Drenos secam brejão do Prata, com briga na Justiça e prejuízo milionário
Os 46 quilômetros de drenos para secar a área de banhado, propiciando o uso para agropecuária, foram descobertos em 2016
Drenos em plena atividade no brejão do Rio da Prata, o curso de água cristalino que ficou cor de lama em novembro, motivam briga na Justiça, têm prejuízo calculado em R$ 24 milhões e deixam perplexos quem atua nos setores ligados ao meio ambiente.
Os 46 quilômetros de drenos para secar a área de banhado, propiciando o uso para agropecuária, foram descobertos em 2016 pela PMA (Polícia Militar Ambiental) e, passados dois anos, foi um dos temas mais discutidos nesta semana em Bonito, durante rodadas de reuniões para salvar os rios turísticos.
“Estamos discutindo o óbvio. Se perguntam para o médico se é comum matar pessoas de propósito, é obvio que não. É comum a gente destruir o meio ambiente e o Rio da Prata? É óbvio que não. É algo que a gente não consegue entender. Estamos, de forma desesperada, tentando dar sobrevida ao Rio da Prata por entender que ele é essencial para o nosso ecossistema”, afirma o promotor Alexandre Estuqui Junior.
O tom de preocupação é endossado pelo secretário de Meio Ambiente de Bonito, Edmundo Costa. “Se ficar discutindo o brejo do Prata 20 anos na Justiça, não tem brejo para discutir depois. Primeiro, tampa os drenos, cessa o dano e depois vai discutir o mérito. Se vai julgar em 150 anos, tem que resolver o dano ambiental primeiro. Vou dar um exemplo mais contundente, o cidadão bate na mulher. Primeiro eu socorro a vítima ou processo o agressor?”, questiona.
O brejão do Rio da Prata é uma área úmida no limite entre Bonito e Jardim. Com 5 mil hectares, abrange várias fazendas e funciona similar ao rim, mas filtrando os sedimentos.
De acordo com diagnóstico apresentado pelas pesquisadoras da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Darlene Gris e Helen Rezende, a região tem várias pequenas nascentes e os solos férteis atraem a agricultura.
Em 1984, a área do brejão era calculada em 7 mil hectares. Passados 34 anos, foi reduzida para 5 mil hectares.
A ação - Em dezembro de 2016, o MP/MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) entrou com ação civil pública contra Adolpho Mellão Cecchi, proprietário da fazenda São Francisco, em Bonito. A promotoria denuncia a construção ilegal de 46 quilômetros de drenos, dos quais 29 quilômetros foram construídos entre agosto de 2013 e abril de 2016, levando à drenagem de uma área de 973,1902 hectares do brejão do Rio da Prata.
O documento ainda informa a aplicação de multa de R$ 10 milhões, que os canais de drenagem resultaram em danos a fazendas vizinhas e favoreceram o rápido escoamento da água da chuva, propiciando erosão e levando sedimentos que turvam o rio.
Em janeiro de 2017, a juíza Adriana Lampert determinou uma audiência de mediação, realizada em junho do ano passado. Na ocasião, o MP suspendeu a ação por 90 dias e o fazendeiro, que mora em São Paulo (SP), se comprometeu em manter suspensa a atividade alvo da ação. Sem acordo, o processo voltou a tramitar em janeiro deste ano, a pedido da promotoria.
No dia 18 de janeiro, a magistrada negou a liminar, porém determinou que a área em litígio, cerca de 1.000 hectares do brejão do Rio da Prata, ficasse inalterada. A defesa também deveria comprovar a implantação de um plano de monitoramento do rio.
Em fevereiro deste ano, o proprietário informou a Justiça uma reviravolta: o Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) revogou o termo de paralisação sobre a área, autorizando a continuidade da atividade. Em 21 de maio deste ano, a juíza revogou a decisão que proibia o funcionamento dos drenos.
“Os drenos estão em atividade, firme e forte destruindo o meio ambiente”, afirma o promotor ao Campo Grande News.
Reação - De acordo com o advogado Gustavo Beltrão, que atua na defesa do fazendeiro, o Ministério Público entendeu por bem ajuizar uma ação e foi feito contraponto com argumentos fáticos e jurídicos.
“Uma contestação bastante densa em demonstrar que há equívoco na interpretação. A ação tramita ainda em Bonito e a juíza foi muito razoável e prudente. Seu Adolpho é cumpridor da lei e vai se curvar à decisão judicial”, afirma.
Conforme o advogado, os drenos foram feitos por serem plenamente regular, com boa fé e sem nenhum intuito de cometer crime ambiental. “Sabemos do interesse de terceiros na região e vamos cumprir o que for resolvido pelo órgão ambiental e a Justiça”, diz Beltrão. O Campo Grande News entrou em contato com o Imasul e aguarda retorno.
O episódio do turvamento da águas do Rio da Prata foi devido ao excesso de chuva e a troca de pastagem por lavoura em fazendas.