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Economia

Enquanto programa ensina a pagar tributos, Fiems defende "pacote de bondades"

Esses privilégios, segundo tributarista, são estímulos a sonegação.

Marta Ferreira | 24/11/2020 19:10
Cliente com nota fiscal na mão: desde o início do ano programa incentiva com prêmios quem pede o documento. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)
Cliente com nota fiscal na mão: desde o início do ano programa incentiva com prêmios quem pede o documento. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)

Há quase um ano, o governo de Mato Grosso do Sul colocou nas ruas o programa “Nota Premiada” que, por meio de sorteio de prêmios estimados em R$ 300 mil neste ano, tem objetivo de incentivar o contribuinte a pedir o documento e, assim, garantir a arrecadação de tributos sobre os produtos e serviços comercializados. A iniciativa de educação fiscal tem surtido efeito: aumentou em 21% a emissão de notas, mesmo em ano de pandemia, segundo a área responsável na Secretaria de Fazenda.

Na contramão desse esforço, porém, a maior entidade empresarial do Estado, a Fiems (Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul) está propondo a adoção de novo “pacote de “bondades” a empresários em débito com o fisco estadual. A ideia é refinanciar até mesmo dívidas de multas de quem desrespeitou o Código de Defesa do Consumidor.

Apesar de vir divulgando em seus próprios canais de comunicação a recuperação da economia e da atividade industrial, inclusive das exportações, que atingiram R$ 2,8 bilhões até setembro, a Fiems diz que seus associados precisam de mais essa ajuda do poder público para superar a "crise". O pedido foi feito mesmo havendo Refis em andamento, com prazo final até dezembro, e que já foi prorrogado, a última vez no mês passado.

Até setembro, o programa havia recuperado em torno de R$ 283,3 milhões, menos de 40% do montante milionário de R$ 750 milhões esperados.

Pelas regras desse Refis, específico para ICMS, os parcelamentos podem chegar até  120 vezes, além do desconto de 80% no valor das multas.

 Mais – Não basta. Na semana passada, em reunião com representantes da Assembleia Legislativa e do governo do Estado, o presidente da Fiems, Sérgio Longen, apresentou proposta para adoção de pacote de medidas, ainda este ano, para facilitar a vida do empresário em débito.

A entidade defende novo Refis só para dividas do Procon, cuja lista de fornecedores mais problemáticos é liderada por empresas de grande porte, estimadas em R$ 4 milhões, e também para o Fundersul (Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário), além de incentivos a adoção de energia solar.

As propostas estão em análise e vão depender tanto da avaliação por parte do governo quanto da aprovação na Assembleia Legislativa.

Incentivo à sonegação – Para dois advogados ouvidos pela reportagem, esse tipo de medida quando adotada de forma repetida, acaba por incentivar o não pagamento de impostos. Prejudica, principalmente, quem paga direito seus deveres com o Poder Público, para financiar o custeio da máquina pública e de setores básicos como saúde e educação.

Essas questão dos Refis que são reiteradamente reeditados, eles são estímulo à sonegação, acabam implicando em prejuízo na arrecadação dos entes, dos estados, da União”, avalia o tributarista Flávio Cavalcante.

Para ele, o ambiente fica tóxico para os negócios. “Estabelece-se a concorrência desleal”, define. “É um convite à inadimplência e castigo para aqueles que cumprem em dia suas obrigações”, emenda.

“Por um lado pode estimular o pagamento, o que sempre será bom para o caixa do governo, mas por outro lado, até pela frequência que isso ocorre, certamente representará um desestímulo ao árduo trabalho da fiscalização. Com a palavra final o mais legítimo representante do povo: o parlamentar”, instiga o constitucionalista André Borges.

Programa de perdão de dívidas, como quer o presidente da Fiems, Sérgio Longen, segundo o chefe da unidade de Educação Fiscal da Sefaz (Secretaria Estadual de Fazenda), Amarildo Cruz, é contraditória ao intuito do programa Nota Fiscal.

 “Pode ser um desestímulo para quem pensa: todo mês eu pago certinho e o contribuinte que não pagou recebe esse benefício.”

De maneira geral, é lógico que uma política de refinanciamento trata de forma desigual quem é igual”, define.

O programa Nota Premiada educa os contribuintes tanto para pedir nota fiscal, forçando o o contribuinte à oficialização da compra e do imposto a pagar, quanto para que as pessoas aprendam a pagar o seus compromissos em forma de impostos e taxas.

Conforme dado fornecido por Amarildo, mensalmente o programa reforçou com pelo menos R$ 20 milhões o caixa estadual. A média de arrecadação de Mato Grosso do Sul é de R$ 1 bilhão.

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