Placa é apelo para ninguém destruir “santuário” que restou da mãe
Em vida, Amália cuidou com muito carinho de jardim em canteiro, que foi cortado sem dó nem piedade
Placa com a frase “Por favor, não corta as plantas da minha mãe”, colocada em uma árvore, no canteiro que divide a Rua dos Crisântemos, no Lar do Trabalhador, é um último apelo de Rosângela Lima Marega, para proteger o jardim que a mãe, Amália de Jesus Gomes, tanto amou e cuidou enquanto ainda estava viva.
A história é contada na varanda da casa onde a mulher viveu, por mais de 40 anos, por Tânia de Jesus Lima Rondão, 62, que relata que a irmã ficou “furiosa” ao chegar da Itália para enterrar a mãe e encontrar o canteiro com as plantas de dona Amália “dilacerado”.
Quando Amália estava viva, ela e o marido, João, cuidavam do canteiro com carinho. O hábito era de plantar, podar os arbustos de pingo de ouro, limpar as folhas que caíam na calçada, e, o mais importante, manter tudo vivo e verde.
A casa também era cheia de samambaias, mas após seu falecimento, a varanda perdeu o verde, pois a dona das plantas não está mais ali para cuidar.
Minha irmã teve um excesso de raiva, porque ela achou um desrespeito com a minha mãe, porque eles sabiam que minha mãe tinha falecido, e que minha mãe tinha carinho por ali. Aí ela [Rosângela] ficou muito enfurecida e botou a placa. Ali era como se fosse uma terapia deles. Para ela [Amália] era como se fosse um santuário”, explica Tânia.
Tânia conta que a mãe sempre gostou muito de jardinagem, e como não tinha espaço para fazer um jardim dentro de casa, ela começou a cuidar do canteiro. Antes mesmo de a rua ser asfaltada e de a maioria das casas vizinhas ser construída, Amália já tinha o costume de utilizar a área desocupada para o cultivo de plantas, e até mesmo de alguns alimentos, conforme relata Tânia.
“O jardim é uma coisa que ela cuidou por anos. Quando nós mudamos aqui, aqui era um campo de futebol. Minha mãe já cultivava do outro lado da rua feijão, abóbora, milho”, relembra Tânia.
Natural da Bahia, Amália viveu alguns anos no Rio de Janeiro com o primeiro marido e os filhos, até vir para Campo Grande em 1973, e morou naquela casa até falecer. Tânia relata que a mãe se separou de seu pai, pois ele não se adaptou à capital sul-mato-grossense, pois era “boêmio e acostumado com cidade grande”.
Ele voltou para a capital carioca, e Amália permaneceu aqui com os sete filhos. Ela trabalhou durante anos como prestadora de serviços gerais no Hospital Militar, onde conheceu o segundo marido, João, ex-sargento e enfermeiro do hospital.
Amália faleceu no dia 30 de janeiro deste ano, vítima de um AVC (Acidente Vascular Cerebral). Dezoito dias depois, João também morreu. Eles viveram juntos durante 50 anos e tiveram um relacionamento regado de amor, afeto e respeito, conforme relata Tânia. Apesar de não ter laços de sangue, ela o considerava seu pai, pois foi ele quem ajudou Amália a criar os filhos.
“Ele tinha muitas doenças, e eles eram um casal muito junto, onde um ia, o outro ia. Então, com o falecimento dela e a doença que ele tinha, ele não teve força pra aguentar. Partiu de saudades dela mesmo”, conta Tânia.
Tânia, emocionada ao falar sobre a mãe, compartilhou que Amália amava Carnaval e desfilou por vários anos, durante a juventude, pela escola Unidos da Vila Carvalho. Durante as sextas-feiras santas, a mãe adorava cozinhar moqueca de peixe, bastante regada em azeite de dendê, e nunca desapegava de suas tradições.
Durante os 40 anos que morou no Lar do Trabalhador, ajudou a “criar” muitas crianças do bairro. Inclusive, quando a reportagem parou para tentar descobrir de onde era a placa no canteiro, não demorou muito para apontarem para a casa de Amália.
Os desavisados chegaram a comentar que sentiram a ausência da idosa, enquanto outros conhecidos informaram, com tristeza, que a dona das plantas havia falecido.
Amália também era muito religiosa e devota de Nossa Senhora Aparecida. A idosa partiu sem ter a oportunidade de realizar um último sonho: visitar o túmulo da Irmã Dulce, no interior da Capela das Relíquias, em Salvador. Apaixonada também por animais, antes de morrer, ela pediu que a filha cuidasse de Guta, sua cachorrinha, que ficou de herança para Tânia.
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