Empresas lucram vendendo dados que consumidor troca por desconto no comércio
Na Capital, empresária diz que já teve proposta para comprar dados até de associação, para ganhar clientes
Provavelmente seu CPF (Cadastro de Pessoas Físicas) e número de telefone estão circulando por todo o Brasil, caso um dia você tenha, por exemplo, entrado em uma farmácia e feito "cadastro" em troca de descontos. Algumas vezes, o preço continua igual, mas as informações já foram vendidas, o que é proibido. Ligações de pessoas desconhecidas oferecendo qualquer tipo de produto são um dos efeitos dessa prática nociva.
Empresária, de 41 anos, que preferiu não se identificar, é exemplo de quem já recebeu esse tipo de proposta. Ela garantiu que há 2 anos era associada da ACICG (Associação Comercial de Campo Grande) e comentou pessoalmente com um consultor do local que queria aumentar o número de clientes e não sabia como. O profissional, então, ofereceu CPF e telefones de consumidores para que ela comprasse.
“Eu queria aumentar nossa base de clientes. Tínhamos muita gente com nome sujo e precisava filtrar pessoas que não tinham, disse que precisava fazer uma divulgação melhor. Ele [consultor] ofereceu leads qualificados, com CPF e telefone. Naquela época, queríamos entrar em contato com essas pessoas para serem possíveis clientes nossos”, lembra.
Ainda de acordo com ela, cada CPF era até considerado barato, mas como precisava ser enviado para várias pessoas para surtir efeito, no final das contas, saía caro.
Em resposta, a Associação Comercial e Industrial de Campo Grande disse que nunca ofereceu e nem realizou a comercialização de dados pessoais de seus associados. “Diante de qualquer contato que ofereça este tipo de serviço, a entidade orienta que os empresários informem a ACICG para relato do fato. A entidade está comprometida com a proteção de informações pessoais e suas diretrizes estão em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados”, disse em nota enviada.
Conforme explica a advogada Giuliana Gattass, que é presidente da CEALGPD (Comissão de Estudo e Acompanhamento da Lei Geral de Proteção dos Dados e Segurança da Informação) da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Mato Grosso do Sul), a prática é proibida.
“Expressamente proibido porque os verdadeiros donos dos dados são os titulares de dados que são as pessoas naturais. A LGPD não proíbe no seu texto a Cessão onerosa de dados a comercialização, mas não posso comercializar o que não sou o verdadeiro proprietário”, pontua. A Lei n° 13.709, que diz respeito à Lei de Proteção de Dados, entrou em vigor em 2018.
Para fins de publicidade, o consultor de marketing Josué Sanches não concorda com esse método. “Do ponto de vista de marketing é desnecessário comprar esses dados, porque a melhor fonte de acesso é o Google. Pelo Google consigo dados públicos, claro que vai ter um certo trabalho e sem precisar pagar”, disse.
Segundo o delegado da Receita Federal em Campo Grande, Zumilson Custódio da Silva, podem existir duas possibilidades: acesso indevido aos dados ou empresas que tenham construído a própria base de dados no comércio.
“Em regra, é ilegal, pode ser que envolva uma questão fraudulenta que tenha obtido de forma ilegal, invadido uma base de dados, e outra opção é quem construiu base de dados no comércio, mas vai ter que comprovar como obteve esses dados e se for de forma legal vai ter que ter autorização dessas pessoas.”
Prática - A equipe de reportagem entrou em contato com uma plataforma que diz ter disponível 220 milhões de CNPJ e CPF no Brasil.
Segundo o atendente, é possível escolher o tipo de pessoa, idade, a renda, o bairro. São dois planos oferecidos.
No primeiro plano, são oferecidos WhatsApp ou número de telefone, Estado e cidade onde a pessoa mora. São a partir de 10 mil contatos por R$ 1 mil.
No segundo plano, são oferecidos CPF, RG, data de nascimento, signo, endereço completo com CEP, nome da mãe, renda estimada e o telefone. São 3 mil pessoas por R$ 850.
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