A vergonha, a violência contra a mulher abala os filhos

Ela tinha apenas doze anos. Seu pai, em um excesso de fúria, tentou estrangular sua mãe, num domingo. A partir daí, ela passou a sentir vergonha por estar ligada a essa família quando a comparava com a família das outras meninas que frequentavam a mesma escola. O episódio incutiu nela um agudo sentimento de inferioridade. Ela tentará superá-lo com o acúmulo de capital cultural. Esse fato despertou sua consciência e, de certa forma, encerrou sua infância.

Diferente, não era mais da turma das pessoas corretas.

Ali, ela deixou de pertencer à categoria das pessoas corretas. Aqueles que não bebem em demasia, não batem uns nos outros, se vestem e se comportam de modo adequado. Mesmo tendo um uniforme novo a cada começo de ano e um missal bonito, mesmo sendo a primeira da turma na escola das freiras e fazendo suas orações, ela já não parecia com as outras meninas da classe.

A infância marcada pela agressão.

Ela era de uma família de origem operária e de proprietário de pequeno comércio. Enquanto o pai continuava trabalhando em uma fábrica, a mãe administrava um pequeno bar-mercearia. Viviam nos fundos desse comércio. Em sua memória, restaram não mais que poucas impressões de sons e imagens, fragmentos das histórias que ouvia dos mais velhos e a vergonha da agressão sofrida pela mãe. Ela irá marcá-la ao longo da vida. Desde sua frustrada iniciação sexual - em um lugar onde a educação sexual era tabu - até a criação com exagero de cuidados dos filhos. Também a conduziu a uma separação do marido que ela julga mal administrada, bastou ele levantar a voz com ela para que fizesse o pedido de divórcio. A violência contra a mulher abala a vida dos filhos.