Pó que vale R$ 20 mil o quilo atravessa MS, acirra disputa e sustenta barões
Pó branco que atravessa Mato Grosso do Sul por terra, água e ar, a cocaína fomenta um mercado que paga até R$ 20 mil pelo quilo em Campo Grande, sustenta fortunas dos barões do tráfico, alimenta disputa sangrenta na fronteira e pode ser comprada por R$ 50 a grama no traficante mais próximo, que entrega na porta de sua casa.
Em 2015, foram tirados de circulação 7,2 toneladas em Mato Grosso do Sul. Em 2016, as apreensões somam 3,6 toneladas. Batizada de Nevada, uma operação da PF (Polícia Federal) neste mês em Campo Grande mostrou que o tráfico banca um estilo de vida luxuoso: com carrões, mansão, joias, obras de arte e talheres folheados a ouro.
Conforme a polícia, a droga tinhas dois modais de transporte: aeronave e transporte terrestre. A droga vinha de avião da Bolívia, na fronteira com Corumbá. Depois, era lançada em fazendas de Bodoquena e Bonito. A viagem continuava em caminhões e carros de passeio por estradas vicinais com destino a São Paulo.
Em dois anos de investigação, foram apreendidos 778 kg de cocaína e US$ 2,2 milhões. Segundo o portal UOL, na Bolívia, o quilo da droga custa R$ 8,5 mil. Em São Paulo, o valor mais que triplica: R$ 27 mil.
A modalidade do transporte por terra inclui um vasto repertório de como esconder a droga. A PRF (Polícia Rodoviária Federal) já flagrou a versão líquida, em caminhão frigorifico e engomando roupa. Mas tampem há método mais perigoso. “Uma prática muito utilizada ainda é o barrigueiro. É difícil [localizar] porque a pessoa engole as cápsulas”, afirma o inspetor Tércio Baggio.
Outra estratégia que dificulta apreensões é recorrer a caminhões frigoríficos para transportar a cocaína. “Não pode romper o lacre, é um acordo comercial”, afirma. Nesses casos, um scanner pode ser a única forma de barrar o tráfico. “Atrás de toda a carga lacrada, R$ 300 mil de carne, tinha uma estrutura escondida, um fundo falso”, relata o inspetor.
Fronteiras do pó – De um extremo ao outro, da Bolívia ao Paraguai, a fronteira de Mato Grosso do Sul tem rastro da cocaína. Da vizinha Bolívia e do Peru vem o entorpecente que ingressa pela região fronteiriça de Corumbá.
“Aqui é rota com certeza, um entreposto. Mas uma parte fica para o consumo interno. A cotação em Campo Grande é de R$ 20 mil o quilo. Mas o preço aumenta quando vai para fora”, afirma o titular da Denar (Delegacia Especializada de Repressão ao Narcotráfico), delegado Rodrigo Yassaka.
Já a fronteira com o Paraguai é rota alternativa para a cocaína. “Tudo é mecanismo para burlar a fiscalização”, diz o delegado. Para quem atua na repressão, a falta de punição para o usuário “trava” a engrenagem no combate ao tráfico.
“A análise é muito simplificada. Qual o destinatário final da droga? Qual a penalização para o usuário? Se não tem penalização para o usuário, qual o fundamento de combater o tráfico?”, questiona Yassaka.
Segundo ele, o efeito colateral é aumento de furtos e roubos para que os objetos virem moeda de troca nas boca de fumo. “Dizer que o usuário não faz mal a ninguém é balela. Não faz mal até te dar um soco na cara e roubar seu celular”, afirma o titular da Denar.
Barões – Na fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero (Paraguai), a disputa pelo controle do mercado de entorpecentes têm se mostrado sangrenta. Com direito a uso de armamento antiaéreo, a execução do traficante e empresário Jorge Rafaat Toumani, em Pedro Juan, foi uma demonstração de força do crime. Ele foi morto há uma semana.
A disputa entre grupos e facções na fronteira tem como pano de fundo o controle de área que serve de esconderijo e propícia para controle do tráfico de armas e drogas.
Flagrantes – Do total do ano passado, 4,5 toneladas foram apreendidos pela PF e 1,8 tonelada PRF. Neste ano, são 2,5 toneladas recolhidas pela Policia Federal e 1,1 tonelada da Polícia Rodoviária Federal.
A dependência química também alimenta um mercado ilegal, criminoso e desleal. No varejo do tráfico, a ordem é lucrar. Desta forma, entram em cena vários recursos para ludibriar o “cliente”: cafeína, lidocaína e até veneno para barata. Os “ingredientes” fazem parte das amostras de cocaína apreendidas e analisadas pela perícia.