Do medo ao descobrir cardiopatia de filhos nasceu amizade de mães
Quando descobriu o diagnóstico da filha, Júlia viu o mundo desabar e encontrou esperança com Juliana
Desde que Henrique sobreviveu a todos os procedimentos para deixar a cardiopatia no passado, Juliana Ferreira Abes Xavier decidiu que nunca iria negar uma palavra de acolhimento para outras famílias que estivessem passando pelo mesmo. A partir desse desejo, surgiu a amizade com Júlia Rodrigues Silva Pavão Camargo, que há um ano recebeu o diagnóstico da filha e, vendo o mundo desabar, encontrou esperança com Juliana.
Neste mês, Henrique completou três anos e, pela primeira vez, as famílias conseguiram se reunir para celebrar o novo ciclo do filho de Juliana e registrar o momento tão esperado com a participação de Mariana, filha de Júlia.
“Júlia me encontrou pelo Instagram, há um ano atrás, quando teve o diagnóstico de cardiopatia na gestação de Mariana. Nos conhecemos pessoalmente, trocamos experiências, Lucas os auxiliou nos trâmites burocráticos do tratamento de Mariana em São Paulo, criamos um laço e uma amizade pelo coração dos nossos filhos”, conta Juliana.
Contando sobre como a relação das duas começou, Juliana explica que quando recebeu o diagnóstico de Henrique, também na gestação, não conhecia ninguém que também tivesse passado pela mesma situação. Aos 7 meses de gestação, um exame ecofetal apontou que Henrique tinha uma cardiopatia congênita em que havia transposição das grandes artérias.
Com as artérias trocadas, o sangue não iria circular no corpo e em poucas horas após o nascimento ele poderia não sobreviver. “Nós tivemos o diagnóstico e o mundo caiu sob os nossos pés, não sabíamos o que fazer e a primeira coisa foi se perguntar por que eu? Por que comigo? Depois desse desespero, meu marido, que é advogado, disse que não adiantava chorar, que precisávamos encontrar uma solução”.
Depois de muito pesquisar, a família encontrou o HCor, um hospital referência na cirurgia que Henrique precisava. Com a ansiedade sempre presente, Juliana teve Henrique no dia três de outubro de 2019.
Aos quatro dias de vida, Henrique passou por uma cirurgia de peito aberto, teve várias complicações no pós-operatório e permaneceu por 35 dias no hospital. Ao voltar para Campo Grande, ela e o marido começaram a pensar que o retorno não poderia ser algo banal, que eles precisavam fazer algo que também ajudasse outras pessoas.
Poucos dias depois do parto, Juliana publicou um vídeo em suas redes sociais contando sobre o diagnóstico, a doença e detalha que a repercussão foi muito bacana. “Muitas pessoas entraram em contato nos dando força, pessoas que tinham passado pela mesma situação e estavam com os filhos vivos. Então receber esse apoio foi uma surpresa muito boa para me deixar forte e passar por tudo o que passei”.
A partir do vídeo, algumas pessoas começaram a entrar em contato com Juliana pedindo por ajuda conforme o tempo passou. “Uma pessoa veio até mim dizendo que não sabia por onde começar e meu marido entrou na parte burocrática com liminar, ação. Essa pessoa indicou para outras, mas meu marido ficou receoso porque era difícil se envolver, reviver tudo aquilo. Mas falei que talvez isso fosse o algo maior que a gente queria fazer a partir da cardiopatia do Henrique”.
“Então Júlia apareceu no ano passado e foi uma grata surpresa. É muito bom saber que da dor nós estamos conseguindo ajudar outras pessoas a passarem por isso. Acabamos formando uma rede de famílias da cardiopatia. Contamos nossas histórias, trocamos nossas experiências”, detalha Juliana.
Acreditando no futuro
Em setembro do ano passado foi quando Júlia descobriu a cardiopatia de Mariana, diferente da de Henrique. “Foi horrível, um dos piores dias desse período, não conseguia nem mesmo dormir”, conta.
Também através de exames, a mãe recebeu a notícia de que Mariana apresentava uma alteração no coração em que o lado esquerdo do órgão não havia se desenvolvido. “Quando fui pesquisar no Google encontrei dizendo que essa era a pior cardiopatia e que não era compatível com a vida, fiquei desesperada”.
Como sugestão da irmã, que havia visto o vídeo de Juliana, Júlia entrou em contato pelo Instagram dizendo que não sabia o que fazer e que se a outra mão tinha alguma orientação. “Ela me passou o WhatsApp, tentou me acalmar, me ouviu e falou que o marido era advogado. Contou a história deles e disse que haviam colocado um propósito de ajudar todas as mães que cruzassem o caminho deles”, diz.
Júlia lembra que na primeira vez em que as duas se encontraram presencialmente já houve muito abraço, choro e esperança. “Depois que eles apareceram tudo foi dando certo. Eu sou professora e algumas mães descobriram, movimentaram uma campanha linda para a gente conseguir ficar em São Paulo e poder fazer todos os trâmites”.
Conforme o tempo passou, Júlia e Juliana se aproximaram ainda mais com cada experiência compartilhada e esperança a ser renovada. “Eu não perdia a fé porque olhava o Henrique e pensava que havia esperança, que a Mariana iria ficar bem”.
Em janeiro deste ano, Mariana nasceu no mesmo dia em que o pai de Júlia havia falecido anos atrás. Com os olhos azuis do familiar, a menina foi mesmo um milagre, como a mãe comenta.
“Foi muito apoio que tivemos. Minha mãe, irmã e sogra também não saíram do nosso lado”, completa.
Amizade e esperança
“Se eles não tivessem aparecido, se Juliana não tivesse me dado tantas palavras me acalmando e me dando esperança, nem sei como teria sido. Me lembro que Juliana tinha me contado sobre como outubro era um mês de festas e fiquei imaginando se nesse ano Mariana iria conseguir participar de tudo isso”, diz Júlia.
Para Júlia, a amizade também foi sendo construída a cada conversa, a cada aproximação. “Eles foram pessoas muito queridas, se envolveram com nossa vida, com a do Henrique e falo que nessa família de cardiopatia os filhos dos outros se tornam um pouco nossos também”.
E, hoje, guardar a foto em que as duas famílias se reuniram é mais uma celebração da vida.
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