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Comportamento

Sem o olhar de mãe de santo famosa, família quer manter tradição de São João

Dona Janete morreu há sete dias, com 74 anos, deixando uma história na cidade de Corumbá

Thailla Torres | 17/01/2020 07:48
Dona Janete no preparo do ritual do banho de São João. (Foto: Anderson Gallo/Arquivo Diário Corumbaense)
Dona Janete no preparo do ritual do banho de São João. (Foto: Anderson Gallo/Arquivo Diário Corumbaense)

Famosa líder religiosa da umbanda pelas ruas de Corumbá, a Ialorixá Janete Tinoco se despediu da vida há sete dias. Com 74 anos, 42 deles dedicados à fé e ao tradicional banho de São João, ela elucidava a religião de matriz africana como ninguém, “quebrando no meio até religiosos mais intolerantes”, lembra uma das filhas.

“Cresci vendo minha mãe no terreiro, eu e minha filha, e todos sempre respeitaram ela. Ela era uma pessoa do diálogo, gostava de explicar tudo direitinho e era rígida com a religião, ou seja, tinha de haver respeito”, lembra a filha Kelly Regina Tinoco Barbosa, de 42 anos.

Ela é quem promete manter o compromisso que Janete não dispensava no mês de junho. Kelly ainda não sabe como vai ser, mas garante preparar o andor para levar São João às águas do rio Paraguai, ponto da celebração que há anos faz parte do calendário sul-mato-grossense. “Confesso que ainda não sei como farei, mas dei minha palavra a ela e essa missão será cumprida todos os anos. Mamãe tinha muito amor a essa tradição e foi o que salvou uma das minhas irmãs”.

Kelly ao lado de Janete e sua filha. (Foto: Anderson Gallo/Arquivo Diário Corumbaense)
Kelly ao lado de Janete e sua filha. (Foto: Anderson Gallo/Arquivo Diário Corumbaense)

O compromisso de Janete com São João iniciou depois que sua mãe sugeriu uma promessa ao santo. “Minha irmã ficou doente, e ela pediu ao santo que ela ficasse boa. E depois que ela ficou bem, mãe não quis deixar de lado o compromisso e prometeu manter a tradição até o fim da vida”.

Não deu outra. Janete não só manteve a tradição como virou famosa pela cidade. No mês de junho, era comum jornalistas e estudiosos na porta de casa para saber mais da tradição e acompanhar os detalhes que, segundo a filha, eram feitos com muito carinho. “Ela começava cedo, prepara São João, decorava a casa, havia até jantar especial”.

Quem durante anos acompanhou de mãos dadas a mãe de santo nesse compromisso foi o marido Malanias Barbosa, que faleceu aos 84 anos, em 2018, vítima de câncer. À época, mesmo com a perda e tristeza do luto no mesmo mês de São João, Janete disse que o compromisso seria cumprido.

Janete partiu há sete dias, aos 74 anos. (Foto: Anderson Gallo/Arquivo Diário Corumbaense)
Janete partiu há sete dias, aos 74 anos. (Foto: Anderson Gallo/Arquivo Diário Corumbaense)

O famoso banho – Depois de inúmeros detalhes, com direito a cumbuca especial para o banho, Janete e outras dezenas de festeiros de Corumbá desciam as ladeiras para o tradicional banho de São João. Apesar da fama de Santo Antônio como casamenteiro, pessoas também depositam a fé, todos os anos, em São João. Alguns arriscam a passar debaixo dos andores para fazer pedidos para um bom relacionamento.

Em junho, Kelly acredita que a festa não terá o mesmo brilho, mas fará de tudo para levar os encantos de Janete até a água. “Vou com ela no meu coração e ela me guiará em cada passo. Infelizmente perdi mais que uma mãe, foi embora uma amiga, confidente e professora insubstituível”.

Janete deixou oito filhos e muitos netos, que Kelly não conseguiu contar. Ela partiu após um período internada por causa da fratura de um fêmur. O quadro de saúde se agravou diante de um infarto, contou a filha ao Lado B.

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