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Comportamento

Da violência até vencer a depressão, Cufa é refúgio de muitas mulheres

Atendimento psicossocial, artesanato e dança se tornaram espaço de convívio e amizade para dezenas de mulheres

Por Idaicy Solano | 31/08/2024 06:20
No início da dinâmica, todas fazem alogamentos para 'acordar' o corpo (Foto: Osmar Veiga)
No início da dinâmica, todas fazem alogamentos para 'acordar' o corpo (Foto: Osmar Veiga)

O que começou como uma roda de conversa para compartilhar vivências e trazer à tona temas do universo feminino com as mulheres da comunidade do Bairro São Conrado acabou se tornando um lugar de refúgio para dezenas de idosas que frequentam semanalmente as atividades do núcleo de atendimento psicossocial da CUFA (Central Única das Favelas) de Campo Grande. Segundo as participantes, o lugar é "um local de conversa", "de dar gargalhadas", "de ver os amigos" e "de esquecer os problemas".

A aposentada Sílvia Gonzales, de 71 anos, relata que começou a frequentar as atividades da CUFA há cerca de três meses. Antes de descobrir as atividades desenvolvidas na comunidade, ela costumava passar os dias sozinha em casa.

Sílvia conta que, ao começar a frequentar as rodas de conversa e as oficinas de artesanato, encontrou um meio de compartilhar sua história e dividir o peso dos anos de violência doméstica sofridos em seu primeiro casamento, que a forçou a fugir da fronteira para Campo Grande, quando tinha apenas 16 anos.

A aposentada detalha que foi filha adotiva de um casal de paraguaios e viveu até a adolescência em Porto Murtinho. Ela relata que a vida por lá era bastante difícil, então se casou muito jovem com um rapaz do exército, que era violento. “Eu tive que fugir para cá, porque senão ele ia me matar. Eu vim para Campo Grande quando tinha 16 anos e nunca mais saí.”

Sílvia compartilhou um pouco de sua história com o Lado B (Foto: Osmar Veiga)
Sílvia compartilhou um pouco de sua história com o Lado B (Foto: Osmar Veiga)

Por aqui, ela se casou novamente, teve dois filhos e viveu uma vida simples no Bairro São Conrado, onde morou desde que chegou à cidade. Já em idade avançada, os dias da idosa se resumiam a ficar sozinha e desocupada em casa, até começar a frequentar a CUFA. Lá, ela participa do núcleo psicossocial às quintas-feiras e das oficinas de artesanato às sextas-feiras.

Desde que começou a sair de casa para os encontros, relata que tem se sentido mais ‘viva’, além de ter feito novas amigas e encontrado apoio ao desabafar sobre sua história. “Às vezes eu passo um nervoso, aí eu venho, converso com elas e me alivia tudo, fico feliz, me sinto bem.”

A comunidade também se tornou o ‘lar’ da aposentada Noêmia de Oliveira Aristides, de 71 anos, que sofre de depressão. Ela participa das rodas de conversa desde o início e, por lá, também fez muitas amizades com outras mulheres. Assim como Sílvia, que inclusive é amiga de Noêmia, os dias dela também eram limitados às quatro paredes de casa.

No último encontro, que aconteceu na quinta-feira (29), Noêmia se emocionou ao compartilhar com as amigas na roda de conversa sobre sua luta contra a doença, e em como o acolhimento oferecido por elas foi fundamental para que ela não cometesse nenhum ato contra a própria vida.

“Eu ficava dentro de casa, só chorando. A depressão estava muito avançada, eu ficava o dia todo socada dentro do quarto. A Tati [psicóloga da CUFA] apareceu bem na hora. Para mim, mudou muita coisa”, resume.

Noêmia se emocionou ao agradecer pelo acolhimento que recebeu ao tratar a depressão (Foto: Osmar Veiga)
Noêmia se emocionou ao agradecer pelo acolhimento que recebeu ao tratar a depressão (Foto: Osmar Veiga)

A dona de casa Lourdes Oliveira, de 63 anos, começou a frequentar as reuniões a pouco tempo, a convite de uma amiga, e declara que faz mais a linha de ouvinte para as amigas. “Eu não sabia que existia a CUFA aqui, mas daí essa minha amiga falou desse projeto deles, para ajudar as crianças e tudo mais, e aí a gente veio, e daquele dia [em diante] a gente não saiu mais”.

Ela participa das rodas de conversa toda quinta-feira, e faz o curso de artesanato na sexta. Para ela, o mais importante de frequentar as atividades, é ter com o que ocupar a mente e socializar. “Aqui a gente se extrai, porque quando você chega numa certa idade, você fica muito fechada, mas aqui não. Aqui é excelente para fazer amigas, conversar”.

As rodas de conversa acontecem todas às quintas-feiras, no período da tarde, e são mediadas pela psicóloga Tatiana Samper, responsável pelo atendimento psicossocial prestado à comunidade, onde a profissional trabalha diversos temas do universo feminino com elas.

Tatiana Samper durante a roda de conversa com as idosas, na última quinta-feira (29) (Foto: Osmar Veiga)
Tatiana Samper durante a roda de conversa com as idosas, na última quinta-feira (29) (Foto: Osmar Veiga)

A psicóloga comenta que, muitas vezes, as mulheres chegam para o atendimento com dificuldade em falar sobre suas emoções, sentimento e vivências, então todo o acolhimento e apoio oferecido nas rodas de conversa ajudam elas a se conectarem com suas emoções. Por isso, o tema das conversas é trazido pelas próprias mulheres.

“A gente já falou de maternidade, sobre violência, já falamos sobre racismo. Ultimamente a gente tem falado sobre prazer feminino. A maioria delas são mulheres idosas, e com bastante vivência da maternidade”, destaca Tatiana.

Segundo a coordenadora da CUFA Campo Grande e da CUFA Mato Grosso do Sul, Letícia Polidório, de 36 anos, além do núcleo de atendimento psicossocial, a CUFA oferece oficinas de artesanatos e aos sábados à tarde, aulas de dança para as mulheres.

Eles também promovem, de segunda a sexta-feira, um projeto de reforço escolar de português, matemática e ciências para crianças e adolescentes, aulas de capoeira duas vezes na semana e judô três vezes na semana.

Os encontros acontecem semanalmente na CUFA, no Bairro São Conrado (Foto: Osmar Veiga)
Os encontros acontecem semanalmente na CUFA, no Bairro São Conrado (Foto: Osmar Veiga)

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