Corredores no Centro abraçam histórias de quem luta no aperto para ser patrão
Na 14 de Julho, vale a descoberta ao entrar no "Pathenophy", que serve lasanha todo santo dia.
Algumas portinhas tem capacidade de abraçar muito mais do que a gente imagina. Quem desacelera pelo Centro ganha a chance de experimentar lasanha caseira todos os dias em lanchonete minúscula ou comprar aquela sandália de couro, feita à mão, por valores muito menores do que em lojas grandes, basta observar nos corredores estreitos que viraram negócios.
Na 14 de Julho, vale a descoberta ao entrar no "Pathenophy", uma lanchonete em um corredor com 12 metros de comprimento e uma entrada com pouco mais de 1,80 de largura. Ali, estão os sonhos da família de Adenir Pinto Pereira, de 53 anos.
Depois de muito tempo trabalhando em uma lanchonete do Exército, ele a esposa decidiram migrar para o Centro. À época, o preço do aluguel foi decisivo na escolha de um lugar pequeno para recomeçar. Com o movimento de trabalhadores e alunos da escola que faziam fila para comer a lasanha preparada diariamente, o sonho era aumentar os negócios.
Mas o aumento do comércio foi ficando em segundo plano com valores cada vez maiores. "Hoje não temos mais essa grandeza, o movimento do comércio está cada vez menor. No meu ponto de vista o Brasil só vai melhorar daqui uns 5 anos, então esse lugar pra gente é o ideal".
Apesar de pequeno, o espaço comporta até 14 clientes sentados. "Mas na maioria das vezes fazemos marmitas pra que ninguém fique esperando".
O local é pequeno foi sendo ajustado com o tempo. Tem ar-condicionado, ventiladores, mas de tão pequeno, tem dias que o clima quente judia e se o tempo muda, Adenir e a esposa Rosa Pereira, de 47 anos, não enxergam as mudanças. "Por ser estreito eu não consigo ver o movimento da rua, passo o dia todo aqui dentro atendendo. Tem dias que alguém fala que choveu muito em algum ponto e a gente nem fica sabendo".
Mesmo com o aperto do espaço, o local tornou-se a felicidade da família graças à cliente fiel. "A gente ficou pelos clientes, aqui no Centro muita gente já sabe do nosso espaço, então prefiro não mudar".
Na hora do almoço o carro-chefe da lanchonete é a lasanha caseira servida com arroz no prato feito. Tem salgados, doces e bolos feitos pela família.
Rosa era técnica de laboratório e Adenir contador, quando juntos decidiram recomeçar sendo donos do próprio negócio. "Era um sonho administrar o que é nosso. Temos as nossas dificuldades, mas com o tempo conseguimos conquistar o que a gente sonhava".
Tem vezes que a Renato Calçados pode passar despercebida, mesmo em plena 14 de Julho, na quadra onde estão maioria das lojas de decoração. A loja de sapatos conta com muito mais do que se vê nas duas prateleiras da entrada que tem aproximadamente 2 metros de largura.
A programação do dono é não ficar muito tempo por ali, já passaram 41 anos de experiência com a rua mais movimentada da cidade, agora o desejo é descansar diz Renato Moraes de 64 anos. "A gente cansa, moça. O comércio não é mais o mesmo e não tenho muitas expectativas", resume.
Renato é como um patrimônio história da rua. Iniciou no comércio através do pai e herdou o talento de produzir com o couro. Até 2010 ele ainda tinha fabrição em grande escala, uma loja maior, funcionário e venda de calçados para todo estado. "Vinha gente de tudo quanto é lugar comprar nosso sapato".
A melhor fase ficou na década de 70, lembra. "Foram bons tempos, as pessoas usavam muitas botas de couro, bolsas, cintos. Eram produtos de qualidade". Mas a chegada de tantas lojas, principalmente, as chinesas, fez Renato migrar para outro canto, menor do que ele podia imaginar. "Ainda é um dos cantos mais baratos. Tem lugares menores pela cidade que chegam a custar R$ 10 mil, aqui custa R$ 700 o aluguel".
Na loja os preços variam de R$ 20,00 a R$ 150,00 a maioria dos produtos. Hoje, como é apenas Renato que se dedica à produção, tem apenas sapatos e cintos. "Bolsa ninguém compra mais, só das lojas chinesas".
Com inúmeras caixas empilhadas, Renato revela com tristeza as mudanças. "Pra você ter uma noção do movimento, essas caixas de sapato eu recebi em janeiro e até hoje não consegui abrir. Muita coisa mudou".
Mas se fosse para largar tudo, Renato não teria coragem de tamanha "traição". "Sou muito fiel aos meus clientes, tenho gente que compra comigo há anos. Quando eu parei um tempo de fazer as sandálias de couro, tive cliente que ficou bravo comigo, por isso voltei. E não dá pra largar tudo assim", reflete.