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Comportamento

Na prostituição portas abrem, mas quando trans quer viver no esporte…

Discussão sobre possível caso de transfobia em jogo entre atléticas da UFMS foi levada para o Twitter

Por Aletheya Alves | 26/06/2024 06:10
Mikaella saltando durante uma das partidas de vôlei em que disputou. (Foto: Arquivo pessoal)
Mikaella saltando durante uma das partidas de vôlei em que disputou. (Foto: Arquivo pessoal)

“A única coisa que a sociedade se abre é para a prostituição de pessoas trans, principalmente para mulheres trans”, resume a atleta e coordenadora da ATT/MS (Associação das Travestis e Transexuais de Mato Grosso do Sul), Mikaella Lima Lopes. Nos últimos dias, uma discussão sobre um suposto caso de transfobia durante jogo entre atléticas da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) tem sido ampliada nas redes sociais. E, durante o Mês do Orgulho LGBTQIAPN+, a reflexão é, mais uma vez, sobre como o preconceito continua bastante firme.

Apesar do caso estar sendo discutido nas redes sociais, a atleta transexual não aceitou conversar com o Lado B e mais informações sobre registros formais do crime não foram enviadas à reportagem. Mas, de toda forma, não é novidade que a transfobia e a LGBTfobia continuam presentes no cotidiano.

E, usando da discussão sobre o caso entre as atléticas, convidamos Mikaela (que já contou sua história como a 1ª mulher trans no vôlei de MS) para contextualizar o cenário depois de quase dez anos jogando em times femininos.

Antes disso, para contextualizar, a atlética de Computação da UFMS emitiu uma nota de repúdio após uma partida de vôlei contra a atlética de Odontologia no último domingo (23). Segundo o texto, houve um ato transfóbico contra uma das atletas através de comentários que não foram citados.

Por sua vez, a atlética de Odontologia divulgou uma nota de esclarecimento dizendo que são “contra a transfobia e qualquer tipo de atos discriminatórios contra qualquer pessoa” e que o técnico de seu time questionou a comissão organizadora sobre a atleta trans estar “regular perante o regulamento da competição”.

Após ser afirmado pelo time responsável pela atleta que tudo estava regular, o representante do time contrário retornou à comissão organizadora e teria dito que as atletas estavam “desconfortáveis pela situação”.

Sobre esse ponto, a atlética de Odontologia garantiu que a afirmação não era sobre jogar com uma atleta transexual. “E sim pelo fato de que o aquecimento pré-partida teria sido interrompido, sem previsão da resolução, e nossas atletas estavam começando a receber ofensivas advindas da torcida, que tinham informações completamente deturpadas do que estava ocorrendo”, é relatado na nota.

No fim das contas, o jogo realmente aconteceu e um dia após a partida é que as notas foram divulgadas. Enquanto isso, a discussão nas redes sociais já estava ocorrendo.

Comentários sobre a discussão nas redes sociais. (Foto: Reprodução)
Comentários sobre a discussão nas redes sociais. (Foto: Reprodução)

O que diz quem sente a experiência na pele 

Lá atrás, em 2016, Mikaella Lima Lopes contou sobre como depois de 15 anos jogando no time masculino, se tornou a primeira mulher transexual a jogar vôlei feminino estadual. “Na época da entrevista, o comitê olímpico que rege as regras do esporte de alto rendimento estava pensando em incluir pessoas trans. Hoje, já é possível uma pessoa trans no alto rendimento participar de jogos nacionais e temos como o único exemplo nacional a Tifanny Abreu na Superliga”.

A atleta explica que em Campo Grande e Mato Grosso do Sul há várias mulheres trans que estão em equipes disputando partidas, mas mediante comprovação dos níveis hormonais e retificação civil. “Então, temos que comprovar mesmo com o Estado nos reconhecendo como mulheres, temos que ter esse comprovatório para participarmos de jogos oficiais da federação”, explica.

Ainda assim, mesmo com todas as mudanças que ocorreram nos últimos anos, ela resume que a sensação é de que a sociedade continua deixando as pessoas transexuais de escanteio.

“O esporte é uma possibilidade de vida, de saúde para essas pessoas, mas o Estado não vê isso. Já foram feitos estudos no Canadá com mais de 300 atletas trans no alto rendimento e comprovado que não há nenhuma questão de vantagem. A vantagem que é falada é o puro e velho preconceito porque todas as pessoas são diferentes”.

Exemplificando, Mikaella relata que no vôlei, por exemplo, pessoas mais altas têm maior probabilidade de se saírem bem, já que a rede é mais alta e é necessário saltar. “Pessoas com baixa estatura têm mais vantagem para outros esportes, então nada no esporte real é justo (no sentido de igualdade exata), mas a inclusão deve ser feita para que essas mulheres trans possam jogar e participar”, diz.

Atleta já foi campeã em disputas e explica sobre o cenário em MS. (Foto: Arquivo pessoal)
Atleta já foi campeã em disputas e explica sobre o cenário em MS. (Foto: Arquivo pessoal)

Ampliando a discussão, a atleta destaca que as pessoas transexuais têm saído aos poucos da marginalização com muita luta e que todo espaço deveria ser de acolhimento. E locais como instituições de ensino precisam se mobilizar para isso.

“A academia, as instituições de ensino devem ser espaços de acolhimento para essas pessoas. Já foi o tempo de exclusão, de segregação e, hoje, todos os espaços precisam ser um ambiente de inclusão. Eu sou uma mulher trans e frequento qualquer espaço”, relata Mikaella.

Completando o relato, a atleta pontua que já passou do tempo de apenas orientar. Agora, é necessário reagir através da lei.

“Com a LGBTfobia enquadrada no crime de racismo, a gente não tem mais que explicar, temos que culpabilizar. Chega de dar capacitação, explicar, toda vez conversar sobre como é a tratativa porque mesmo assim as pessoas continuam reproduzindo o preconceito contra as pessoas trans. A gente tem que denunciar. Aconteceu qualquer caso de transfobia, denuncie. Se a delegacia, o local de denúncia não tomar as providências, procure a Defensoria Pública. É isso o que estamos orientando as pessoas trans”.

Em relação ao cenário estadual, a Fundesporte (Fundação de Desporto e Lazer de Mato Grosso do Sul) relatou que segue as normas internacionais estabelecidas pelo Comitê Olímpico Internacional e Comitê Paralímpico Internacional com diretrizes específicas para cada modalidade praticada. "Salientamos que a Fundesporte está aberta ao diálogo e à participação em debates sobre o assunto, visando garantir o acesso igualitário ao esporte".

Confira abaixo as notas emitidas por ambas as atléticas:

Campo Grande News - Conteúdo de Verdade
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