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Comportamento

Ninguém quer ser chefe e desafio é achar quem assuma a bronca

Nascidos no berço da era digital, novas gerações não querem mais saber de "trabalhar enquanto eles dormem"

Por Idaicy Solano | 01/05/2024 08:10
Ainda que em ambientes corporativos, jovens buscam novas formas de trabalho, que permitam mais flexibilidade e tempo livre (Foto: Alex Machado)
Ainda que em ambientes corporativos, jovens buscam novas formas de trabalho, que permitam mais flexibilidade e tempo livre (Foto: Alex Machado)

Se antes o papo era “trabalhe enquanto eles dormem”, a Geração Z, de nascidos entre 1993 e 2010, não quer mais saber de cargas horárias exaustivas e persegue uma rotina mais flexível, que permita ter mais qualidade de vida e tempo livre para investirem em seus interesses e relações pessoais.

No mercado, jovens buscam constantemente a autonomia, flexibilidade e melhores condições de trabalho, o que não combina com a característica de quem dedica a maior parte do tempo à vida profissional, afinal, em grandes empresas cargos altos vêm com grandes responsabilidades.

Da psicologia com especialidade em recursos humanos à estudiosos consultados pelo Lado B, maioria destaca que a nova geração nasceu no berço da era digital, que acabou ampliando os acessos e influenciando nas características comportamentais deste grupo, e por consequência, em sua relação com o mercado de trabalho como as gerações anteriores conheceram. É literalmente a frase "essa reunião poderia ter sido um e-mail".

Outro ponto é que o mercado se encontra em uma era em que a perspectiva de bem-estar no trabalho é um fator determinante para os profissionais na hora de tomar uma decisão em relação à carreira. Isso tudo é o que demonstra o estudo mais recente do Gympass, plataforma de bem-estar corporativo, divulgado em 2022.

A pesquisa revela que para mais de 80% dos brasileiros, o bem-estar no ambiente de trabalho é tão importante quanto o salário, e mais de 70% afirmou que chegaria a deixar o cargo em uma empresa que não priorizasse o bem-estar dos funcionários.

A modalidade de trabalho CLT, que tradicionalmente consiste em jornadas de trabalho presencial em horário comercial, em sua grande maioria com direito a uma folga por semana, também não é mais atraente. Outro ponto a ser observado, é o interesse crescente dos jovens em poder dedicar algum tempo para estudar assuntos relacionados aos seus interesses pessoais, e não apenas em cursos que acrescentem em sua vida profissional.

Ao observar os funcionários que ocupam cargos de liderança na empresa em que trabalha, Victor Hugo Afonso, 20, é categórico em afirmar que não deseja ser chefe.

"Pelo que eu vejo [dos líderes] é 24 horas dentro da empresa, trabalhando sem parar, é muita obrigação. No meu futuro profissional eu quero trabalhar seis horas por dia, e ganhar mais que um salário mínimo”, diz Victor Hugo.

Victor Hugo Afonso, 20, é categórico em afirmar que não deseja ser chefe.
Victor Hugo Afonso, 20, é categórico em afirmar que não deseja ser chefe.

Durante a pandemia da Covid-19, várias empresas se viram obrigadas a abrir mão da jornada tradicional e adotar o home office, modelo que o designer Leonardo Moreira Echeverria, 28, não abre mão. “Busco, principalmente, espaço para me desenvolver, mas respeitando o espaço da minha vida pessoal, que é bem importante para mim. Melhorou muito no pós-pandemia, onde o Home Office me ajudou muito a organizar minhas coisas e ter mais qualidade de vida no geral”, relata Leonardo.

Enquanto alguns buscam oportunidades mais flexíveis no mundo corporativo, outros encontram a solução para conquistar a autonomia tão desejada através do empreendedorismo. Este é o caso de Lucas da Silva Pereira, 25. Atualmente ele trabalha como sushi man, mas tem planos de abrir o próprio restaurante.

Ele relata que investiu em cursos para aprender a liderar e administrar equipes, e considera que o empreendedorismo é a chave para conquistar mais qualidade de vida e melhores condições financeiras. “No momento como a gente está nessa época que tudo corre, eu procuro correr um pouco agora para, lá na frente, ter um pouco mais de tempo e ficar mais tranquilo”, diz.

Este também é o desejo de Kelvin Guilherme Ronto. Com apenas 18 anos, ele sonha em abrir a própria barbearia, pois não abre mão de ter tempo livre para poder investir em seus interesses pessoais.

Campo Grande News - Conteúdo de Verdade

“CLT não é vida não. Mata o tempo, mata todo o estilo de vida. Você vai ficar sempre atrás de algum emprego, você só vai tentar sobreviver".

Em Campo Grande, o Programa Educação Empreendedora, uma iniciativa do Sebrae, é responsável por ensinar e iniciar jovens no mundo do empreendedorismo, por meio de cursos, palestras e oficinas

A era da sobrecarga já era...

Conforme explica a gestora estadual do programa Priscila Veloso, lá os jovens aprendem a desenvolver e construir seus projetos de vida, visando uma escolha mais assertiva para empreender em negócios ou em suas próprias carreiras, seja ela acadêmica ou funcionalismo público. “Nosso objetivo com isso é trazer para esses estudantes uma nova forma de ver o mundo”, pontua.

A psicóloga especialista em gestão de pessoas, Raíssa Ramos Ferreira Pedroli, 36, que atua há mais de 15 anos em Recursos Humanos, pontua que as novas gerações “fogem” dos antigos formatos de cargos de liderança, nos quais o líder precisava “dar seu sangue” pela empresa. A era da sobrecarga de trabalho pela promessa de crescimento ou de maiores salários, ficou para trás.

Segundo a profissional, a geração Z tem uma relação diferente das gerações anteriores com o trabalho. A principal mudança é que colocam mais ênfase na qualidade de vida do que no crescimento dentro da carreira. Eles buscam por trabalhos que proporcionem equilíbrio entre demandas pessoais e profissionais, por isso, preferem cargos remotos e horários flexíveis, que possibilitem mais tempo livre para usufruir de suas vidas pessoais.

“Por terem vivenciado momentos de grande transformação no mercado de trabalho como a pandemia de Covid 19 e serem mais esclarecidos em relação aos impactos na saúde mental provenientes do trabalho excessivo, não são uma geração que se ilude com as antigas promessas do mercado de trabalho”, destaca a psicóloga.

A psicóloga pontua que alguns dos itens que os jovens buscam atualmente são cargos com condições flexíveis, que permitam que os colaboradores continuem estudando, tenham a opção do trabalho remoto, flexibilidade para viagens, trocas culturais e uma rotina que permita acesso à academias e boas refeições.

“A nova geração estabeleceu limites claros para o mercado de trabalho, o que passa a ideia de "preguiça", mas acho que não se trata disso. Os moldes antigos estavam inadequados, adoecendo os trabalhadores.Trata-se de um momento de transformação cultural do mercado, em que a nova geração está demandando suas necessidades e forçando a mudança dos aspectos do mercado”, finaliza.

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