguiu contato com Mariana. Ela não tem advogado. O espaço segue aberto para futuras manifestações.

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