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Interior

Sonho de atirador da PF, loja de armas mudou de dono e virou alvo da polícia

Federal Armas, em Dourados, é investigada por suspeita de venda ilegal de fuzis até para traficante

Helio de Freitas, de Dourados | 27/07/2023 13:05
Policiais em frente à Federal Armas durante buscas e apreensão de fuzis, terça-feira (Foto: Adilson Domingos)
Policiais em frente à Federal Armas durante buscas e apreensão de fuzis, terça-feira (Foto: Adilson Domingos)

A Federal Armas Comércio Varejista de Artigos de Caça, Pesca e Camping, e também clube de treinamento de tiro, não tem esse nome por acaso. Localizada em Dourados (a 251 km de Campo Grande), a loja foi idealizada pelo agente da Polícia Federal Marcelo Neves Camera e fundada por ele e dois empresários da cidade em 14 de agosto de 2020.

Os primeiros donos da empresa foram Marcelo e os empresários, que investiram dinheiro no negócio. “Sonhava em ter, após me aposentar, uma empresa no ramo que atuei em toda minha vida profissional”, disse Marcelo Neves ao Campo Grande News.

Na terça-feira (25), a Federal Armas foi alvo de mandados de busca e apreensão no âmbito de investigação conduzida pelo Dracco (Departamento de Repressão a Corrupção e ao Crime Organizado), da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul.

Ao todo, 33 armas foram apreendidas – 28 fuzis calibre 5,56, uma submetralhadora 9 milímetros, duas pistolas do mesmo calibre, uma espingarda calibre 357 e uma espingarda calibre 12 e diversos carregadores. O arsenal vale pelo menos R$ 800 mil. Os fuzis foram importados dos Estados Unidos.

Com as atividades oficialmente suspensas desde o início do ano por determinação do Exército Brasileiro após suspeitas de irregularidades na comercialização de armamento de uso restrito, a Federal Armas é investigada por vender fuzis mesmo após liminar do STF (Supremo Tribunal Federal) proibir o comércio desse tipo de armamento, em 5 de setembro de 2022.

Um desses fuzis calibre 5,56, duas pistolas 9 milímetros e um revólver calibre 357 foram parar nas mãos de narcotraficante condenado a 24 anos de reclusão. Mesmo foragido da Justiça do Paraná, ele teria conseguido comprar armas através da loja de Dourados. No início de junho, foi preso com as armas em Balneário Camboriú (SC).

O policial Marcelo Neves Camera (Foto: Reprodução)
O policial Marcelo Neves Camera (Foto: Reprodução)

A Federal Armas – Marcelo conta que logo após montar a loja com os dois empresários, os sócios deixaram a empresa para cuidar de outros negócios. Segundo ele, foi aí que entrou na história Claudinei Tolentino Marques (principal alvo das investigações deflagradas pelo Dracco). Dono de empresa de construção civil, Claudinei comprou a parte dos outros fundadores e passou a administrar a empresa.

Com 17 anos de Polícia Federal, atirador de elite e instrutor sobre armamento e tiro da corporação, Marcelo Neves, 50, explica que não existe impedimento legal para agente federal ser sócio cotista de empresa. Segundo ele, a lei impede apenas que servidores federais com dedicação exclusiva (como é o caso dos agentes da PF) assumam cargos de administração ou gerenciamento.

O policial conta que em 2021, quando a loja e o clube de tiros da Federal Armas estavam em plena atividade, teve graves problemas de saúde por causa de uma doença rara que atingiu seu intestino e passou por quatro cirurgias e vários dias internado na UTI.

Ainda em recuperação e impedido de exercer atividades como instrutor na empresa, Marcelo Neves decidiu convidar o também policial federal Alessandro Roque (seu amigo pessoal e também instrutor de tiro) para a sociedade.

Entretanto, devido a divergências internas, os dois deixaram a sociedade. Marcelo conta que o afastamento começou em meados de agosto de 2022. No dia 18 de outubro de 2022, os dois policiais federais venderam a parte deles para Claudinei Tolentino e sua esposa, Ana Carolina Novelli Brassarotto Marques.

Segundo o contrato de compra e venda ao qual o Campo Grande News teve acesso, o valor da venda foi de R$ 700 mil. Em março de 2023, Claudinei deixou oficialmente a empresa, que passou a ter Ana Carolina como única sócia administradora.

A reportagem apurou que Marcelo Neves (atualmente aposentado) e Alessandro Roque não são alvos das investigações sobre comércio ilegal de armas de uso restrito. As vendas suspeitas teriam ocorrido após os dois deixarem a sociedade. Entretanto, eles foram intimados a prestar depoimento e colaboram com as investigações.

A Superintendência da Polícia Federal em Mato Grosso do Sul foi procurada sobre o caso, mas informou que não se manifesta sobre investigações em andamento.

Loja suspensa – A defesa da Federal Armas confirmou que a loja estava com as atividades suspensas pelo Exército. “A empresa não estava comercializando armas de uso restrito, em razão da instauração de procedimento administrativo no âmbito do Exército”, afirma a defesa, representada pelos advogados Jail Benites de Azambuja e Sergio Henrique Resende Lanzone.

Segundo os advogados, a Federal Armas já apresentou defesa e questiona na Justiça Federal a legalidade do procedimento, “processo judicial até este momento sem decisão”. A defesa considerou a apreensão das armas “absolutamente desnecessária, uma vez que [as armas] foram legalmente adquiridas e não havia possibilidade de serem comercializadas enquanto não resolvido o procedimento administrativo instaurado no Exército”.

Também em nota enviada pelos advogados, Claudinei Tolentino Marques informou que as vendas de armas só eram feitas após autorização da Polícia Federal e do Exército Brasileiro e negou qualquer irregularidade.

“Tal atividade é totalmente controlada e fiscalizada pelo Exército e Polícia Federal, não havendo notícia, tampouco acusação, de que tenha sido comercializada, enquanto esteve no comando de referida empresa, qualquer arma sem autorização de tais órgãos”, afirmou.

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