Após perder filha para depressão, Guicela vive para ajudar outras mães
Ela participa de um projeto em que fala sobre a prevenção ao suicídio e auxília pessoas no processo de luto
Desde 2019, Guicela Matos Bruno, de 34 anos, carrega a dor de ter perdido a filha Beatriz, aos 14 anos, para a depressão que a levou ao suicídio. A culpa, a busca por respostas, a ausência deixada pela jovem e a falta de uma rede de apoio marcaram os primeiros meses do luto.
Em novembro do ano passado, ela começou a participar do grupo “Floresci na Dor” e encontrou pessoas que também perderam alguém da mesma forma. A partir de então, Guicela achou um novo objetivo de vida e agora, dedica o tempo que tem para ajudar outras mães como ela.
Em Campo Grande, ela é coordenadora do núcleo que aborda o suicídio e tem participantes em todo o Brasil, além de uma equipe composta por psicólogos e psiquiatras. Criado em Araçatuba, São Paulo, o Floresci na Dor é presidido por Simone Frois, de 36 anos.
Ao Lado B, Guicela fala sobre o luto, a trajetória dela desde que a filha faleceu e o papel que o grupo tem no cotidiano dela. “As pessoas não reconhecem que a depressão é uma doença, fica esse tabu e as pessoas não olham para quem está enlutada. Então, o Floresci veio para acolher as pessoas e eu me senti muito amada”, conta.
Guicela expõe que sofreu com o julgamento e tentou achar respostas para os motivos que levaram a filha a desistir de viver. “No início, a gente tem aquela sede de buscar um culpado. Assim como me julgavam e colocavam a culpa em mim, eu queria saber o que estava acontecendo, porque ela não deixou carta e nem nada”, diz.
Beatriz recebia ajuda psicológica, mas, segundo a mãe, não deu sinais de que estava com depressão. “Perguntei para a psicóloga se ela dava algum indício e não. Nem toda depressão a pessoa vai estar quietinha e chorando, então, se a pessoa não falar, você não percebe”, explica.
Quando perdeu a filha, Guicela também desenvolveu um quadro depressivo e não conseguia manter uma rotina saudável. Além dessa dificuldade, ela fala sobre o afastamento de pessoas. “Quando uma pessoa perde um filho, as pessoas se distanciam, porque o tempo todo você está chorando e triste. As poucas que ficaram, eu me afastei, porque elas não saberem o que falar acaba me machucando”, desabafa.
Depois do ocorrido, a mãe precisou mudar de casa e bairro, pois tudo trazia lembranças da filha e da forma como ela se foi. “Eu fiquei com trauma até hoje, eu não consigo passar na rua, porque começo a passar mal”, desabafa.
Os traumas, conforme Guicela, é uma das diversas coisas que uma mãe enlutada sente.
Uma pessoa enlutada por suicídio tem culpa, tem julgamentos e traumas. É muito difícil e a gente não tem o apoio. As pessoas acham que para ter apoio, você tem que falar algo, mas não precisa, é simplesmente dar um abraço”, destaca.
A vontade de amparar outras mães - Por tudo que aconteceu, Guicela decidiu auxiliar mães, pais e pessoas que perderam alguém amado por doenças como a depressão. Antes de encontrar o grupo, ela organizou atos e palestras sobre o tema em locais públicos, sendo um deles, uma unidade de saúde.
Agora, a coordenadora se dedica ao trabalho à frente do núcleo sobre suicídio do Floresci na Dor. No Dia Das Mães, ela e outras mulheres desenvolveram um ebook e agora, junto com os outros membros, elabora uma cartilha. “Estamos desenvolvendo para informar as pessoas como é o luto, de que forma ele é vivido e a prevenção ao suicídio”, explica.
A prevenção, conforme ela, é algo essencial e um assunto importante para evitar que outras mães chorem a morte dos filhos. “A dor e a saudade que eu vivi e ainda vivo é o que me motivou a trabalhar na prevenção ao suicídio. Nenhuma mãe merece perder o filho para o suicídio ou de qualquer forma. Eu quero muito que o Floresci cresça, porque atualmente, não temos nenhuma ajuda”, destaca.
A presidente do Floresci na Dor, Simone, criou o grupo em março de 2020 com a proposta de ajudar mães que perderam os filhos de diferentes formas. Com sete filiais no País, a instituição é dividida em núcleos para ajudar os participantes de forma mais objetiva. “Hoje, temos núcleos que englobam vários tipos de luto, como o parental, neonatal, suicídio e de homens. A gente se divide certinho, porque cada dor é única e sentida de um jeito”, justifica.
Quem quiser conhecer o projeto e os diferentes grupos de luto, o perfil no Instagram é @florescinador.
Ajuda - Nem sempre é fácil tratar o assunto, falando da gravidade do problema, sem aprofundar na prática do suicídio. Mas precisamos falar sobre, dialogar é prevenir.
Em Campo Grande, o Grupo Amor Vida (GAV) presta um serviço gratuito de apoio emocional a pessoas em crise através dos telefones (67) 3383-4112, (67) 99266-6560 (Claro) e (67) 99644-4141 (Vivo), todos sem identificador de chamadas. Ligue sempre que precisar! Horário de funcionamento das 07:00 às 23:00, inclusive sábados, domingos e feriados.
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