Do bom dia à falta de seta, testamos o que é mito ou realidade na Capital
Pensando nos principais rótulos dos campo-grandenses, o Lado B foi para as ruas descobrir se tudo é verdade
Seja nas redes sociais ou pelas ruas, não há como negar que os três principais rótulos dados aos campo-grandenses são de que a população não gosta de dar bom dia, vive esquecendo da seta no trânsito e que se nega a usar chinelo em shopping. Por isso, comemorando os 123 anos da Capital, a equipe do Lado B resolveu tirar essas histórias a limpo e te contar o que é verdade e o que mais se parece com mentira.
Sem dúvidas, o rótulo que sai na frente quando chega o momento de caracterizar quem mora em Campo Grande está o de que receber um “bom dia” é quase milagre por aqui. Para ver se esse “mito” é realmente verdade, fomos para o Centro da Capital e testamos pelas ruas se a teoria faz sentido ou não.
Já adiantando o resultado, não recebemos nenhum bom dia de espontânea vontade durante nossa caminhada, que durou cerca de uma hora. Ainda assim, o cenário melhorou quando demos o primeiro passo com o cumprimento, tanto é que a maioria nos respondeu de volta.
E, para comprovar nosso experimento, confira o resumo da caminhada no vídeo:
Ao todo, de 14 pessoas, oito responderam nosso bom dia. Entre as sete que não devolveram o cumprimento, 6 continuaram sem dar atenção para a conversa, enquanto uma se rendeu e até explicou o motivo de não ter dado o bom dia.
Com as oito que nos responderam, os cumprimentos foram dos mais animados até alguns silenciosos, desconfiados. Tanto é que com metade da lista não é possível ouvir as respostas nas gravações de vídeo, mas o bom dia veio mesmo assim.
Campo-grandense, Cris Araújo, de 22 anos, foi a primeira da pesquisa e respondeu ao cumprimento desconfiada. Acreditando que, realmente, a Capital não é a cidade mais hospitaleira para as saudações, ela conta que não se recusa a responder, mas que também não sai distribuindo bom dia por aí.
Logo cedo, Celeste Belchior de Souza, 59 anos, foi a mais animada. Orgulhosa de dizer que sempre está com sorriso no rosto, garante que o cumprimento é quase automático.
Eu já gosto de dar bom dia! Sou de Corguinho, mas já me considero daqui. Mas nem todo mundo é assim. Eu trabalho com limpeza, tem gente que passa tropeçando em mim e parece que não me enxerga, não dá um bom dia, diz Celeste.
Sobre não ser correspondida, ela brinca que fica triste momentaneamente. “Eu fico triste porque a pessoa levanta de mau humor, não sei se é porque eu sou de bem com a vida, já entro nos lugares cumprimentando todo mundo”.
Assim como Celeste, o vendedor Claudio Borges de Queiroz, de 56 anos, nem pensou antes de responder ao nosso bom dia. “Eu dou bom dia sempre, às vezes até insisto em quem não me responde. É chato ser ignorado, até porque o bom dia faz seu dia ser melhor”, pontua.
Vendendo chipas e bebidas no Centro, ele relata que a maioria das pessoas parece não se importar com as saudações. Mesmo com o passar do tempo, ele completa que não consegue se acostumar e, justamente por isso, sempre tenta.
Já entre aqueles que não responderam, Glaciane Almeida Santos, de 35 anos, disse que estranha quando alguém aparece dando bom dia. “A gente cria uma resistência depois de ser ignorada, então nem sempre dou mesmo. Para mulher eu até falo às vezes, mas para homem não falo não”, ela comenta.
E a seta?
Além da fama de não dar bom dia, o campo-grandense também é conhecido como a pessoa que no trânsito dificilmente usa a seta. Seja para trocar de faixa, estacionar, fazer a conversão ou retorno, o condutor e a sinalização parecem não viver em harmonia. Na internet, essa fama antiga do campo-grandense é motivo de comentários e comparações que, em certos casos, chegam a ser engraçados.
A equipe também saiu às ruas para observar o trânsito e tirar a prova se a fama precede ou é brincadeira da galera. Em dias, rotas e horários diferentes, saímos dirigindo e observando de pertinho o comportamento dos condutores. Em outras ocasiões, como passageira mesmo, eu, Jéssica Fernandes, repórter do Lado B, fui fazendo as anotações.
No dia 22, por volta das 7h20, o percurso durou quarenta minutos partindo da zona Oeste em direção à região central de Campo Grande. Mesmo no horário de pico e com maior número de carros trafegando nas ruas, o número de condutores que "esqueceram" de ligar a seta não foi alarmante. Nas duas vezes, as situações foram semelhantes, pois ambos motoristas não usaram a seta ao fazer a conversão à esquerda. Já no período da tarde do mesmo dia, às 17h30, o cenário mudou.
Da Avenida Afonso Pena, esquina com a Rua Espírito Santo, ao início da Avenida Duque de Caxias, 10 condutores cometeram a infração. Esse número também foi levantado durante o horário de pico da cidade. O trajeto de um local ao outro durou 20 minutos. O motivo foi o mesmo nas dez vezes. O campo-grandense parece gostar de surpreender e simplesmente entrar na faixa da direita ou esquerda sem se importar se quem vem atrás terá tempo de reduzir a velocidade.
No mesmo trajeto, pela primeira vez, flagrei dois motociclistas que fizeram a conversão ‘do nada’. Já no dia 23, por volta das 8h50 às 9h20, o trajeto começou próximo ao Shopping Campo Grande. Na Avenida Afonso Pena, sentido Bairro Parque Residencial Maria Aparecida Pedrossian, o número chegou a 20, sendo que 15 deles dispensaram utilizar a seta para deslocar o carro do meio para a esquerda ou do meio para a direita.
No fim dos dias de observações em pontos diferentes, o padrão foi o mesmo. Os motoristas costumam dar seta na hora de fazer a conversão, porém são raros os que sinalizam a mudança de faixa. O "costume" de não ligar a seta é independente de modelo ou marcas específicas de carros. Dos populares aos de luxo, o dispositivo não funcionou nas mãos desses 32 condutores. No fim dos dois dias, a constatação foi que os únicos campo-grandenses que em hipótese alguma esquecem de dar a seta são aqueles que conduzem os ônibus coletivos.
De chinelo no shopping
Esse assunto já foi buxixado entre os leitores do Lado B, quando o repórter Samuel Isidoro, lá em 2017, decidiu passear de chinelo Shopping Campo Grande e filmar a reação das pessoas, especialmente de vendedores. O assunto que rendeu comentários e até fúria do marketing do estabelecimento nunca foi esquecido, e há quem diga que campo-grandense não sabe curtir o prazer e a liberdade que é usar um chinelinho no dia a dia.
Resolvemos caminhar por uma hora em dois shoppings da Capital: o mais antigo, que é o shopping Campo Grande, e o caçulinha, o Bosque dos Ipês.
Nos dois encontramos freguesia de chinelo, mas a conta cabe em 'uma mão'. O shopping mais novo tinha 4 pessoas de chinelo, sendo dois homens, uma mulher e uma adolescente. Somente os dois marmanjos toparam falar com a reportagem e ainda defender o uso do chinelo. "Shopping não é pra relaxar? Então aqui a gente tem que usar também", defendeu Leoni Fernandes, de 44 anos. Mas ele e o amigo não são campo-grandense, talvez, por isso, o chinelo faça tanto sentido. Já a mulher preferiu não falar sobre o uso do calçado, admitiu vergonha em aparecer.
Já no Campo Grande, no fim dia, com o dobro ou talvez triplo de clientes que o Bosque dos Ipês, encontramos somente duas pessoas de chinelo, durante uma hora de andança pelos corredores.
Com 25 anos, ela também preferiu se identificar, mas defende o chinelinho pelo shopping. "Moro aqui perto, então é bem prático. Acho que o chinelo pode combinar com tudo. Não vejo problema em usar", defendeu.
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