Há 32 anos vendo a dificuldade, Áurea ganhou centenas de amigos
Atendendo pessoas em condição de vulnerabilidade, ela aprendeu que ninguém está na rua porque quer
Nas ruas de Campo Grande, Áurea Domingues, de 58 anos, aprendeu que todos têm uma história para contar. Assistente social há 32 anos, sendo dez deles dedicados ao consultório da rua onde auxilia pessoas em condição de vulnerabilidade social.
Nesta semana, ela completou uma década de atuação no serviço e ganhou homenagem de amigos e colegas de profissão na segunda-feira (14). “Foi lindo demais, foi uma reunião convocada pela Sesau através do secretário de Saúde junto com o CRESS (Conselho Regional de Serviço Social) e fizeram uma surpresa pelos meus dez anos de consultório na rua”, conta.
Como assistente social, Áurea explica que ela e a equipe prestam diferentes serviços para aqueles que vivem nas ruas da Capital. “A gente faz de tudo na rua. Teste rápido de gravidez para as mulheres que desejam, anticoncepcional trimestral, teste para HIV, sífilis e hepatite B e C, curativos, cartão do SUS”, cita.
Trabalhar em contato com pessoas e prestar auxílio foram algumas das razões que a fizeram escolher a profissão. No trabalho e na vida, Áurea defende que todos devem ter acesso às políticas públicas. Nos últimos 32 anos de carreira, a assistente social passou por diferentes lugares, mas sempre com o mesmo compromisso e senso de ajudar ao próximo.
Em cada lugar, Áurea somou experiência e conhecimento que leva adiante. No consultório da rua, um dos maiores aprendizados foram ensinados através de pessoas que têm muito para compartilhar, mas poucas oportunidades de serem ouvidas.
Áurea ouve diariamente e garante que isso é essencial para o serviço. “São 10 anos de muito aprendizado com as próprias pessoas. Ninguém vai pra rua porque quer, todo mundo tem sua história. Temos o hábito de sentar com eles e ouvir a história, o fato de ouvirmos faz muita diferença”, afirma.
Das pessoas que conseguiu ver mudarem de vida e saírem das ruas, Áurea recorda a história de um homem que tem deficiência física e no começo não queria receber nem um auxílio da assistência social. Com ele, o trabalho começou do zero, exigiu emissão de documentos e a solicitação para receber o Loas.
Áurea o acompanhou em todas as etapas, datas para perícia. O agradecimento por isso veio através de um almoço que ela jamais esqueceu. “No dia que ele foi receber o recurso, ele me convidou. Primeiro ele falou: ‘Dona Áurea, é verdade que esse dinheiro é meu?’. Falei pra ele que ele nunca mais ia passar fome e frio. Ele me convidou pra almoçar, fez questão de pagar o almoço, depois fui com ele no camelódromo comprar um celular, era bem simples, mas era o mais bonito que ele achou”, recorda.
Antes de integrar a equipe do consultório na rua, ela atuou na Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) de Sidrolândia. Na Capital, a assistente social passou pelo ISMAC (Instituto Sul-Mato-Grossense para Cegos), Pestalozzi, AMA (Associação de Pais e Amigos do Autista), além de ter participado como coordenadora adjunta na implantação do bolsa escola, no projeto ‘Mudando para melhor Buriti Lagoa’ e como conselheira tutelar.
O convite para fazer parte do início do programa consultório na rua surgiu no ano em que Áurea estava no Hospital da Mulher no Bairro Moreninhas. Daqui três anos, ela irá se aposentar e dizer adeus ao trabalho que a acompanhou. Estar quase na reta final, segundo ela, provoca diversas sensações.
“É uma mistura de sentimentos porque trabalho desde os 10 anos de idade. Comecei a trabalhar muito nova sendo dona de casa pros meus pais trabalharem, tenho uma vontade grande de aposentar pra viajar e aproveitar a vida com saúde, mas ao mesmo tempo sei que vai fazer uma falta tremenda ser assistente social”, destaca.
Por enquanto, Áurea segue colocando dedicação e paixão que inspiraram vários profissionais da mesma área. “Tenho amigas que se tornaram assistente social vendo minha atuação e isso pra mim é muito gratificante”, afirma.
Entre essas amigas está Lesly Lidiane Ledezma Abastoflor, de 38 anos. A assistente social fala sobre a colega de trabalho e amiga que é inspiração.
“Eu não sabia o que ia fazer na faculdade, trabalhava numa agência de publicidade que a dona era amiga da Áurea. Fizemos um material para a campanha dela de conselheira tutelar e conheci a história dela. Me encantei, que mulher forte, decidida, empoderada e que me inspirou a escolher minha profissão. Hoje, quase 20 anos depois, tenho a sorte de trabalhar com ela no SUS”, comenta.
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