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Comportamento

Para quem é trans, até piquenique no parque é um ato de sobrevivência

Reunião descontraída teve muita conversa sobre vida, identidades e afeto

Aletheya Alves | 06/06/2022 08:37
Primeiro Piquenique Trans foi realizado neste domingo (5), no Parque das Nações Indígenas. (Foto: Aletheya Alves)
Primeiro Piquenique Trans foi realizado neste domingo (5), no Parque das Nações Indígenas. (Foto: Aletheya Alves)

Entre apresentações, sorrisos e abraços, transexuais, travestis e não binários fizeram, no domingo (5), uma clássica tarde no Parque das Nações Indígenas. Estenderam as toalhas no gramado, ocuparam o espaço e mostraram que até um piquenique pode ser lugar para cobrar direitos. O evento foi descontraído, para gerar discussões e distribuir afeto como uma das ações no Mês do Orgulho LGBTQIA+.

Enquanto muitas famílias e grupos de amigos aproveitam o final de semana para ir até o parque, quem não faz parte da normatividade sempre encontra uma barreira. É isso que a organizadora do 1º Piquenique Trans e a vencedora do Miss Trans MS 2022, Isabella Maria Lino de Araújo, de 26 anos, define como uma das principais motivações para o evento.

Mais do que ser apenas uma ação do mês em que bandeiras coloridas tomam conta da identidade visual de empresas, Isabella explica que reunir o público LGBTQIA+, destacando as pessoas trans, significa oferecer direitos que a população em geral nem costuma pensar sobre.

Nós queremos mostrar que os nossos corpos existem e que eles merecem respeito, isso também entre nós, porque sabemos que a violência também existe dentro do grupo. Esse coletivo que criamos representa que queremos ser vistas dentro do espaço público", diz Isabella.

Isabella detalha que, até o momento, não há uma organização bem estruturada entre o próprio público trans, faltando, inclusive, momentos de aproximação para que essas pessoas não se sintam sozinhas.

Roda de conversa destacou a importância do afeto e respeito pela comunidade trans. (Foto: Pedro Pilar)
Roda de conversa destacou a importância do afeto e respeito pela comunidade trans. (Foto: Pedro Pilar)

“Eu, por exemplo, achava que estava sozinha e através de experiências, em contato com outras pessoas, percebi que não. Nós precisamos entender nossas necessidades, nossos problemas e, principalmente, quais são as soluções que precisamos dar para essas pessoas. Estamos aqui hoje para também tentar fazer isso”, detalha.

E, para isso, quem foi até o piquenique conseguiu se apresentar com o nome e identidade que escolheu, recebeu abraços e descobriu que uma rede de contatos estava sendo desenvolvida ali mesmo.

Isabella e Emy contam sobre a importância de ações que reúnam o público. (Foto: Pedro Pilar)
Isabella e Emy contam sobre a importância de ações que reúnam o público. (Foto: Pedro Pilar)

Estudante de Artes Cênicas e produtora cultural, Emy Mateus Santos, de 22 anos, destacou que estar no Parque das Nações Indígenas por si só já foi um ato político. “Nossa ideia é trazer o comum, um dia de domingo no parque. As famílias estão aqui, outras pessoas estão aqui e também queremos uma oportunidade de se ver, de se entender. Creio que esse trabalho de base precisa estar nas pequenas coisas”, diz.

De acordo com Emy, a falta de respeito por coisas tão básicas, como o uso do nome social, segue intensa e reunir pessoas da comunidade para debater sobre tais temas é cada vez mais urgente.

Não precisamos só de atitudes grandiosas para mudarmos as coisas, os mínimos detalhes são essenciais. É a questão de olhar no olho e perguntar ‘como você está?’. Muitas das nossas e dos nossos são distanciados desse tratamento e um exemplo é a questão do nome, ter esse respeito que muitas vezes a gente não recebe", explica Emy.

E para a estudante, o afeto exerce um papel importante na vida da comunidade trans. Por isso, ela conta que poder se reunir em um espaço público, ganhar e dar abraços e mostrar que o amor é necessário não é algo que faz parte apenas deste mês, mas de uma vida toda.

“Ser travesti e preta no Brasil é lutar por um País melhor, lutar por mim e por tantas outras. Penso muito no ato político, nosso corpo por si só é algo político, não preciso estar falando para militar. Chegar aqui, de cabeça erguida, é algo muito importante. A gente vê que isso movimenta, que traz outras pessoas que sentem o mesmo”, completa.

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