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Em Pauta

A doce sedução do açúcar

Mário Sérgio Lorenzetto | 27/08/2018 10:41
A doce sedução do açúcar

Os antepassados evolutivos do Homo sapiens tiveram diferentes dietas. Alguns se alimentavam predominantemente de vegetais, outros eram caçadores, e alguns carniceiros que competiam com as hienas pelos restos dos grandes animais mortos. Há dois fatores fundamentais que ajudaram no triunfo do Homo sapiens. O primeiro foi o fogo usado no cozimento dos alimentos, algo que começou com o Homo erectus há quase dois milhões de anos. O fogo nos permitiu aproveitar melhor os nutrientes, encurtar a digestão e o mais importante, possibilitou que o cérebro crescesse e desenvolvesse sem restrições energéticas. O cérebro do Homo sapiens consome 25% da energia que consumimos. Para comparar, nosso primo gorila é "crudivegano" - se alimenta de verduras cruas - , o que o obriga a passar 80% do tempo comendo e a cada dia requer 20 quilos de comida. Esse conhecimento científico é fundamental para o questionamento de algumas modas culinárias atuais: a ingestão de carnes cruas (sushi e carpaccio) e veganismo nos remete a dificuldades no aproveitamento de nutrientes, no mínimo.

A doce sedução do açúcar

A língua e o nariz determinaram nossas escolhas alimentares.

Para que o homo dominasse o mundo foi necessário adaptar-se a qualquer meio ambiente e a qualquer dieta. Para isso, contou com dois aliados muito especiais: a língua e o nariz. Essa dupla nos indicou o que podíamos comer ou não. Assim, o sabor salgado e o ácido indicavam que a comida poderia ser segura, uma vez que os dois - sal e vinagre - são conservantes de alimentos. Hoje sabemos de 5 sabores que percebemos: umami, doce, azedo, amargo e salgado. O umami é o mais desconhecido, significa "gosto saboroso e agradável". Pois esse umami para nossos antepassados estava ligado às carnes assadas. Também estava ligado à ausência de doenças, uma vez que o fogo é essencial para matar patógenos. Do outro lado estava o sabor amargo, nos indica a presença de tóxicos e nos adverte que é melhor fugir.
O olfato não fica atrás. Os odores mais nauseabundos podem conter moléculas com enxofre ou poliaminas, que são produtos típicos da decomposição, avisando-nos de que a comida está em mal estado. E agora vem o sabor doce. Sem dúvida, o mais importante. Temos de recordar que a comida era irregular para nossos antepassados. Havia épocas de abundância e outras de fome. Foi por isso que nossa fisiologia adaptou para acumularmos energia em forma de gordura para termos alguma reserva em "época de vacas magras". O doce indicava que a comida era rica em açúcares e, portanto, energia rápida que deveria ser comida a toda pressa. Então, observem bem: estamos condicionados para sermos geneticamente gulosos.
Atualmente, nossas jornadas de caça se dão nas prateleiras dos supermercados, um diminuto esforço quando comparado à caça que praticavam os primeiros homo. Aqui vem o problema. O exagero no consumo de alimentos, especialmente de açúcares nos remetem à obesidade e diabetes.

A doce sedução do açúcar

A verdade está no equilíbrio e variedade.

Nos anos 1950, John Yudkin começou a advertir dos riscos consumo elevado do açúcar. Um alimento rico em açúcares será rapidamente absorvido pelo intestino, nos provocará uma elevação da insulina e se não for queimado rapidamente - com exercício intenso - será armazenados nos quadris e na cintura, provavelmente até o fim da vida. O livro de Yudkin era alarmista pois queria que deixássemos de comer todo e qualquer açúcar, um exagero. Mas acertava em profetizar muitos dos males que estamos sofrendo 60 anos depois.
Todavia, Yudkin foi contemporâneo de Ancel Keys, inventor-descobridor da "dieta mediterrânea", termo cunhado na Universidade de Minnesota (EUA). Keys, que foi uma figura muito influente, lançou todo o ataque às gorduras. Discurso que foi recebido festivamente pelos cultivadores de milho, beterraba (na Europa o açúcar é retirado dessa herbácea) e cana de açúcar. Nas décadas de 1980 e 1990 foi lançada uma imensa campanha contra o colesterol e outras gorduras com a finalidade de eliminá-las de nossa alimentação. Os fabricantes para que seus produtos não perdessem o sabor, responderam incrementando o nível de açúcar. O resultado final foi exatamente o contrário do esperado. Disparou a obesidade e diabetes. Agora a tendência é indultar as gorduras e demonizar o açúcar, mas em fisiologia e nutrição as soluções de "tudo ou nada" não funcionam. No equilíbrio e na variedade está a solução.

A doce sedução do açúcar

Não se engane, é açúcar.

Renunciar a uma colher de açúcar no café é irrelevante. O problema é que o açúcar está presente na quase totalidade dos alimentos. Especialmente dos originários de fábricas. E enganam muita gente. São denominados de sacarose, dextrose, glicose, xarope de milho, frutose, xarope de ágave...a lista é extensa. Mas, não se engane, os de origem natural causam os mesmos problemas - obesidade e diabetes - que os originários de fábricas. É certo que o mel, açúcar mascavo, demerara, além de açúcar, contêm diminutas quantidades de vitaminas e antioxidantes em suas composições, mas seguem sendo açúcar. Ainda que o açúcar se disfarce com outros nomes e formulações, a única e real saída é a redução de seu consumo. O resto é lenda para vender maior quantidade de produtos mais caros.

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