ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
JULHO, SEGUNDA  22    CAMPO GRANDE 21º

Comportamento

Se não fosse cunhada cupido, Maciel talvez nem tivesse livro e família

Uma das livrarias mais tradicionais da Capital, Maciel tem se modernizado para não perder clientes de vista

Lucas Mamédio | 03/03/2020 07:03
Maciel vende livros há mais de 40 anos em Campo Grande (Foto: Paulo Francis)
Maciel vende livros há mais de 40 anos em Campo Grande (Foto: Paulo Francis)

Existe um dilema que permeia todo empreendimento familiar: o de quem irá tocar o negócio depois que o fundador não mais estiver presente no dia a dia da empresa. Será que os filhos vão dar conta? Vão cuidar com mesmo zelo e carinho?

Bom, quanto a isso, Itamar Maciel, dono de uma das livrarias mais tradicionais do centro de Campo Grande, a Maciel Livros, pode ficar tranquilo. Isso porque seus dois filhos de nomes bíblicos, Samuel e Gabriel, já praticamente tomaram conta do negócio. Sem falar nos outros parentes, também funcionários. Já chegamos lá.

A história da Maciel é um misto de paixão por livros, empreendedorismo e união familiar. Itamar, o fundador, por si só já tem uma bela história de vida, de superação e perseverança. O mais impressionante foi conseguir reunir a seu redor, histórias tão belas quanto a dele.

Itamar é natural de Campo Grande mesmo e de família numerosa, com 10 irmãos. Aos oito anos de idade já entrou para o mundo do trabalho como engraxate, aos nove vendendo jornal. Ainda muito novo, em 1975, Maciel teve sua primeira experiência trabalhando em banca de jornal.

Só 10 anos depois, em 1985, o jovem empreendedor comprou sua própria banca, quando ainda conciliava com um cargo no Serviço Federal de Processamento de Dados. Depois de um rápido crescimento e aquisição de novas bancas, Maciel abriu sua primeira loja, em 1991, nos moldes da Maciel Livros atualmente.

Samuel, a exemplo do pai, começou na venda livros durante a adolescência (Foto: Marcos Maluf)
Samuel, a exemplo do pai, começou na venda livros durante a adolescência (Foto: Marcos Maluf)

O empresário já vem terceirizando, digamos assim, várias responsabilidades para os filhos, principalmente Samuel Duarte Maciel, o mais velho, de 24 anos. Inclusive é ele quem recebe o Lado B na livraria, porque Itamar está, naquele momento, resolvendo burocracias de uma feira de livros em um shopping de Campo Grande.

É repetindo a palavra “amigo” no começo de cada frase que Samuel, formado em administração, conta a própria história, resultado inseparável da história do pai. Desde que se conhece por gente, o primogênito já corria pelos corredores da livraria.

A verve empreendedora do pai, claramente passou para filho. Aos 15 anos de idade, com a Maciel Livros já consolidada, Samuel alugou uma banca do pai e fez com que em pouco tempo ela lucrasse o dobro do que estava lucrando antes.

“Eu pagava R$2 mil de aluguel pra ele, era uma relação profissional mesmo. Dois anos depois ele vendeu a banca pelo dobro do preço. Foi então que levantei uma segunda banca, ajeitei ela também, aí ele disse que era hora de eu voltar pra cá ajudar na loja mesmo”, recorda Samuel.

Existe um “Q” de fatalismo na existência de Samuel e nessa composição de funcionários da livraria. Sua mãe, Cleide Maria de Souza Duarte Rezende, conheceu o pai por meio da tia de Samuel, a irmã de Cleide, Angelita Duarte, que começou a trabalhar na loja logo no início, em 1993. Foi Angelita quem apresentou Cleide a Maciel, quando ela ainda trabalhava em uma padaria no centro de Campo Grande.

“Maciel foi meu primeiro e único namorado. Ficamos juntos um ano antes de nos casarmos. Quando minha irmã transmitiu o convite dele a mim, não tinha interesse algum, fui gostar dele depois”, explica Cleide

Quando pergunto qual a função dela dentro da livraria, ela diz que presta “assistência pros meninos”, se referindo aos filhos e já reforçando a importância deles para o bom funcionamento do estabelecimento.

“Pra você ter uma ideia, toda essa parte de sistematização interna aqui, de inserção dos nossos títulos nos sites de venda virtual, foi coisa dos meninos”, diz Cleide, deixando transparecer o orgulho de mãe, mais que justo.

Angelita está na Maciel Livros desde 1993 (Foto: Marcos Maluf)
Angelita está na Maciel Livros desde 1993 (Foto: Marcos Maluf)
Cleide foi apresentada a Maciel pela irmã (Foto: Marcos Maluf)
Cleide foi apresentada a Maciel pela irmã (Foto: Marcos Maluf)

Nesse labirinto familiar fomos conhecer o cúpido dessa relação entre Maciel e Cleide, a irmã de Cleide, Angelita. Subgerente da Maciel Livros, Angelita é funcionária de Maciel desde 1993, como já dissemos, mesmo antes Cleide estar na vida dele.

“Eu era cliente já do Maciel quando ele me chamou pra trabalhar aqui. Desde então só trabalhei aqui, parei apenas um ano pra ter minha filha”, explica a espirituosa Angelita.

Angelita comentou de forma despretensiosa que a mãe delas trabalhava ali também. “Desculpe, quem, a mãe de vocês?”

“Sim, ela veio pra cá em 2007, já está com 13 anos de carteira assinada”, reponde Angelita. Dona Elena Duarte, veja só, com seus mais de 80 anos agora, teve como seu primeiro o emprego de carteira assinada o cargo no estabelecimento do genro. Antes, passou a vida em casa e fazendo bicos de doméstica.

“Foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida, ter uma ocupação, uma rotina. No começo foi difícil, os jovens chegavam aqui perguntando desses mangás (apontando para uma prateleira de mangás), mas agora já sei quase tudo, os nomes, os estilos”, conta orgulhosamente dona Elena, chamada de “vozinha” por Maciel.

Conseguimos, claro, falar diretamente com Maciel, que apenas confirmou uma história que nasce com dele, mas não foi escrita apenas por ele. “Sem minha família, acho que tudo seria diferente, não sei se chegaria onde estou”.

Além disso, unir ofício e paixão deixa tudo mais fácil. “O livro é um negócio que te toma, é muito prazeroso trabalhar com esse produto, isso explica porque mexo com ele há mais de 40 anos”.

Dona Elena, carinhosamente chamada de "vozinha" diz que estar na Maciel é a melhor coisa de sua vida (Foto: Marcos Maluf)
Dona Elena, carinhosamente chamada de "vozinha" diz que estar na Maciel é a melhor coisa de sua vida (Foto: Marcos Maluf)
São mais de 180 mil livros de estoque (Foto: Marcos Maluf)
São mais de 180 mil livros de estoque (Foto: Marcos Maluf)
Maciel não sofreu tanto com o advento dos e-books (Foto: Marcos Maluf)
Maciel não sofreu tanto com o advento dos e-books (Foto: Marcos Maluf)

Com incrível acervo de cerca de 180 mil livros, a Maciel Livros passou por alguns momentos de incerteza quanto a natureza do negócio, principalmente com o advento dos e-books, “novidade” que se mostrou inofensiva.

“Sempre rola uma apreensão, mas descobrimos que existe um público fiel, que gosta de papel e que não nos abandonou”, diz Samuel.

O gerente também fala um pouco sobre a mudança de perfil da loja. Produtos como CDs, DVDs e vinis foram, de certa forma, colocados de segundo plano. Todos os CDs estão pela metade preço, por exemplo.

“Nosso negócio está mudando, estamos investindo bastante em livros novos, livros infantis e também na participação em licitações”, relata Samuel, demonstrando claramente um tom modernizador no modelo de negócio da Maciel Livros.

Seja livros usados ou novos, a Maciel Livros é uma espécie de símbolo de resistência do comércio segmentado no centro de Campo Grande. O mais bonito é que essa resistência é baseada em pilares muito nobres, que são os laços familiares. Passando por uma etapa de transição, a Maciel Livros pretende lutar enquanto viver, luta que está ganhando.

Curta o Lado B no Facebook e no Instagram. Tem uma pauta bacana para sugerir? Mande pelas redes sociais, e-mail: ladob@news.com.br ou no Direto das Ruas através do WhatsApp do Campo Grande News (67) 99669-9563 (chame agora mesmo).

Nos siga no Google Notícias