Pensar só no filho não funciona, mães ‘atípicas’ precisam de cuidados
Centro de apoio a autistas e mães foi criado na Capital com objetivo de tirar famílias do segundo plano
“Você pode ter condições de um atendimento particular para seu filho, mas não vai ter o acolhimento para as mães”, resume a pedagoga Eliane dos Santos Silva. Há poucos meses, ela abraçou a ideia de integrar o Centro de apoio a autistas e mães em Campo Grande por saber que não adianta pensar só nos filhos, ainda mais quando se tem uma família atípica. Em suas palavras, é preciso apoiar e cuidar das mães e responsáveis tanto quanto das crianças.
Há cinco anos, Davi nasceu e aos 10 meses de idade alguns sinais começaram a ser percebidos por Eliane. Conforme a falta de contato visual, atraso de fala e movimentos repetitivos se tornaram mais frequentes, a pedagoga especializada em educação especial imaginou que o filho teria TEA (transtorno do espectro autista).
Após dez sessões com uma neuropsicóloga, o diagnóstico veio e, mesmo imaginando o diagnóstico, ela narra que seu mundo balançou. “Eu sabia, mas estava torcendo para receber uma resposta diferente”.
Destacando que ter uma rede de apoio faz toda diferença, Eliane explica que ser uma mãe atípica muda toda a rotina que é imaginada. Em seu caso, Davi foi um filho planejado e tudo precisou ser reestruturado.
Com a rotina de acompanhamentos médicos e mudanças no cotidiano, ela defende que a vida vai mostrando que não basta cuidar e focar apenas no tratamento dos filhos. E é aqui que entrou o Centro de apoio, fundado há alguns meses.
A ideia da criação do centro não foi de Eliane, mas ela se tornou vice-presidente da organização. “Você não vai ter um momento em que as mães vão conversar em uma clínica particular, dividir experiências, trocar choro, sorrisos e abraços, trocar aquele olhar com lágrima para cair. Esse espaço a gente não tem no particular e é o que já estamos tendo no Centro”.
Desde atendimento psicológico até rodas de conversa, tudo vem se encaixando na construção do Centro. “Mães de TEA precisam passar por psicólogo porque é uma carga pesada. Precisamos de acolhimento, de amparo. As mães precisam disso porque você olha para sua vida, para sua casa e sabe que isso nunca mais vai ser igual”, descreve.
Exemplificando, ela comenta que mães vivem em crise e não sabem como lidar mesmo quando têm uma rede de apoio familiar.
Confirmando o depoimento da pedagoga, Ketrin Carolina Martins de Araújo narra que desde o processo de luto após o diagnóstico até a caminhada em busca de ajuda, tudo é bastante complexo. Isso porque nem mesmo o atendimento completo para os filhos é de fácil acesso na saúde pública.
Tem um estudo que diz que pais de crianças com TEA se assimilam com um soldado em batalha porque é isso. A gente tem o psicológico muito abalado e mesmo assim precisamos nos erguer para a próxima luta, seja no médico, seja contra preconceito que sofremos, diz Ketrin.
Mãe de três, ela relata que Pyetro, de 7 anos, e Theo, de 5 anos, foram diagnosticados e cada laudo mostrou como ajuda não era algo supérfluo. “Eu entrei em uma fase de negação porque não queria acreditar. Já é difícil ter um diagnóstico, imagine dois”.
Em sua história, o que aliviou os dias foi aceitar e começar a procurar por auxílio. “Vem a fase boa e eu recebi ajuda com os meninos. Por um tempo, o pessoal do Juliano Varela ajudou com remédios, atendimento, mas não foi suficiente e desde que conheci a Janaína e a Eliane mudou muita coisa”, diz.
“Elas me acolhem como mãe e lá (no Centro), eu não me sinto diferente porque quem participa se preocupa com os mesmos problemas de integração na escola, de medo dos nossos filhos não conseguirem terapia”. No caso de Ketrin, a ajuda também veio com cestas básicas e apoio para transporte com as crianças. Mas, o diferencial é realmente um ambiente saudável para ela.
Centro de apoio a autistas e mães
Na presidência do Centro, a professora Janaina Gonçalves dos Santos explica que começou a ter contato com crianças do espectro autista logo quando passou a ministrar aulas de Arte. Mas, há três anos viu o número de alunos diagnosticados aumentar e ideias sobre desenvolver ações específicas começaram a tomar força.
Inicialmente, uma feira para integrar mães “atípicas” e “típicas” foi criada em sua garagem com objetivo de gerar renda e um espaço de convívio. Em conversas com colegas, amigos e conhecidos, novas ações passaram a ser projetadas até que tomaram forma do Centro como a melhor escolha.
“Depois de muita conversa, eu falei que queria que as mães tivessem informação, apoio e que isso se estendesse aos filhos. Em 30 dias, o sonho foi passando de pessoa para pessoa até conseguirmos apoio”, comenta a professora.
Hoje, o Centro ainda está em processo de desenvolvimento, mas ativo com atendimento às mães e alguns filhos. “Começamos com reuniões mensais e decidimos que primeiro vamos cuidar das mães para que elas consigam cuidar dos filhos. Conseguimos parcerias com otorrino, fono, psicólogo, assistente social, enfim, pessoas que podem oferecer o atendimento”.
Para participar, o atendimento é gratuito, mas as mães precisam se integrar e frequentar as reuniões. Dessa forma, conforme as vagas forem surgindo, os filhos também terão acesso aos tratamentos.
Quem se interessar pode entrar em contato pelo número (67) 67 99635-7070.
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