Sem medicamento para Zika, combate só depende de ações sanitárias
Os casos de microcefalia - malformação congênita em que o cérebro não se desenvolve de maneira adequada - que atingem os estados do Nordeste, onde 17.399 casos da doença já foram detectados em sete estados da região, tem deixado gestantes e mulheres que planejam engravidar apreensivas quanto a proliferação descontrolada da doença no restante do país, já que cientistas e profissionais da saúde estão associando a doença ao Zika vírus, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, o mesmo vetor da dengue.
Apesar de o ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, ter declarado que não é necessário ciar nenhuma situação de alarde indevido, pois os casos ainda estão em estudo, a neuropediatra Maria José Maldonado, presidente da Associação Médica de Mato Grosso do Sul, considera a situação grave e exige atenção especial do poder público.
A médica conta que voltou há poucos dias de um congresso no Nordeste e ouviu relatos preocupantes dos profissionais de saúde. "Tive colegas relatando o aparecimento de até dez casos por semana em algumas unidades de saúde. Não é coincidência", revela.
Ela destaca que as deficiências do sistema público de saúde no Nordeste contribuem com a proliferação dos casos, já que as gestantes não têm um acompanhamento adequado durante o pré-natal. Essas dificuldades, aliadas a falta de informações sobre o novo vírus, fazem com que a prevenção contra a doença se restrinja apenas às medidas sanitárias, como combate aos focos do mosquito e limpeza de terrenos.
A médica explica que antes do aparecimento do Zika vírus, a microcefalia era associada, geralmente à infecções inflamatórias ocorridas intra útero, causadas, em sua maioria pela toxoplasmose, ocasionada por um protozoário encontrado nas fezes dos gatos e pelo citomegalovírus, que é um vírus da mesma família do herpes vírus, que pode causar uma infecção do sistema nervoso central, digestivo e na retina.
Este vírus está presente na maioria das pessoas e se manifesta quando o sistema imune encontra-se comprometido. Conforme a neuropediatra Maria José Maldonado, essas infecções, quando descobertas durante a gestação, são tratáveis, pois existem medicamentos para o combate, o que não ocorre com o Zica vírus.
Mesmo quando o teste do pezinho, realizado nos recém-nascidos, acusa por exemplo, a toxoplasmose no bebê, há um tratamento que pode ser feito durante alguns meses. Por isso a médica ressalta que a única forma de proteger o feto da microcefalia é combatendo o mosquito transmissor do Zika.
"Não há muito o que fazer, já que o causador está no meio ambiente e não depende apenas de você manter sua casa limpa. É preciso cuidar também do lixo do vizinho e dos terrenos baldios próximos de sua casa", orienta. Maria José explica que quando a doença é detectada no pré-natal, não há o que fazer, pois significa que ela já atingiu o encéfalo, causando uma destruição cerebral. A infecção pode ocorrer até o quinto mês de gestação.
Ainda de acordo com a neuropediatra, a expectativa de vida de uma pessoa com microcefalia é grande, porém sua qualidade de vida é ruim, uma vez que ela irá apresentar quadros de epilepsia, convulsões e outras implicações associadas ao desenvolvimento intelectual.
A microcefalia faz com que o indivíduo nasça com a cabeça menor do que a de outros da mesma idade e sexo, já que o cérebro não se desenvolve o suficiente durante a gestação ou após o nascimento.
Medidas - Preocupado com o avanço do Zika e com a possível relação do vírus com os casos de microcefalia, o governo federal vai lançar uma campanha para enfrentar o surto do Zika. Além da campanha, o Ministério da Saúde vai criar um grupo interministerial, comandado pela Casa Civil, para estudar as medidas necessárias em outras pastas para controlar o surto de microcefalia.
A expectativa é que o governo amplie os investimentos no combate ao mosquito, destinando recursos a outras ações para barrar o aumento de casos da doença.
Segundo dados divulgados nesta terça-feira pelo informe epidemiológico sobre microcefalia, até o último sábado (21), foram notificados 739 casos suspeitos de microcefalia, identificados em 160 municípios de nove estados do Brasil.
O estado de Pernambuco lidera com o maior número de casos (487), sendo o primeiro a identificar aumento de microcefalia em sua região e que conta com o acompanhamento de equipe do Ministério da Saúde desde o dia 22 de outubro. Em seguida, estão os estados de Paraíba (96), Sergipe (54), Rio Grande do Norte (47), Piauí (27), Alagoas (10), Ceará (9), Bahia (8) e Goiás (01).
Em Mato Grosso do Sul ainda não foram observados casos da doença, porém em Dourados, um caso de microcefalia em um bebê de 50 dias de vida foi detectado semana passada em uma clínica particular. As autoridades de Saúde já informaram o Ministério da Saúde através do Departamento de Vigilância Epidemiológica do município.
Entretanto, não será mais possível atestar se o Zika vírus foi o causador da microcefalia, já que o exame que poderia identificar o vírus só poderia ter sido feito no início da gestação, através do líquido amniótico.
Quanto as gestantes, a orientação do Ministério da Saúde é que elas mantenham o acompanhamento e as consultas de pré-natal, com a realização de todos os exames recomendados pelo médico, evitando o consumo de bebidas alcoólicas ou qualquer outro tipo de drogas, além de não utilizar medicamentos sem orientação médica e evitar contato com pessoas com febre ou infecções.
É importante também que as gestantes procurem se proteger da exposição de mosquitos, mantendor portas e janelas fechadas ou protegidas por telas. O uso de calças e camisa de manga comprida e repelentes permitidos para gestantes também contribuem com a proteção.