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Comportamento

Com nome inspirado na Bíblia, Miss Violência é a drag que quer acordar a cidade

Miss Violência diz que chegou para levantar a bandeira da alegria e do respeito em Campo Grande

Thailla Torres | 20/01/2020 08:13
Miss Violence ou Miss Violência quer movimentar a cidade. (Foto: Torquato)
Miss Violence ou Miss Violência quer movimentar a cidade. (Foto: Torquato)

É escancarado o carinho que Edgard Ferreira, 20 anos, sente por Campo Grande. A retribuição vem em dobro e sempre ao lado da drag queen Miss Violência ou Miss Violence, que nasceu em seu corpo há mais de um ano e adora repetir que “sonha em movimentar a capital sul-mato-grossense que dorme cedo”.

Natural de Recife (PE), criado em Campo Grande desde os 6 anos e filho caçula de um casal lésbico, Edgard diz que a vontade de brilhar o transformou em drag queen e, principalmente, artista. O tom de voz da Missa Violência é alto, o sorriso é aberto e as roupas tem muito, muito brilho. Timidez passa longe, fofura é deixada para o lado menino, enquanto a versão drag não tem medo dos trejeitos e nem de ser uma mulher bonita na noite.

“Eu sempre fui uma criança interessada pela cena cultural da cidade. Entrei de gaiato nos grupos de dança para assistir apresentações e ensaios. Assim comecei a dançar danças urbanas e a ganhar prêmios. Nessa mesma época, foi o boom do RuPaul's Drag Race, e muitas meninas (drags) começaram a se montar do nada. Eu então comecei a dançar para essas meninas e me tornei bailarino de inúmeras drags”, lembra.

O nome é inspirado em um trecho da Bíblia, afirma. “Mateus 11:12", afirma.
O nome é inspirado em um trecho da Bíblia, afirma. “Mateus 11:12", afirma.
E ela se diz pronta para para lutar e animar a cena drag. (Foto: Torquato)
E ela se diz pronta para para lutar e animar a cena drag. (Foto: Torquato)

Um concurso de drag em casa noturna, em 2018, foi algo que o fez enxergar o universo drag com outros olhos. “Vi a oportunidade de me transformar. Assim eu criei essa persona”.

Miss Violência é totalmente diferente do que Edgard costumava ser. “Eu sempre fui um gay muito geek, muito fofo e engoli muito sapo nessa trajetória só de pensar em ser uma drag. Há, de fato, muito preconceito. É como se bicha preta não tivesse de estar nesse caminho”.

O nome é inspirado em um trecho da Bíblia, afirma. “Mateus 11:12, quando diz que o reino dos céus é arrebatado à força e são os violentos que o conquistam”, descreve. “Então a Miss violência veio para ser uma pessoa violenta em ser poderosa, que não tem medo de falar, lutar pelo brilho e pelo topo. Para isso, precisava ser violenta”, interpreta.

Preconceito, adversidades e muita resistência fazem parte de sua trajetória. Desde a infância, a feminilidade, o sotaque nordestino e a cor da pele causavam desconforto e eram alvos de bullying e racismo.

Hoje, como drag queen, Miss Violência transformou as marcas deixadas pelos conservadores em bandeira de luta, não só contra o racismo, mas contra a homofobia e ao próprio conservadorismo da cidade. “Preconceito em Campo Grande é igual Meninas Malvadas, é tudo por debaixo dos panos, em alguns momentos. Eles adoram dizer que não existe, mas faz tudo de maneira sutil. Por exemplo, pode haver três drags no cenário, duas brancas e uma preta, chamam as duas brancas para tirar foto e esquecem da negra. São coisas que se a gente problematizar vão dizer que é vitimismo, então a Miss Violência veio também para preencher essas lacunas”, afirma.

Hoje, como drag queen, Miss Violência transformou as marcas em bandeira de luta.
Hoje, como drag queen, Miss Violência transformou as marcas em bandeira de luta.

Em um país que carrega o racismo na história, em que objetificação da pessoa negra é constante e que a coloca como inferior, ser gay e drag queen é duplamente cruel. E, neste cenário, ainda tentam deslegitimar o talento, afirma Violência. “O preto no topo incomoda. As pessoas não têm nada para falar e falam mal até dos meus stories no Instagram. São picuinhas bizarras. A gente está de um lado do país potencialmente mais preconceituoso. Eu sofri preconceito por ser negro, por ter sotaque nordestino, por ser gay e depois por ser drag queen. Mas eu não me canso de lutar”.

Sabe-se que há um cenário mais forte para drag queens fora do Estado e até do País, mas a Miss Violência não cogita deixar a cidade tão cedo. “Eu poderia mudar de cidade, eu poderia ir para São Paulo, mas quero movimentar Campo Grande, mostrar que as cenas drag e LGBT existem. A gente vai nos lugares de madrugada e eles estão fechados. Essa cidade ainda dorme cedo, mas uma parte dela que brilha, que amanhece, e se diverte a noite inteira”.

Além de trabalhar em casas noturnas, Miss Violência participa de concursos, festas, confraternizações e tudo o que for convidada. “Aonde estiverem me chamando eu vou, o importante é animar a noite”, afirma.

Drag queen é provavelmente a profissão do ramo de entretenimento que mais exige versatilidade e criatividade, por isso, ela agradece o apoio da família. “Eu sei que sou privilegiada porque não é todo LGBT que tem a sorte de ter uma família que acolhe, de ter uma família LGBT e que lida muito bem com tudo isso. Mas sou muito grata às minhas mães que vão me prestigiar sempre e recebem até 10 drags na minha casa em dias de transformação”, finaliza.

Quem quiser contratar Miss Violência o contato pode ser feito pelo Instagram (clique aqui)

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