Certidão retificada é alegria que ‘finalmente chegou’ para mãe e filha trans
Defensoria Pública entregou nesta quarta-feira (12) certidões de nascimento para 47 pessoas trans e travestis
“A felicidade demorou um pouquinho, mas finalmente chegou”, conta Niah Leite. Após 22 anos, ela recebeu em mãos nesta quarta-feira (12) a certidão de nascimento onde consta seu nome e identidade de gênero retificada. A jovem está entre as 47 pessoas que obtiveram o documento gratuitamente através da campanha ‘TRANSformando Histórias’ da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul.
A entrega da certidão para pessoas transexuais e travestis marca a última fase da campanha que teve início em abril deste ano. Apesar do serviço de retificação ser feito diariamente pelo órgão, é a primeira vez que a Defensoria Pública realiza a ação coletiva em Campo Grande.
O Auditório da Escola Superior da Defensoria Pública de MS foi o local escolhido para marcar o momento que é esperado há muito tempo pelas 47 pessoas, como a Niah Leite. Desde que se entendeu como mulher trans, a autônoma percorreu um longo caminho, mas em cada passo teve o apoio da mãe Graciela Leite, de 47 anos.
Emocionadas, elas aguardavam juntas para pegar a certidão de nascimento. O momento, conforme Graciela, é algo simbólico para ambas. “Eu tô realizada, muito feliz, é como se eu estivesse levando ela ao altar. Eu tô muito feliz pela felicidade dela, que ela sempre desejou, sempre almejou e hoje ela conseguiu. É uma conquista para nós duas”, afirma.
Embora o processo tenha sido burocrático, Niah comenta que foi essencial receber o incentivo e apoio da mãe a todo momento. “Tem muitas pessoas que não têm o apoio dos pais, da família, né?! Eu falo que eu tenho esse privilégio e é muito bom ter a minha mãe comigo”, destaca. A certidão de nascimento representa uma nova fase de vida para ela. “É uma carta para um novo mundo. Vai ser um novo começo, um novo ciclo para mim”, descreve.
Das cadeiras do auditório até a mesa para buscar a certidão, Sam Stefan Sandim, de 52 anos, caminhou radiante ao ouvir o chamarem. Informalmente, Sam carrega esse nome há mais de 20 anos, mas só hoje recebeu a formalização no documento.
Depois de mostrar a certidão para todo o auditório e especialmente para a noiva Marlen Francisco, ele falou sobre a realização de um dos seus maiores sonhos. “É muito gratificante e é algo que estava esperando há muito tempo. Eu estou extremamente feliz”, afirma.
Além da mudança na legislação brasileira que permite às pessoas transexuais façam a alteração do nome, sexo ou gênero, Sam também buscou a retificação na certidão de nascimento, pois irá se casar ainda neste ano. A vontade dele era que constasse na certidão de casamento o nome que escolheu para si. “Eu queria casar depois que trocassem meu nome certinho e agora eu consegui. É uma realização, um dos meus sonhos foi realizado hoje”, fala.
Pietro Gabriel Salina de Melo, de 24 anos, aguardava desde 2020 para realizar o processo de retificação. A burocracia, assim como o medo, foram entraves que deixaram a etapa custosa, mas isso chegou ao fim hoje para ele. “Eu tô realizando uma coisa que não achei que poderia por ter medo do que ia acontecer, do que as pessoas iam falar por medo. Então é uma conquista enorme”, pontua.
Campanha TRANSformando Histórias - Lançada no primeiro trimestre deste ano, ação da Defensoria Pública atendeu 50 pessoas com apoio de outros órgãos do Estado, entre eles a Anoreg (Associação dos Notários e Registradores) e a SEC (Secretaria de Estado de Cidadania) e o TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) e MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul).
Essa união, de acordo com a defensora pública Thaisa Raquel Defante, possibilitou que o serviço fosse completamente gratuito. “Nós tivemos uma lei recente no final do ano passado que facilita um pouco o acesso às pessoas hipossuficientes porque ela reduziu bastante os custos. Entretanto, essa ação foi realizada de maneira totalmente gratuita o que foi possível através dessa parceria, especialmente os cartórios”, explica.
A coordenadora do Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh) defende que a certidão retificada é um direito das pessoas travestis e transexuais.
“Hoje a gente faz um ato de entrega dando visibilidade a esse direito, o direito que a pessoa tem de ser chamada pelo nome com o qual se identifica. Chamamos instituições importantes e todas elas estão marcando aqui a sua participação, importância e dedicação à diversidade, a uma sociedade diversa, plural e sem preconceitos”, completa.
A Defensoria Pública realiza o atendimento a esse grupo de segunda a sexta-feira. No caso da retificação nos registros civis, a instituição consegue auxiliar aqueles que não têm recurso para fazer o pagamento das taxas solicitando a gratuidade de algumas.
“A pessoa pode procurar a Defensoria Pública pedindo a listagem de documentos e a gente tenta facilitar para ela consiga buscar os documentos e, se não conseguir, a gente ajuda também”, pontua a defensora.
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