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Comportamento

Entre a dor e a raiva, automutilação veio para Chay como válvula de escape

Mariana Lopes | 13/09/2017 08:04
Há um tempo, Chay fez as pazes com o próprio sorriso e resolveu aceitar sua história
Há um tempo, Chay fez as pazes com o próprio sorriso e resolveu aceitar sua história

As marcas nos pulsos mostram que a dor, muitas vezes, rasgou a alma. Aos 27 anos, a universitária Chay Coutinho aprendeu a falar sobre o assunto com naturalidade. A automutilação, que para ela funcionava como uma válvula de escape para a culpa e a raiva, deu lugar ao autoconhecimento e à autoaceitação.

O primeiro corte foi aos 15 anos, quando a depressão deu também os primeiros sinais. Mas foi aos 18, após a morte de um amigo e um relacionamento conturbado, que o médico deu o diagnóstico: "Transtorno de Personalidade Borderline". Foi aí que a depressão também veio com força total. "Eu não sei ao certo quando que me vi com depressão. Lembro vagamente de época que eu nem tomava banho e levantar da cama era um esforço enorme", recorda.

Toda a confusão patológica que perturbava os sentimentos de Chay sempre tinha um final, praticamente, já pré-estabelecido, a automutilação. Por muito tempo, assim foi a vida da estudante, entre altos e baixos que ela não conseguia esconder da família. "Minha mãe sempre soube, até porque alguns cortes eram na tentativa de suicídio. Outros eram automutilação mesmo, mas acabavam sendo mais profundos e eu tinha que ir ao médico, levar ponto, limpar, tomar vacina anti tétano", conta.

Chay também se lembra de quando a ficha dela caiu para a situação. "Eu tinha brigado aqui em casa, eu tava transtornada por alguma coisa, era tanta raiva... Raiva de mim, do mundo, sabe... Tranquei a porta e me cortei. E não parava de me cortar... Fui entender o que fiz quando minha mãe chegou com o pessoal do SAMU'.

No pulso, as marcas que Chay deixou no próprio corpo
No pulso, as marcas que Chay deixou no próprio corpo

Cada corte era feito por faca de cozinha ou lâmina de barbeador. "Era uma ação libertadora, me cortar para passar a dor na alma. Nas hora das crises, eu já tava sangrando por dentro. É um vazio tão imensurável que a única forma de me trazer pra realidade era sentindo a dor do corte", explica Chay.

O tempo e as cicatrizes trouxeram para a estudante a consciência de que a cura nada mais é do que ela aprender a lidar consigo mesma. "Hoje eu estou saindo de um quadro depressivo, que já é diferente do que era. Comecei terapias e a buscar ajuda aos 19, hoje as 27, ainda estou no processo de autoconhecimento. É essa a pegada. Autoconhecimento. Se aceitar".

Desabafos - Há menos de um ano, Chay começou a compartilhar nas redes sociais os desafios que enfrentava com a depressão. Em uma das postagens no Facebook, ela relatou sobre a automutilação e a surpresa foi positiva em relação à reação da família e dos amigos.

"Quando eu comecei a expor isso foi assustadoramente libertador. Eu vi um apoio de uma parte da família que eu jurava que iria me acusar, mas eu me senti bem acolhida. E desde o primeiro desabafo eu não parei mais. Tenho trocado a automutilação por desabafo em rede social", conta Chay.

Hoje, Chay ainda vive um processo que ela mesma avalia ser muito importante e cheio de aprendizado. 

"Aprendi a comemorar cada conquista diária, levantar e escovar o dente, tomar banho, lavar um copo, uma roupa, cuidar do cabelo, ir à padaria. Coisas que para quem vê de fora pode parecer simples, mas quando a única coisa que se quer é dormir para sempre, conseguir essas pequenas coisas é uma vitória.

Estou no penúltimo semestre da faculdade de licenciatura em Ciências Biológicas, e a cada disciplina que passo, comemoro, pois sei o quanto eu me superei. 

Aprendi que cada pessoa reage com a depressão de uma forma.

Aprendi a conhecer meus limites, a me dar tempos. Aprendi a permitir a queda, quando ela vem. É importante não tentar dar conta de tudo a todo tempo".

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