Depois da morte de dois filhos, mãe descobriu que enfrentaria o câncer
Letícia conta que desde 2013, vem lidando com diversas perdas e descobriu doença 1 ano após primogênito morrer
“Eu vou juntando os caquinhos. Todos os dias, eu tenho que levantar e dar um jeito”. Em 2013, Joaquim morreu com sete dias de vida. Em 2019, Thiago não sobreviveu a um acidente aos 24 anos. Sem tempo suficiente para lidar com a última perda, a mãe, Letícia Cristina dos Santos Afonso Matheus, descobriu no início de 2020, que ainda iria enfrentar o câncer de mama.
Sem dar receitas prontas sobre como sobreviver depois de tantas notícias ruins, Letícia não nega que o choro vai e volta todos os dias. Não tem respostas ou conta que agora vive sorrindo. Com sinceridade, a mãe de três filhos explica que ainda está descobrindo como dar seus próximos passos.
Voltando para 2013 - Letícia explica que já tinha dois filhos, Thiago e Lucas, quando engravidou de Joaquim. “Quando eu estava de quatro meses, descobrimos que ele tinha má-formação. Ficamos surpresos, mas achamos que daria tudo certo por conta da medicina avançada. Fiz o acompanhamento, mas ele não sobreviveu e morreu com sete dias de nascido”.
Na época, ela era cabeleireira e procurando formas de superar a morte de Joaquim, resolveu fazer faculdade de Serviço Social. “Eu queria ocupar minha cabeça, então, fiz uma boa rotina para lidar. Trabalhava no salão, tinha bastante clientes e amigos. Muita gente me falava coisas boas”, conta.
Foi seguindo a vida no salão e prestando serviços para ONGs, que Letícia conseguiu acreditar que seu caminho poderia seguir mais uma vez. Até que seu aniversário, em 2019, chegou.
“Meu aniversário caiu numa sexta-feira, dia 7 de junho. Nós íamos comemorar no dia 9. Mas na madrugada de sábado para domingo, meu filho morreu. Meu mundo caiu, Thiago era meu primeiro filho”, tenta resumir.
Ainda sem conseguir assimilar o modo como Thiago morreu, Letícia explica que havia falado com o filho poucas horas antes para combinar que iriam se ver no domingo. Após sair da casa de um tio, ele teria esquecido de levantar o pé de descanso da moto e o atrito com o solo fez com que perdesse o controle do veículo.
Entre pequenas pausas com a voz embargada pelo choro, a mãe tenta resumir que o cérebro consegue entender a necessidade de deixar alguns sentimentos para trás, mas que a saudade é cotidiana. “Sinto muita falta dele, era meu amigo. A gente passava muito tempo juntos”.
Quando tudo já parecia intenso demais, Letícia ainda recebeu a notícia de que seria avó no mesmo dia em que enterrou Thiago. Após encerrar a cerimônia, ela e familiares ficaram no cemitério por cerca de uma hora e, alguns minutos depois do aviso, a confirmação chegou.
“Era muita coisa para assimilar mesmo, mas Eduardo nasceu. É lindo, maravilhoso e a vida dele deu vida para a minha. No próximo domingo, faz dois anos e ele é a alegria da minha vida. Um pedaço do meu filho”, conta.
A recuperação - Depois de enterrar Thiago em junho de 2019, fevereiro de 2020 veio com a notícia do câncer. Ainda tentando se levantar depois da morte do primogênito, Letícia conta que as dores acabaram se misturando.
Cansada para conseguir focar no que acontecia durante aqueles meses, o tempo acabou parecendo congelado. “Quando eu descobri a doença, não consegui sentir as coisas direito. Não pude sofrer a dor do câncer, porque foi tão estranho, eu estava anestesiada”.
Hoje, depois de ter passado 2020 imersa em tratamentos e 2021 se recuperando, Letícia explica que todo esse tempo continua sendo superado com muita ajuda de si mesma, fé e de pessoas queridas.
“Eu peço muita força ao Espírito Santo e tenho amigos que oram por mim. Meu marido é uma rocha, ele sempre esteve aqui por mim. Tenho meu filho, meu neto. Fiquei por um bom tempo com medo de sair de casa, achando que podia morrer, que meu outro filho poderia sofrer com algo, mas com tratamento e ajuda, estou conseguindo”.
Além dos pensamentos, guardar os objetos favoritos de Thiago em uma gaveta e entrar em contato quando necessário tem sido parte de sua terapia. "Eu vou lá, vejo, choro e me lembro que preciso levantar. Preciso seguir. Então, isso vai mudando de pouco em pouco".
Durante o período de recuperação, ela conta que também aprendeu que algumas pessoas acabam mais prejudicando do que ajudando e entender isso é uma parte essencial. “Teve muita gente falando coisas ruins, me deixando magoada, mesmo querendo fazer o bem. Mas a gente aprende que cada um tem sua dor, que a gente não pode dar receita para as pessoas e que o bom senso precisa prevalecer”.
Com esperança em novas retomadas, 2022 é visto pela mãe como o ano da esperança. O ano em que a vida irá seguir sem interrupções, “eu sempre vivi o momento. Thiago também era assim. Eu sei que ele não quer me ver triste, então, estou voltando a sorrir mais, a aproveitar a vida e dar risada. A gente chora, mas limpa o rosto e voltar a rir de novo”.