Cantor do hit "Do Brasil à Argentina" hoje vive de cortar cabelo em salão chique
“Eu não fico nem um minuto mais nesse País. Vou buscar alguém, alguém pra me fazer, feliz...” A música estourou e levou ao auge a dupla sertaneja Airo e Ruan. O ano era 2003, quando os sul-mato-grossenses da região de Camapuã foram lançados para todo país. Hoje, 11 anos depois, Ruan Benitez, trabalha como cabeleireiro em um salão chique de Campo Grande e prepara um CD com o novo parceiro na música. Em um década, o cantor viu o sucesso, o amigo dar as costas, a volta e o fim, de vez da dupla com a morte de Airo.
Ruan trabalha no Centro de Beleza e Fisioterapia Estética D’lamare, no bairro Jardim dos Estados. Entre um cabelo e outro, conversou com o Lado B. Parte dos clientes que atende perguntam se não o conhece de algum lugar. Com o rosto ainda familiar, ele acaba por contar da trajetória na música, regravada por famosos como Jorge e Mateus.
“Às vezes eu estou atendendo e me perguntam parece que eu te conheço de algum lugar? E eu falo, daí eles dizem: pô, mas é você? Fui em tanto show seu”, conta.
A profissão de cabeleireiro não foi consequência do fim da dupla, muito pelo contrário. Quando nem imaginava que podia ganhar dinheiro cantando, Ruan tinha montado um salão em casa, no município de Camapuã. “Em 95 eu montei, cortava cabelo em casa. Aquela época a música ainda era complicada. No começo eu via mais possibilidade de ganhar dinheiro com cabelo, depois do sucesso a possibilidade estava na música”, diz.
Ele e Airo sempre foram amigos e começaram a cantar juntos quando Ruan tinha 17 anos, em princípio, da escola e na igreja da cidade. Com o tempo foram descobrindo que podiam montar uma dupla. Em 1997 veio a gravação do primeiro cd.
“Ele sempre compôs e eu também. Em 2003 lançamos a música Brasil e Argentina e deu aquele boom na vida da gente. Eu já trabalhava com cabelo, a música deu resultado, então viemos embora”, recorda.
Foram sete anos afastado dos salões de beleza. De Camapuã para Campo Grande e daqui para São Paulo. Com o apoio de grandes nomes da música sertaneja, eles venderam tudo aqui e se instalaram na região Sudeste. Onde de fato, a carreira deslanchou.
Em 10 anos direto com Airo, Ruan teve contato com artistas de peso, Bruno e Marrone, Edson e Hudson, Felipe e Falcão, entre tantos. Boa parte deles gravaram composições de Airo.
“Quando ele pegou o dinheiro das parcerias, resolveu parar a dupla. Ele só estava compondo, não queria mais cantar. Para mim, desabou. Por um ano ainda eu cantei sozinho porque já tinha a agenda de shows”, descreve Ruan.
O fim mesmo chegou em 2007. Airo abandonou os palcos e passou a desfrutar apenas das parcerias. “Nosso sonho era um só, quando começou a cantar, cantávamos em igreja. Ele não bebia, a gente chorou junto, fez planos juntos. Quando ele fez parcerias, quando pegou o dinheiro, subiu à cabeça. Foram quatro anos gastando tudo e só bebendo”, fala sobre a relação com Airo.
Cumprida a agenda de shows, Ruan voltou a Campo Grande. “Eu sempre fui um cara muito seguro e pé no chão. Vim pra cá, só que fiquei sem norte, não tinha dupla, não tinha salão”, resume. Em 2008, formou uma nova dupla com o músico Edson, integrante do grupo Zíngaro e juntos lançaram CD e DVD. Quando o parceiro também quis parar, ele recebeu a proposta de Airo, para voltarem a cantar juntos.
“Ele me procurou, muito arrependido, pedindo perdão. Se fosse para gravar outro CD, ia ser comigo. Eu voltei com o Airo em 2010 e três meses depois ele morreu”, lembra. No atestado de óbito, segundo Ruan, a causa da morte foi insuficiência respiratória, mas o que de fato matou o compositor foi a bebida.
“Foi de tanto beber. Ele já tinha sido internado 6, 7 vezes. Ele mesmo provocou a morte. Apesar do que aconteceu, de ele ter me abandonado na melhor fase, a gente voltou pela paixão à música. E eu fiquei bem chateado, você aposta de novo, de repente vem tudo por água abaixo”, comenta.
À época da volta, Ruan já trabalhava no salão onde está atualmente. Acaso ou peça do destino, ele não chegou a abandonar a profissão. “Na verdade não que eu estava esperando pela morte do Airo, mas ele não tinha parado com isso e se ele continuasse, ia morrer. Não teve como evitar o choque, eu perdi um irmão. Tinha grande consideração por ele”.
Para 2014, o cabeleireiro prepara um novo cd. Há um ano com a dupla “Raick e Ruan” formada, o próximo trabalho será acústico com um estilo mais romântico e vai incluir, claro, a música Brasil e Argentina. “Vamos gravar sim. Não vai ter como fugir disso. Aonde eu chego, acabo falando, então, não tem como”, completa.
Com pequenas participações nas casas noturnas da cidade, ele tem traçado o mesmo caminho de um iniciante. “É difícil, tem que mostrar tudo de novo. É um começo. Apresentar nas casas noturnas, bater nas rádios. O que está me fazendo voltar é o carinho que as pessoas ainda tem por mim, pela dupla, Airo e Ruan”, afirma.
Do passado ele traz a maturidade para conviver com o sucesso que almeja. Da experiência com Airo, tirou a lição da humildade. “Pé no chão, só faltou isso”.
Se vai deixar a profissão pela carreira musical, Ruan se divide na resposta. “Agora me apertou. Eu comecei a cantar e já gostava de cortar cabelo. Gosto dos dois, mas tenho grande paixão pela música”.